Livro que apresenta modelo canadense de avaliação em saúde ganha versão em português

Publicado em
Fernanda Marques
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Membros do Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Saúde da Universidade de Montreal, no Canadá, criaram um modelo para a avaliação das intervenções em saúde e o apresentaram, pela primeira vez de forma completa, em um livro lançado, em francês, em 2009. Com o título Avaliação: conceitos e métodos, a publicação – dirigida especialmente a pesquisadores e gestores – foi traduzida para o português e será lançada no Brasil pela Editora Fiocruz. O modelo de que trata o livro, desenvolvido há duas décadas, foi testado com sucesso em pesquisas avaliativas realizadas não só no Canadá, mas também em países da Europa, África e América do Sul, especialmente no Brasil.



“Um modelo de avaliação é um objeto conceitual e metodológico que se adapta e se modifica à medida que é utilizado”, dizem os organizadores do livro, os pesquisadores Astrid Brousselle, François Champagne, André-Pierre Contandriopoulos e Zulmira Hartz, professora titular do Departamento de Epidemiologia da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e, atualmente, vice-diretora do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa (IHMT/UNL). “O modelo ora apresentado já tem longa vida, mas, longe de fixar-lhe a forma definitiva, a presente obra deve permitir que ele evolua conforme as necessidades, as metodologias e os novos desafios com os quais os avaliadores serão confrontados”, completam os autores.


As indicações contidas no livro podem ser aplicadas para a avaliação de diferentes intervenções em saúde, como políticas, programas, organizações, tratamentos e tecnologias. Mas “o modelo de avaliação proposto é suficientemente amplo e global para ser utilizado em outros campos tais como a educação, os serviços sociais ou a administração pública, para citar somente esses”, acrescentam os organizadores.


Inicialmente, a obra conta a história da avaliação. “A avaliação sistemática das intervenções sociais é, na verdade, uma ati­vidade muito antiga. Há quatro mil anos, os chineses já utilizavam métodos avaliativos formais para recrutar seus ‘funcionários públicos’”, lembram os autores. Quanto à história moderna da avaliação, ela pode ser dividida em quatro gerações e seis períodos. A primeira geração, que inclui o período do Reformismo (1800-1900) e o da Eficiência e Testagem (1900-1930), teve como principal característica a medida. A segunda geração, associada ao período da Idade da Inocência (1930-1960), foi marcada pela descrição. A terceira, que contém os períodos da Expansão (1960-1973) e da Profissionalização e Institucionalização (1973-1990), centrou-se no julgamento. A quarta geração tem como palavra-chave negociação e engloba o período das Dúvidas, que começa em 1990 e se estende até os dias atuais – o que, por si só, justifica a pertinência e a relevância do livro.


De acordo com os autores, a avaliação é um procedimento interdisciplinar que pode e deve, muitas vezes, recorrer a métodos variados e complementares. Diferentes tipos de avaliação possíveis são discutidos nos capítulos do livro, cuja proposta é identificar consensos e fornecer um modelo integrador. “Na confrontação entre os diversos tipos de modelo, o avaliador produz referenciais que tanto o auxiliarão na formulação de suas questões de avaliação como também poderão ajudar o gestor a repensar a própria intervenção e seus pressupostos”, sintetiza a professora Ligia Maria Vieira da Silva, do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/Ufba), que assina o prefácio da obra.


O livro detalha seis tipos de avaliação. A análise estratégica tematiza a razão de ser das intervenções e sua pertinência para a resolução dos problemas aos quais elas se direcionam, enquanto a análise lógica permite, por exemplo, comparar o conhecimento científico estabelecido e aquele efetivamente incorporado nas intervenções. Já a análise da produção inclui a identificação das necessidades de saúde, dos recursos disponíveis, sua cobertura ou disponibilidade, acessibilidade e eficiência. A análise dos efeitos pode ser especialmente útil, por exemplo, para a avaliação da eficácia de medicamentos, ao ressaltar a diferença entre os resultados dos experimentos laboratoriais e os dos ensaios clínicos. Por sua vez, a análise econômica precisa levar em conta aspectos como os direitos individuais e coletivos, a equidade, o modelo de seguridade social dominante, o tipo de Estado e as formas de organização social do cuidado com a saúde. Por fim, a análise da implantação (ou operacionalização) deve considerar a complexidade dos contextos institucionais e sociais nos quais as intervenções ocorrem, lembrando-se que as práticas de saúde não são apenas produto da ação racional, mas também dependem da interação entre profissionais e usuários e dos diversos campos culturais aos quais eles pertencem.


A obra aborda, ainda, a avaliação normativa, “atividade mediante a qual se procura verificar se uma intervenção corresponde às expectativas”. Parte do processo de gestão e estreitamente associada ao controle dentro das organizações, ela é uma avaliação administrativa e não recorre obrigatoriamente a um procedimento científico. Portanto, por seus métodos e finalidades, é uma atividade distinta da pesquisa avaliativa, embora igualmente importante.


Além disso, a coletânea “oferece uma reflexão sobre a institucionalização da avaliação e propõe marcos que possibilitem ‘avaliar a avaliação’”, contam os organizadores. Dessa forma, o livro serve como “fonte para a reflexão teórica e inspiração na formulação de projetos concretos para a avaliação de programas e práticas de saúde”, confirma a professora Ligia, do ISC/Ufba, no prefácio.


Publicado em 11/11/2011.