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23/02/2017

Surto de febre amarela no Brasil é destaque na Radis

Revista Radis


No caminho que leva ao Castelo Mourisco — construção que começou a ser erguida no tempo de Oswaldo Cruz, em 1905, e simboliza o trabalho do sanitarista no combate à febre amarela e à varíola —, a equipe de reportagem da TV Globo do Rio de Janeiro aguarda para iniciar a entrevista. As lentes da câmera enquadram a presidente atual da Fiocruz, Nísia Trindade, enquanto a repórter Mônica Sanches indaga sobre a doença mais comentada no momento. Pouco antes, havia sido a vez da coordenadora do Centro de Informação em Saúde Silvestre (Ciss/Fiocruz), Márcia Chame, ser abordada com perguntas que buscavam entender os perigos relacionados ao surto da doença que, até 8 de fevereiro, registrava 70 mortes confirmadas no país. De onde veio? Por que tantos casos? O que fazer? — dúvidas que refletiam o pânico da população em relação à ameaça de contrair o agravo. Perto dali, no Museu da Vida, repórteres de outros canais de TV e rádio — SBT, Band, TV Brasil e CBN — repetiam as mesmas questões, enquanto as câmeras posicionadas no auditório aguardavam o início da conferência que iria abordar como os pesquisadores estavam monitorando o avanço do surto.

Porém, o que despertava a atenção da imprensa, de pesquisadores e profissionais de saúde reunidos próximo aos caminhos percorridos por Oswaldo Cruz há mais de um século não era uma doença nova, pouco conhecida, com promessas de grandes descobertas. Sob os holofotes, estava a mesma febre amarela que havia mobilizado esforços da saúde pública no início do século 20 — até ser erradicada em seu ciclo urbano de transmissão em 1942. Essa doença infecciosa aguda, uma velha conhecida da ciência, voltou a preocupar depois que um surto começou a ser registrado em Minas Gerais, na região dos vales do Rio Doce e do Mucuri, no leste do estado, com casos confirmados ou investigados também em São Paulo, Espírito Santo, Bahia e Tocantins. Ao todo, até o fechamento da edição de março da Radis, foram identificadas 1.337 ocorrências suspeitas, com 292 confirmações. Das 212 mortes notificadas, 97 foram confirmadas, 84 delas em Minas Gerais, de acordo com o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde de 21 de fevereiro. 

“Há mais de 70 anos não temos uma epidemia com mais de 100 casos e com essa letalidade”, afirma o médico epidemiologista da Universidade de Brasília (UnB), especialista em doenças infecciosas e parasitárias, Pedro Luiz Tauil. A diferença em relação às epidemias de febre amarela do início do século 20 é que, até o momento, a transmissão da doença tem ocorrido somente em áreas silvestres, em que os seres humanos são picados por espécies de mosquitos que vivem nas matas. Já no passado, o principal transmissor era o Aedes Aegypti, o mesmo que dissemina os vírus de dengue, zika e chikungunya e que vive em ambientes urbanos. 

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Para os pesquisadores e autoridades da área de saúde, o grande risco é a chamada “reurbanização” da febre amarela — o que pode provocar o retorno da doença para as grandes cidades brasileiras. “O risco existe, mas ainda é difícil de calcular. A gente convive com o Aedes há muitos anos e teoricamente ele tem toda a capacidade de transmitir a febre amarela”, analisa a bióloga Márcia Chame. Nas fronteiras entre o silvestre e o urbano, este grande surto de febre amarela também desperta discussões sobre a relação da saúde humana com a degradação ambiental. Além disso, a busca da população por vacinas como recurso para se proteger também levanta a questão de quais estratégias devem ser adotadas para imunizar as pessoas contra velhas e novas doenças.

Silvestre x Urbano

Há 75 anos, não se tem notícia de febre amarela urbana no Brasil. Essa forma de transmissão da doença foi erradicada em 1942, quando o último caso ocorreu na cidade de Sena Madureira, no Acre. Desde então, todas as ocorrências registradas tiveram transmissão silvestre, embora não exista diferença quanto às características da doença em relação à forma urbana. “Tanto na febre amarela urbana quanto na silvestre, a doença é a mesma, com a mesma letalidade. A diferença é apenas sua forma de transmissão”, explica o epidemiologista Pedro Luiz Tauil. No ciclo silvestre, os transmissores são mosquitos que vivem nas matas, dos gêneros Haemagogus e Sabethes. Esses insetos infectam seres humanos que entram na área das florestas ou macacos — a morte desses animais é o primeiro sinal de alerta de que a doença avança por determinada área e que é preciso precaução. 

Já no ciclo urbano, os seres humanos são os principais hospedeiros e o vetor a disseminar a doença é um velho conhecido do combate a endemias: o Aedes aegypti. A questão que intriga as pesquisas é a possibilidade do retorno da doença para ambientes urbanos. Isso aconteceu em Angola, na África, a partir de dezembro de 2015. Segundo Pedro, o que determinou o avanço da doença para as cidades no país africano foram os índices elevados de infestação do mosquito. “Não havia quantidade de vacina no mundo capaz de vacinar toda a população angolana. Já no Brasil, as infestações por Aedes ainda não são tão intensas quanto aconteceu em Angola”, pondera, embora ele acrescente que o cenário é preocupante. De acordo com o epidemiologista, a febre amarela é diferente da dengue, pois tem um período mais curto de transmissibilidade, ou seja, o tempo que o vírus pode ser transferido de uma pessoa para outra, pelo mosquito, é menor — o que dificulta a sua disseminação pelo Aedes. “Essa é uma das explicações porque a gente tem tantos casos de dengue e não tem febre amarela urbana, apesar de termos casos silvestres que chegam à cidade e que podem, teoricamente, infectar os mosquitos da cidade”, acrescenta.

