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11/11/2011

Avanços e nós críticos da saúde no Brasil

Fernanda Marques


A renomada revista inglesa The Lancet avaliou como oportuna a produção de uma série de artigos sobre a saúde no Brasil, a exemplo do que já havia sido feito com a África do Sul e a China – outras duas economias emergentes e promissoras no contexto mundial. Publicado em maio deste ano, o número temático da revista sobre o Brasil teve grande repercussão dentro e fora do país. Com o objetivo de aumentar o acesso do público brasileiro ao conteúdo desses artigos, The Lancet autorizou a Editora Fiocruz a traduzir a edição especial para o português e adaptá-la para a forma de livro. Dessa forma, com o lançamento do título Saúde no Brasil: a série The Lancet, 2011, a Editora Fiocruz abre nova oportunidade para que trabalhadores e gestores do SUS, estudantes, docentes e pesquisadores da saúde pública, e participantes dos movimentos sociais e órgãos de controle social da saúde tenham acesso a “uma das publicações recentes mais completas sobre a saúde em nosso país”, segundo o médico Jarbas Barbosa, secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.



Os seis capítulos do livro – que refletem os seis artigos do número temático – abordam o SUS; a saúde materno-infantil; doenças infecciosas; doenças crônicas não transmissíveis; violências; e inovações nas políticas de saúde. Todos os trabalhos se baseiam em dados atualizados dos censos demográficos, dos documentos sobre saúde do IBGE, dos Sistemas Nacionais de Informação em Saúde e de publicações em periódicos nacionais e internacionais. “Os estudos reunidos em Saúde no Brasil: a série The Lancet, 2011 enfatizam a maturidade da saúde pública baseada em evidências no nosso país”, opina o epidemiologista Moyses Szklo, professor da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos. Completa a obra uma seção de comentários composta por cinco textos que tratam de sustentabilidade, cooperação, movimentos sociais, ensino superior e o impacto da experiência brasileira na América Latina.


Os autores que assinam os textos participaram do movimento de criação do SUS e são comprometidos com os resultados do sistema de saúde brasileiro, mas, ao mesmo tempo, são críticos e não deixam de apontar “as insuficiências e os débitos desse nosso sistema”. Assim, o material ora apresentado em livro, por um lado, identifica os atuais problemas de saúde do Brasil e seus determinantes, enquanto, por outro, apresenta e analisa as políticas para o enfrentamento desses problemas. Apesar das dificuldades, “os estudos aqui reunidos salientam o fato de que o Brasil é o único país de renda média que possui um sistema de saúde público, universal, gratuito, descentralizado e que inclui a participação social como um dos seus pilares fundadores”, destacam, na apresentação da obra, os pesquisadores Cesar Gomes Victora, da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), e Maria do Carmo Leal, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), organizadores do livro e do número temático juntamente com Carlos Augusto Monteiro, da Universidade de São Paulo (USP), Maria Inês Schmidt, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e Maurício Lima Barreto, da Universidade Federal da Bahia (Ufba).


Em relação ao SUS, os autores ressaltam o aumento da cobertura na assistência à saúde dos brasileiros, especialmente na atenção básica. No entanto, também chamam atenção para os gargalos na formação, incorporação e manutenção de profissionais; o subfinanciamento crônico do componente público; e o crescimento do setor privado e da busca por planos de saúde. Discute-se, ainda, a desconexão entre a produção científica – bastante consolidada – e a produção tecnológica em saúde – onde restam importantes desafios a superar, como a dependência do SUS em relação a tecnologias importadas.


Na saúde materno-infantil, observa-se importante redução de óbitos e internações de crianças, expansão do aleitamento materno e menores déficits nutricionais na infância – bons resultados associados à atuação da Estratégia de Saúde da Família. Contudo, crescem a obesidade infanto-juvenil, os partos cesáreos e a prematuridade, e permanece como grande desafio a mortalidade materna – relacionada ao aumento dos partos pré-termo e ao aborto inseguro.


Além disso, a coletânea também aborda os impactos das violências – desde a interpessoal até a institucional – na saúde, apontando para as iniquidades sociais. Homicídios e lesões e óbitos no trânsito, por exemplo, atingem, sobretudo, os pobres, os negros e os de baixa escolaridade, enquanto a violência intradomiciliar acomete, principalmente, mulheres, crianças e idosos.


Quanto às doenças crônicas não transmissíveis – como neuropsiquiátricas, cânceres, cardiovasculares e diabetes –, os coeficientes são elevados. Nesse campo, uma conquista importante foi a redução no hábito de fumar, impulsionada por políticas públicas nacionais de combate ao cigarro. “No entanto, outros fatores de risco, como o consumo de bebidas alcoólicas e o excesso de peso, vêm aumentando, particularmente entre adolescentes e adultos jovens. É também claramente insuficiente a prática de exercícios físicos”, alertam Maria Inês Schmidt e colegas, lembrando que o quadro das doenças crônicas não transmissíveis tende a se agravar com o envelhecimento da população brasileira. Também no controle de doenças infecciosas, os autores indicam sucessos (ex. doenças preveníveis por vacina e doença de Chagas), sucessos parciais (ex. malária) e insucessos (ex. dengue e leishmaniose visceral).


O último capítulo, então, se encerra com “um chamado à ação dirigido a vários setores da sociedade: governo, trabalhadores da saúde, setor privado, universidades, instituições formadoras de pessoal, os setores da participação social dentro do SUS e, por último, a sociedade civil, sem a qual não há democracia, nem sistema de saúde de qualidade e equânime”. Não por acaso, é justamente a esses vários setores da sociedade que autores, organizadores e a Editora Fiocruz destinam o livro Saúde no Brasil: a série The Lancet, 2011.


Publicado em 11/11/2011.

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