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11/11/2011

Novo título preenche lacuna da literatura ao discutir a saúde do homem de forma integral e abrangente

Fernanda Marques


Homem que é homem não chora, não sente medo, não fica doente, não vai ao médico. Este modelo hegemônico de masculinidade afeta negativamente a saúde e, muitas vezes, inviabiliza práticas de cuidado. A constatação não é nova, mas ainda não havia na literatura uma obra que discutisse a saúde do homem de forma integral e abrangente – a maioria dos trabalhos acadêmicos coloca em foco a saúde da mulher. A lacuna acaba de ser preenchida, com o lançamento do livro Saúde do Homem em Debate, da Editora Fiocruz. Organizada pelo pesquisador Romeu Gomes, do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) e da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), a coletânea trabalha com a perspectiva de gênero e não é voltada apenas para a clínica médica, inserindo o debate no campo da saúde coletiva. Assinados por uma variada gama de especialistas, como médicos, psicólogos, sociólogos e antropólogos, os capítulos discutem integralidade em saúde, gênero, juventude, exclusão social, discriminação, sexualidade, reprodução, violência e homofobia, entre outros temas.



Romeu e vários autores da coletânea contribuíram para a elaboração da Política Nacional de Saúde do Homem, lançada pelo Ministério da Saúde em 2009. “A política compreende a saúde do homem em sua integralidade, em vez de se restringir a indicadores de morbimortalidade”, diz o organizador. No entanto, essa compreensão demanda análises, reflexões e debates ainda ausentes no processo de formação dos profissionais de saúde. “Nesse sentido, o livro oferece aos profissionais ferramentas teóricas para sensibilizá-los em relação à existência de múltiplas masculinidades, no plural, e à necessidade de não reduzir a saúde do homem a questões pontuais”, afirma Romeu. A coletânea tem também uma dimensão aplicada, buscando fomentar ações de promoção da saúde do homem.


Quando se fala em saúde do homem, muitas vezes, lembra-se apenas de doenças exclusivas do sexo masculino, como o câncer de próstata, ou de doenças que atingem principalmente os homens, como os problemas cardiovasculares. No entanto, ser homem não se resume a uma variável epidemiológica. Muito pelo contrário: homens são sujeitos impregnados por aspectos culturais, de raça/etnia, de classe social etc. Eles são influenciados pelos modelos de gênero e esse contexto precisa ser levado em conta quando se planejam e organizam os serviços de saúde.


"Os serviços de planejamento familiar, por exemplo, são organizados para atender às mulheres. Faltam estratégias para envolver também os homens”, exemplifica Romeu, lembrando que esse debate tem implicações na paternidade, em questões da saúde reprodutiva, no uso do preservativo e na opção (ou não) pela vasectomia, entre outros temas. Fala-se muito da ausência do homem nos serviços de saúde. Às vezes, porém, ele parece invisível – é o caso do pediatra que sempre se dirige à mãe, mesmo na presença do pai, considerado um simples acompanhante no consultório. “Os serviços de saúde têm que aproveitar essas oportunidades para a participação dos homens”, recomenda.


Os capítulos do livro tratam da realidade brasileira. Entretanto, o modelo hegemônico de masculinidade – que se confunde com o estereótipo do homem forte, invencível, viril e heterossexual – circula por todas as fronteiras. “Embora com diferentes colorações, esse modelo pode ser encontrado do Oriente ao Ocidente”, afirma Romeu, chamando atenção para o fato de que a efetiva promoção da saúde do homem depende da desconstrução do estereótipo. E, por sua vez, a saúde do homem influencia e é influenciada pela saúde da mulher, em uma perspectiva relacional. “Embora tenha sido pensado especificamente para os profissionais de saúde e para os que atuam nos serviços, este livro tem um espectro muito mais amplo”, opina a pesquisadora Maria Cecília de Souza Minayo, também da Ensp e do IFF. “Deve ser lido por todos os que sonham com uma cultura masculina menos machista, menos hierárquica e mais igualitária”.


Publicado em 11/11/2011.

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