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07/05/2013

Editora Fiocruz completa 20 anos com 350 títulos e 100 mil páginas publicadas

Daniela Savaget


“Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas, continuarei a escrever”. A frase da escritora Clarice Lispector traduz o espírito de muitos pesquisadores: parte-se do problema, uma pergunta ou muitas delas, para dar início às 100, 200 ou 300 páginas que vão compor uma tese. “Uma tese é uma tese”, já traduziu o cronista Mario Prata. O conhecimento, porém, não precisa parar por aí. Uma boa pesquisa pode servir de base para um livro e um livro sempre vai contribuir para outras teses e obras, para compartilhar experiências. Assista aqui a uma entrevista sobre os 20 anos da editora.


 A importância da iniciativa está no papel da instituição na valorização do livro como um meio que se destina tanto aos especialistas da área, quanto ao público interessado nos temas da saúde

A importância da iniciativa está no papel da instituição na valorização do livro como um meio que se destina tanto aos especialistas da área, quanto ao público interessado nos temas da saúde


Experiências compartilhadas pela Editora Fiocruz são muitas em suas décadas de existência: 350 títulos – 20 deles em novas edições e 89 em coedições –, 145 reimpressões e 100 mil páginas publicadas. A história começou em 1993, quando a editora foi criada como projeto especial da Presidência da Fundação. “A importância da iniciativa está no papel da instituição na valorização do livro como um meio que se destina tanto aos especialistas da área, quanto ao público interessado nos temas da saúde, seja ele formado por gestores, ou pelo cidadão de forma geral”, afirma a vice-presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz e diretora da editora, Nísia Trindade.


Com o tempo, a atenção dada aos assuntos prioritários para o Ministério da Saúde e que agregam conhecimento para a saúde pública tornou o projeto uma realidade consolidada da editora – criada quando Carlos Morel era presidente e Paulo Buss, vice-presidente de Ensino. “Bons livros começaram a nascer. Mário Quintana disse que há duas espécies de livros, uns que os leitores esgotam, outros que esgotam os leitores. Nós aprendemos a fazer a primeira espécie, traduzida em reimpressões, novas edições e premiações”, resume o editor executivo da Editora Fiocruz, João Canossa. “Claro que existiram erros, mas hoje podemos dizer que a editora é a cara da instituição, no sentido da pluralidade e da democratização do conhecimento”, completa.


Premiações


Uma das responsáveis pela lista de prêmios recebidos pela editora é a pesquisadora do Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (Claves) Simone Assis. O livro Impactos da violência na escola: um diálogo com professores, organizado por Simone e mais duas pesquisadoras do Claves, Patrícia Constantino e Joviana Avanci, foi o vencedor na categoria Educação do 53º Prêmio Jabuti. Para a autora, a agregação de saberes é responsável pelo pódio no mais tradicional prêmio do livro no Brasil. Simone ressalta que é sempre um desafio investir na proposta de um novo livro, especialmente na área científica. “É preciso apresentar dados com seriedade e precisão, sem ser exaustivo”, afirma.


João Canossa lembra que entender a linguagem específica do livro traz dilemas aos autores. “Estamos falando de produtos distintos: tese é tese, livro é livro. Você faz uma tese para provar alguma coisa para um grupo de pares. Já no livro, você não tem que provar mais nada, você vai apenas compartilhar conhecimento”, exemplifica.


Há quem já escreva, entretanto, para o formato livro. “Sou um bibliófilo obsessivo e sempre que escrevo tenho em mira um livro. Minha dissertação, que não virou livro, e minha tese, que virou, já foram escritas com a cabeça num livro potencial”, afirma o pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict) Francisco Inácio Bastos. Com diversos títulos publicados pela Editora Fiocruz, Bastos completa: “Ensaios bem redigidos sempre deveriam virar livros, segundo o meu gosto”.



Passo a passo


Se você acredita que o conhecimento da sua tese pode ser compartilhado, assim como nos escritos de Bastos, o primeiro passo deve ser dado solitariamente. “O autor vai adequar a linguagem para o formato livro, ampliando o diálogo. Vai transformar a própria tese no livro que gostaria de ter lido durante a pesquisa”, diz Canossa. Vale lembrar que qualquer pesquisador pode submeter um original à Editora Fiocruz, independente de ser ou não trabalhador da Fundação.


A partir da submissão, tem início a apreciação pelos editores científicos. No caso da Editora Fiocruz, são eles: Ricardo Ventura Santos e Gilberto Hochman. Os dois são responsáveis, em última instância, pela qualidade do livro publicado. “Em primeiro lugar nosso papel é analisar se o material recebido está adequado ou não ao perfil da editora, para então indicar pareceristas para a avaliação”, explica Santos. Os pareceres, entretanto, não são conclusivos. “Se os encaminhamentos demonstrarem muitos problemas no original, pode significar que ele ainda não está em condições de ser publicado. Se as mudanças são viáveis, é preciso acompanhar o processo de revisão pelos autores”, completa Hochman.


O leitor


Para conquistar os leitores, a Editora participa de eventos de ciência, saúde e cultura. A professora da Universidade Federal de Goiás (UFG) Ivania Vera é uma leitora assídua da produção da Editora Fiocruz. “Como tratam de temas de grande relevância para a Saúde Coletiva, muitos foram sugeridos como referências no Projeto Pedagógico do Curso de Enfermagem da UFG”, explica a professora.


Como a distribuição dos livros pelas editoras científicas ainda é considerada pequena, tem sido recorrente as discussões sobre o acesso dado a esse conhecimento. “O mundo está mudando e dizem que o livro está mudando também. Você pode aperfeiçoar o design e outras funcionalidades, mas o livro seguirá sendo livro”, acredita Canossa.  “Ele pode ser impresso ou eletrônico, isso não é o problema. Temos leitores para ambas as coisas e outras coisas que possam acontecer no futuro. A preocupação deve estar no acesso ao conhecimento como um todo”, completa o editor.


Ampliando fronteiras


Canossa lembra que para expandir esse conhecimento, além de integrar o Portal SciELO Livros – que visa o acesso livre aos títulos –, a Editora Fiocruz mantém parcerias institucionais, como o programa de televisão Ciência & Letras, do Canal Saúde. “A ideia é mostrar que por trás de um livro científico, geralmente se esconde uma grande literatura”, explica o jornalista e apresentador do programa, Renato Farias.


A iniciativa já contabiliza 148 gravações. O programa está entre os mais baixados no site do Canal Saúde e os livros apresentados têm sido mais procurados. Como leitor da editora, Farias aposta na abrangência de seus títulos: “Eu realmente acho que as publicações são de interesse muito maior do que apenas da comunidade científica”. A editora também acredita na ampliação desse conhecimento, por isso a média de 22 novos títulos e 14 reimpressões por ano tende a continuar. Como disse Clarice Lispector, e com licença poética para completar a frase: “Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas, continuarei a escrever”. E ler.


Publicado em 3/5/2013.

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