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12/02/2014

120 anos da descoberta da soroterapia antipeçonhenta

Graça Portela


Em 10 de fevereiro se completaram 120 anos da descoberta da soroterapia antipeçonhenta, realizada pelos franceses Albert Calmett, do Instituto Pasteur, de Paris e Auguste Césaire Phisalix e Gabriel Bertrand, do Museu Nacional de História Natural, de Paris, que apresentaram suas descobertas em uma reunião da Sociedade de Biologia da França. A soroterapia foi testada contra a picada de cobra naja, com ótimos resultados.

(Imagem: Museu Vital Brasil)
 

O impacto da descoberta teve grande repercussão nos trabalhos desenvolvidos por Vital Brazil, pesquisador brasileiro, que aprimorou a descoberta de seus colegas franceses, ao descobrir que o soro descoberto não funcionava em outras picaduras de cobras e desenvolver novas possibilidades científicas. Em 1898, Vital Brazil confirmou que a eficácia dos soros antipeçonhentos estava relacionada à especificidade do veneno utilizado na produção do antídoto e, consequentemente, ao gênero das serpentes. A hipótese, implícita nas pesquisas sobre os sintomas e lesões, foi ratificada através da imunização diferenciada de alguns cães inoculados com veneno de cascavel ou jararaca: o soro derivado do veneno cujo gênero de serpente diferia da que havia picado o animal revelava-se inativo.

Com o surto de peste bubônica em 1899 em Santos (SP), Vital Brazil iniciou o preparo do soro específico para essa doença nas instalações da Fazenda Butantan, que deu origem ao Instituto Serumtheráphico de Butantan, onde foi produzida oficialmente em 1901 a produção em escala da vacina. Controlada a peste bubônica, Vital Brazil prossegue com a preparação, no Instituto, de soros antiofídicos contra os venenos de cascavel e jararaca, as duas espécies que mais matavam no país, para atender à população rural, que era predominante à época. Estima-se que até o advento do soro, 25% dos acidentes com cobras venenosas resultavam em morte no Brasil, atualmente, o percentual é de apenas 0,4%.

Mesmo assim, atualmente as ocorrências de casos ainda assustam. Segundo Rosany Bochner, pesquisadora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) e coordenadora do Sistema Nacional de Informações TóxicoFarmacológicas (Sinitox), “ainda é grande o número de acidentes por serpentes, aranhas e escorpiões”. Isto pode ser comprovado com os dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde.

Se em 2007, o número de acidentes com serpentes no Brasil era de 27.030, em 2012 foi para 29.270, um aumento de 8,29%. Já os acidentes causados por aranha subiram de 22.836 para, em 2012, 25.534, representando 11,81%. Porém, esses números até que são pequenos se comparados com os causados por picaduras de escorpiões, que em 2007 pularam de 37.441 casos para 65.038 ocorrências em 2012, um aumento de 73,71%. As questões ambientais podem explicar esse aumento: “De um modo geral e bem simplificado, os desmatamentos fazem com que os animais sejam desalojados, aproximando-os do homem”, explica a coordenadora do Sinitox.

Rosany Bochner chama a atenção para o trabalho desenvolvido por Vital Brazil. “Seu livro A defesa contra o ophidismo mostra bem a preocupação de Vital Brazil em produzir informações sobre acidentes”, relata a pesquisadora. “Ele inicia seu livro salientando o problema da falta de estatísticas sobre os acidentes ofídicos no país, observando o fato de que o ofidismo não impressiona a opinião pública, apesar de ser um problema que atingia trabalhadores rurais. Isso em 1911, quando o livro foi lançado”, afirma Rosany. Para ela, mesmo hoje, com os ajustes do número de casos, óbitos e da análise do custo dos óbitos, que passa a ser realizada com base nos anos potenciais de vida perdidos, “a situação permanece praticamente inalterada”. “Não é de se admirar que em 2010, a Organização Mundial de Saúde tenha enquadrado os acidentes por serpentes na lista de doenças tropicais”, afirma.

Por isso, a coordenadora do Sinitox acha importante comemorar a data e falar do grande pesquisador brasileiro: “É fundamental revisitar a obra de Vital Brazil e recordar, mas também homenageá-lo pelo que tanto fez”, ressalta.

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