Início do conteúdo

10/05/2005

Condições socioeconômicas desde a infância determinam risco de hipertensão

Fernanda Marques


A relação entre as condições socioeconômicas no decorrer da vida e o risco de hipertensão arterial nos homens negros do condado de Pitt, na Carolina do Norte (EUA), foi o tema de um estudo pioneiro coordenado pelo professor Sherman A. James, da Duke University. Na última quarta-feira (18/05), ele proferiu uma conferência na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). James está no Brasil para firmar parcerias em pesquisa com o Departamento de Epidemiologia da Ensp e o Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).


Segundo James, nos Estados Unidos o risco de hipertensão arterial é significativamente maior na população negra do que na branca. Esse risco mais acentuado se manifesta já aos 20 anos e perdura por toda a fase adulta. O impacto da hipertensão arterial - que se traduz em doenças do coração, cérebro e rins - também tende a ser pior nos negros. Na faixa etária de 20 a 24 anos a incidência de problemas renais associados à hipertensão arterial é dez vezes maior nos negros, em comparação aos brancos. Os negros também estão em desvantagem quando se consideram os indicadores de escolaridade, desemprego e pobreza. Segundo James, são esses fatores ambientais causadores de estresse, e não as características genéticas, que explicam o maior risco de hipertensão arterial na população negra.


Ainda de acordo com o professor, a desvantagem socioeconômica na fase adulta não é a única responsável por esse risco aumentado. As condições de pobreza na infância também têm forte influência. Ele confirmou essa hipótese em uma pesquisa realizada no condado de Pitt, onde, no passado, muitos escravos negros trabalhavam em lavouras de fumo e algodão. Hoje, existe uma classe média negra no condado, mas a maioria das famílias veio dos estratos mais pobres.


Para definir a posição socioeconômica de um indivíduo na infância, os pesquisadores se basearam na ocupação paterna. Assim, filhos de trabalhadores rurais pertenceriam às classes baixas, enquanto filhos de executivos estariam nas classes altas. Já para determinar a posição socioeconômica na fase adulta, foi utilizada uma combinação de variáveis associadas a emprego, escolaridade e casa própria.


Dessa forma, os homens negros estudados foram divididos em quatro grupos: 239 pertenciam às classes baixas tanto na infância quanto na fase adulta; 68 eram de classes baixas na infância, mas, na fase adulta, passaram para classes mais altas; 47 pertenciam a classes mais altas quando crianças e se tornaram adultos em piores condições socioeconômicas; e, por fim, 25 sempre estiveram nas classes mais altas no decorrer na vida.


Então, determinou-se o número de hipertensos em cada um dos quatro grupos. Entre os que sempre ocuparam as piores posições socioeconômicas, 42,3% eram hipertensos. Por outro lado, dos que sempre tiveram uma situação melhor, apenas 10,9% sofriam de hipertensão arterial. Este problema foi detectado em 35,8% dos que subiram na escala socioeconômica e em 35,1% dos que desceram.


Os resultados demonstram que a pobreza ao longo da vida representa uma carga cumulativa que acarreta, entre outros males, um risco aumentado de hipertensão arterial. Demonstram também que a melhoria na qualidade de vida pode oferecer uma proteção relativa contra a hipertensão arterial, embora o padrão socioeconômico na infância influencie as condições de saúde do indivíduo no decorrer da vida.


Ao final de sua palestra na Ensp, James falou sobre a questão do racismo. Ele lamentou que os negros, além de estarem mais expostos ao estresse, ainda recebam menos atenção nos serviços de saúde. "No Brasil, durante muito tempo, relutou-se em falar sobre o racismo. Hoje, felizmente, o problema tem sido discutido abertamente, o que é muito saudável. Acredito que esses debates vão permitir melhorar a situação atual dos negros", disse.

Voltar ao topo Voltar