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07/12/2016

Especialistas discutem vetores, diagnóstico e mobilização social

Gustavo de Carvalho (Agência Fiocruz de Notícias)


Avanços e Lacunas no Diagnóstico Laboratorial das Arboviroses foi o tema da apresentação do pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) Thiago Souza, durante o 2º Seminário de Dengue, Chikungunya e Zika, promovido pela Fundação Oswaldo Cruz, no auditório da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz). O especialista do IOC/Fiocruz forneceu um panorama histórico do surgimento da tríplice epidemia e apontou razões ecológicas para o aumento da incidência global do Aedes.

Thiago Souza falou sobre particularidades das arboviroses, que têm diferentes graus de patogenicidade. Segundo ele, “é fundamental aperfeiçoar as técnicas de diagnóstico laboratorial diferencial e epidemiologia molecular dos vírus”. Como exemplo dos esforços que vêm sendo empreendidos nesta direção, ele apresentou alguns dos resultados da pesquisa realizada em parceria com o Instituto D’Or. Foram analisados os casos de 238 pacientes, selecionados a partir de sintomas (com febre ou exantema, mais outro sintoma). Foram utilizadas variadas metodologias na tentativa de estabelecer um diagnóstico diferencial para cada mostra (urina ou sangue periférico). Em diversos casos houve discordância entre a suspeita clínica e o diagnóstico laboratorial, “indicando a necessidade de um programa integrado para aperfeiçoar o diagnóstico diferencial”, afirmou.

O pesquisador trouxe ainda alguns resultados de experiências para catalogar a diversidade genética do vírus zika, doença que está associada a distúrbios neurológicos graves, como a síndrome de Guillain-Barré. Ele citou o estudo colaborativo coordenado pelo Broad Institute, do qual a Fiocruz participa ao lado de uma ampla gama de instituições internacionais. Nesta pesquisa são utilizadas amostras de fluido cerebrospinal (Líquor) para o sequenciamento genético do vírus, “conhecimento essencial para determinar a patogenicidade em amostras de indivíduos sindrômicos”. No âmbito desse estudo foram sequenciados 16 genomas completos (ou quase) no Brasil, mas o pesquisador afirma que para se chegar a resultados mais definitivos, “é necessário ainda muita pesquisa”.

Na sequência, o debate sobre Controle Vetorial e Participação Social contou com a participação de Mario Sergio Ribeiro, da Superintendência de Vigilância Epidemiológica e Ambiental da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, e Denise Valle, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que falaram sobre Desafios para o Controle e Vetorial, e Zélia Profeta, do Centro de Pesquisa René Rachou (Fiocruz Minas), que abordou o tema Mobilização Social para Enfrentamento da Tríplice Epidemia.

Mario Sérgio Ribeiro apontou as dificuldades para o controle de vetores, a começar pelo ambiente favorável ao vírus, “que não é tão vulnerável como se pensava”, disse. Ele citou as estratégias de ações para o controle químico mecânico, que envolve campanhas de mobilização, a utilização de equipamentos para pulverizar inseticidas, a contratação de agentes sanitários, além do desenvolvimento de inovações tecnológicas. Ribeiro indicou o Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia, publicado em 2015 pelo Ministério da Saúde, como referência para melhor compreensão das estratégias de combate ao mosquito.     

O representante da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro falou ainda sobre o Panorama Entomológico nos Anos Pré-epidêmicos, comparando dados do Levantamento Rápido do Índice de Infestação por Aedes aegypti (LIRAa) de 2007 a 2015. O estudo, realizado pelo Ministério da Saúde e secretarias estaduais e municipais de saúde, identifica focos de infestação do mosquito, apontando as regiões de maior risco e orientando ações de controle. No estado, 80 municípios participaram do LIRAa em 2015, o maior índice de participação da série histórica: em 50% desses o Índice de Infestação Predial (IPP) foi considerado satisfatório e 41,3% foram classificados como em risco de surto. Mario Ribeiro apontou como desafio para o futuro no controle do Aedes aegypti um investimento a longo prazo em saneamento, mas também a superação de limitações políticas, como o pacto feito com o Ministério Público de não entrar em certos locais “para não oficializar ocupações ilegais”.

A pesquisadora Denise Valle do IOC/Fiocruz iniciou sua intervenção mostrando o aumento, no país e no mundo, da resistência do mosquito aos inseticidas (piretroides) e larvicidas (temephos), que foram perdendo eficácia no controle de insetos adultos e larvas ao longo dos anos.  Como exemplo disso, ela citou a tentativa de bloquear a entrada do vírus da dengue 4 no Brasil, em 2010, a partir de Boa Vista (RR). Foi uma intervenção de emergência para redução de fontes com o uso de fumacê, mas o que se verificou foi um aumento muito rápido da resistência ao inseticida. “Ou seja, investiu-se muito para poucos resultados”, disse.

Denise Valle abordou as recomendações do Plano Nacional de Combate à Dengue para 2016, como a estratégia eco-bio-social, que associa participação social e manejo ambiental, com a utilização de mosquitos “dispersores” de inseticidas. Outra medida é a o uso de telas repelentes, com borrifação intradomiciliar de inseticida, disse a pesquisadora, lembrando que “de cada dez criadouros de mosquito, oito estão nos domicílios”. Denise citou como bom exemplo a campanha de combate ao Aedes que estimula a população a dedicar dez minutos ao controle nos locais de residência.

A diretora da Fiocruz Minas, Zélia Profeta, apresentou o programa de Mobilização Social para o Enfrentamento da Tríplice Epidemia que está sendo desenvolvido no estado desde 2015, e que poderá ser ampliado para outras regiões do país. Ela elencou entre os fatores que dificultam o controle do Aedes o crescimento desordenado das grandes cidades, problemas no abastecimento de água e de esgotamento sanitário, condições precárias de moradia e expansão da indústria de materiais não biodegradáveis. Para um controle adequado, Zélia considera que “o controle vetorial é uma ação de responsabilidade coletiva, que necessita de uma política intersetorial e participação comunitária efetiva nas ações de vigilância e monitoramento do Aedes”.

Zélia Profeta explicou que o programa atua buscando o empoderamento da população, promovendo o diálogo entre ciência e senso comum, aprendendo e construindo juntos ações que tenham continuidade. O trabalho se organiza em comitês populares, “sob inspiração da Ação da Cidadania do Betinho e de experiências em Cuba e Honduras”. Os comitês se reúnem em escolas como espaço de reflexão, ação e avaliação, envolvendo diferentes grupos, organizações e pessoas da sociedade civil. “A ideia é formar redes de solidariedade, estimulando a criatividade e aprofundando propostas de políticas públicas, pensando o território de forma mais ampla, entendendo o seu papel na determinação de saúde e doença”, afirmou Zélia.

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