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18/06/2013

Encontro discute lacunas e desafios para a doença de Chagas na atualidade

Carolina Landi


Segundo dados da organização Drugs For Neglected Diseases iniciative (DNDi), a doença de Chagas, sozinha, é responsável, por cerca de 12 mil mortes por ano na região da América Latina. E representa um custo global de US$ 7,2 bilhões por ano. O Brasil está no topo do ranking em perdas de produtividade com um custo de US$ 129 milhões para a saúde pública por ano. Foi nesse contexto que representantes dos ministérios da Saúde do Brasil e Argentina, das organizações Médicos Sem Fronteiras (MSF) e DNDi e pesquisadores da Fiocruz estiveram reunidos para discutir as lacunas e os desafios da doença de Chagas no Brasil e América Latina durante a décima edição do Encontro do Programa Integrado de Doença de Chagas (PIDC). O evento, que foi realizado entre os dias 11 e 13 de junho no Palácio Itaboraí, em Petrópolis, também teve como intuito lançar bases para o macroprojeto que está sendo preparado pelo grupo, que inclui pesquisadores de várias unidades da Fundação.

A abordagem integral da doença de Chagas deu o tom do encontro nas apresentações e discussões (Foto: Gutemberg Brito) 
 

A abertura do encontro contou com a presença da então vice-presidente de Pesquisa e Laboratórios de Referência (VPPLR) da Fiocruz, a pesquisadora Claude Pirmez (que deixou o cargo em 12 de junho), do diretor do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (Ipec), Alejandro Hasslocher, do diretor do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), Wilson Savino, e do coordenador do Programa de Desenvolvimento Tecnológico de Insumos para a Saúde (PDTIS), Win Degrave. Pirmez falou sobre o objetivo do encontro, de produzir o macroprojeto. “É preciso agregar ideias para mudar o quadro atual da doença de Chagas. A Fiocruz tem uma bagagem na área e é preciso dar um salto qualitativo e pensar transdisciplinarmente para dar conta das lacunas da doença atualmente”. Estima-se que, atualmente, mais de 10 milhões de pessoas no mundo estejam infectadas com a doença de Chagas. Alejandro Hasslocher e Wilson Savino reforçaram o apoio institucional para suas respectivas unidades na participação do programa.

Avanços e desafios

A abordagem integral da doença de Chagas deu o tom ao encontro nos dias destinados às apresentações e discussões. Foram apresentados os resultados de pesquisas desenvolvidas pela Fundação, como o kit em tempo real para o diagnóstico molecular e avaliação da carga parasitária em pacientes portadores da doença de Chagas, os dados e as estratégias para a vigilância epidemiológica da doença no Pará (no Brasil, cerca de 98% dos casos agudos ocorrem no estado) e Amazônia. Entre os desafios atuais, estão a subnotificação de casos e o controle de qualidade dos alimentos que podem transmitir a doença via contaminação, como o açaí, que é o alimento mais associado na transmissão pela via oral e que possui grande impacto nutricional e econômicos no Pará e no Amapá. "É um problema principalmente de vigilância sanitária, que tem sido falha e fraca. A comercialização do açaí envolve a geração de renda do local e põe em risco o emprego de muitas pessoas. Mas a Vigilância precisa atuar sem interferências e chantagens por parte do capital e dos políticos”, afirmou o pesquisador do Instituto Evandro Chagas (IEC/Pará) Sebastião Aldo da Silva Valente.

O encontro ainda chamou atenção para a demora no fechamento do diagnóstico para a doença de Chagas e a dificuldade de notificação de casos em cidades com pouca estrutura. “O Ministério da Saúde só tem notificado os casos agudos. É preciso estabelecer uma política para os casos crônicos da doença e capacitar os profissionais de saúde que atuam na área”, complementou a pesquisadora Vera Valente, do Instituto Evandro Chagas (IEC).

Experiências de iniciativas como Médicos Sem Fronteiras e Drugs For Neglected Diseases iniciative (DNDi) também foram apresentadas. Com quase 93 mil diagnósticos e 7 mil tratamentos realizados desde o início do seu projeto em doença de Chagas, em 1999, o MSF, representado por Lucia Brum, apontou para a necessidade de melhorias para os testes de diagnóstico (“Com provas rápidas de melhor sensibilidade e especificidade para uso em condições de campo”) e a formulação de medicamentos menos tóxicos e com maior eficácia na fase crônica.

A DNDi, que trabalha a partir de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo, mostrou a Plataforma de Pesquisa Clínica em Doença de Chagas, que agrega investigadores, grupos de especialistas em Chagas, instituições de pesquisa, organismos governamentais e não governamentais nacionais e internacionais, associações de pacientes e outros parceiros em uma rede colaborativa. “A ideia é reforçar as capacidades institucionais de pesquisa e e envolver uma massa crítica de expertise”, informou Mariana Ali-Saab, coordenadora da plataforma.

Carta de Petrópolis

Ao final do evento, os pesquisadores que compõem o programa formularam a Carta de Petrópolis, um conjunto de propostas que visam o fortalecimento do grupo e de suas ações entre a Fiocruz, governo e sociedade civil. “O que vi nessa reunião foi um grupo de pessoas se ajuntando para formular uma estratégia de ação. Esses cientistas, técnicos e sonhadores que estão aqui, diante de uma doença negligenciada, estão pensando em como fazer a sociedade usar o seu papel, o seu prestígio e seu conhecimento para formular uma demanda que cheguem realmente às elites que estão administrando este país”, disse o pesquisador-emérito da Fiocruz João Carlos Pinto Dias. “Esse evento é a consequência da materialização do sonho de Carlos Chagas e Oswaldo Cruz, que era ver a instituição produzir conhecimentos e estimular socialmente a resolução de problemas de saúde, além de se engajar politicamente”.

Para o coordenador da Unidade Técnica de Vigilância de Doenças Transmitidas por Vetores da Secretaria de Vigilância em Saúde/Ministério da Saúde, Renato Vieira Alves, o PIDC representa uma iniciativa importante para pensar, de forma sistematizada, a contribuição que a pesquisa pode proporcionar para o serviço. “A organização do programa para oferecer respostas para o serviço é fundamental e pode ser um marco para o Programa de Doença de Chagas do Ministério da Saúde”. O Programa Integrado de Doença de Chagas (PIDC) tem a coordenação de Luciana Ribeiro Garzoni (IOC), Mariana Caldas Waghabi (IOC) e Roberto Saraiva (Ipec).

Sobre o PIDC

Lançado oficialmente em 2006, o Programa Integrado de Doença de Chagas (PIDC) visa articular a cooperação entre pesquisadores em redes temáticas, visando aumentar a eficiência da pesquisa nacional e fortalecer a captação de recursos financeiros para o desenvolvimento de pesquisas relevantes para a sociedade. As redes temáticas do Programa são: Rede 1 - Medicamentos, terapêutica e ensaios clínicos; Rede 2 - Taxonomia de vetores e ecologia de ciclos de transmissão do Trypanosoma cruzi; Rede 3 - Diagnóstico; Rede 4 - Fisiopatogenia; Rede 5 - Educação; Rede 6 – Pesquisa Clínica.

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