'Estratégia de Saúde da Família precisa de análise qualitativa das práticas de saúde', diz autor de dissertação

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Informe Ensp
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"A expansão da Estratégia de Saúde da Família (ESF) tem favorecido a equidade e universalidade da assistência – uma vez que as equipes têm sido implantadas, prioritariamente, em comunidades antes restritas ao acesso aos serviços de saúde. Entretanto, não se pode admitir, só pelas estatísticas, que a integralidade das ações deixou de ser um problema na prestação da atenção. Para tanto, faz-se necessário análises qualitativas da ESF em desenvolvimento nos municípios brasileiros, particularmente quanto às práticas de saúde e aos processos de trabalho cotidianos". A avaliação é do aluno e psicólogo Ailson Campos Junior, que defendeu sua tese de mestrado profissional em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) intitulada Estudo sobre práticas de cuidado em saúde mental na atenção primária: o caso de um município do interior do Estado do Rio de Janeiro, sob a orientação do pesquisador Paulo Amarante. Seu estudo abordou o cuidado destinado aos pacientes portadores de transtornos mentais.

De acordo com Campos, atualmente, a cobertura da ESF no município de Cachoeiras de Macacu, onde foi realizada a pesquisa, gira em torno de 36%, chegando a 80% ao incluir nas estatísticas o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs). Esse programa conta, hoje em dia, com cerca de 130 agentes de saúde na região. A pesquisa problematizou as práticas no campo da saúde mental dos médicos das nove estratégias de saúde do município. “Apesar do bom funcionamento do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) do município, é possível afirmar que existem sérios entraves no trato dos pacientes no campo da saúde mental atendidos na atenção primária, pois o gargalo que se coloca no ambulatório de saúde mental poderia ser minimizado se os profissionais da atenção primária estivessem mais bem preparados a respeito desse tema”, explicou Campos.

Segundo ele, para atuar na ESF e realizar o atendimento médico tecnicamente consistente, é necessária uma formação que amplie o campo de percepção clínica; caso contrário, a atuação profissional poderá ser superficial, ineficiente e de baixa resolutividade, dominada pela monotonia e repetitividade oriundas da pobreza fisiopatológica dos casos e da estreiteza do olhar médico. Para realizar a pesquisa, Campos analisou o dispositivo apoio matricial a partir do exercício do apoio matricial em saúde mental e as diversas facetas da ferramenta. Desse modo, informou ele, a prática dos profissionais médicos que assistem aos usuários da ESF, a relação com as questões de saúde mental, a capacidade de uma visão mais holística da comunidade assistida e a relação com o uso de medicações psicofarmacológicas foram as três categorias analíticas que balizaram a realização da pesquisa em todas as suas fases.

O interesse por esse tema foi justificado pelo aluno. “Durante minha passagem pelo ambulatório de saúde mental, nos idos de 2006, já era corriqueiro perceber a quantidade de medicamentos psicoativos distribuídos em larga escala e a falta de iniciativas ou reflexões que problematizavam tais condutas”. Em 2008, ele recebeu um convite para fazer parte de uma equipe multiprofissional que realizaria um trabalho de suporte e apoio ao PSF. Surgia, então, o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf) em Cachoeiras de Macacu. Além dele, essa equipe era formada por mais cinco profissionais (nutricionista, fisioterapeuta, assistente social, pediatra e ginecologista), que lançaram um novo tipo de intervenção com um formato bastante diferenciado daquele proposto pelo ambulatório de saúde mental. “Mesmo com um tipo de intervenção e contato diferenciado por meio de visitas domiciliares, busca ativa no território, entre outras ações, foi nítido perceber o quanto a medicamentalização exercia seu vigor na subjetividade dos sujeitos”, esclareceu.

Ailson Campos Junior é graduado em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do RJ (2008), com especialização em dependência química também pela mesma universidade (2010). Tem experiência na área de psicologia, com ênfase em psicologia da saúde coletiva (Nasf), psiquiatria, saúde mental e Caps.