Segundo Márcia Chame, a doença é definida como silvestre porque até então o vírus é transmitido por espécies de mosquitos que não estão no ambiente urbano. “Quem adoece de febre amarela no Brasil? Os macacos que estão na área silvestre e as pessoas que vivem na borda dessas matas ou adentram essas áreas para fazer alguma atividade, como extrativismo ou turismo”, esclarece. Quem mais adoece são homens, em idade produtiva, que têm um perfil maior de exposição no ambiente de florestas. O período de maior ocorrência de surtos também está relacionado aos meses mais quentes e costuma ir de dezembro a maio.

No Brasil, a forma silvestre é considerada endêmica, com ocorrências mais frequentes na Amazônia Legal. Porém, dois surtos ocorridos no período de 2000 a 2009 levaram a expansão da febre amarela em direção ao sul e leste do país. Com isso, o Ministério da Saúde definiu a chamada Área com Recomendação de Vacina (ACRV), uma ampla cobertura que abrange 18 estados brasileiros e o Distrito Federal. As pessoas que vivem nesses locais devem tomar duas doses da vacina ao longo da vida, respeitando as recomendações ou contraindicações; também devem ser vacinados os viajantes que se deslocam para essas áreas. “Com a manutenção da doença em seu ciclo silvestre, não é possível pensar em erradicação, mas em estratégias de prevenção, detectação e predição de novos casos”, explicou o coordenador da Unidade Técnica de Vigilância das Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, Renato Vieira Alves, durante o Painel “Febre Amarela”, realizado no Museu da Vida da Fiocruz (31/1), no Rio. 

Segundo a médica do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), Juliana Arruda de Matos, a febre amarela causa desde infecções assintomáticas até casos graves e fatais. Os sintomas são os mesmos, independente da forma de transmissão. O período de incubação da doença (que vai da picada do mosquito e a transmissão do vírus até o início dos sintomas) varia de 3 a 6 dias, mas pode se estender a até 15 dias. “Se a pessoa apresenta sinais da doença e voltou da área de transmissão nos últimos 15 dias, é possível que ela esteja com um quadro de febre amarela”, pontuou. Os sinais são variados, de acordo com a classificação dos casos, que vai de moderado a grave, e incluem febre, calafrios, dor de cabeça, prostração, náuseas, vômitos e insuficiência renal e hepática, que provoca a icterícia (amarelado da pele, característica que dá nome à doença). 

Não é culpa dos macacos

Os macacos não são os vilões dessa história. Ao contrário, para biólogos e profissionais da área de vigilância, são considerados “sentinelas”. Se esses animais começam a morrer, é hora de ligar o sinal amarelo de alerta. “A ocorrência de casos humanos é precedida, invariavelmente, de mortes de primatas. É um padrão porque o vírus se mantém na população de macacos”, apontou Renato. As espécies mais suscetíveis são bugios, saguis e macacos-pregos. A chamada vigilância de epizootia (quando a doença se dissemina por uma comunidade animal, em grande número de casos) é uma estratégia adotada para perceber a ocorrência do adoecimento e da morte desses animais e, a partir daí, iniciar a vacinação da população da região. “Esse tipo de vigilância ajuda a apontar o caminho da febre amarela e a necessidade de prevenção”, acrescentou.

Nos limites entre espaços silvestres e urbanos, a febre amarela mostra a relação da saúde humana com o ambiente. Segundo Márcia, essa é uma relação que vem sendo estudada por pesquisadores no mundo todo e que deu origem a um documento publicado, em 2015, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Secretariado da Convenção da Biodiversidade, com participação da Fiocruz. De acordo com esse conjunto de estudos, a saúde e o bem-estar humano são ameaçados pelo desequilíbrio na natureza. “A perda de biodiversidade pode desestabilizar ecossistemas, promover surtos de doenças infecciosas e minar o progresso do desenvolvimento, da segurança nutricional e proteção contra desastres naturais”, diz um trecho do relatório.

A perda de ambientes naturais faz com que as espécies fiquem restritas a uma área menor, o que promove uma circulação maior de agentes infecciosos. “No caso da febre amarela, observa-se a mortalidade de macacos nos locais em que os fragmentos florestais são muito pequenos”, aponta Márcia. Dentro das faixas de matas, cada vez mais restritas, há menos recursos para sobrevivência, como alimentação e abrigo, e muitos tipos de seres vivos tendem a desaparecer naquele local. “As espécies que permanecem são as que têm a capacidade de se adaptar às mudanças ambientais. E o que a gente vem percebendo é que são boas mantedoras e transmissoras de agentes infecciosos”, assinalou à Radis.

Entre os fatores que levam à degradação ambiental, estão mudanças no uso da terra, exploração dos recursos biológicos, poluição e atividades extrativistas predatórias, como a mineração. Em 14 de janeiro, O Estado de S. Paulo publicou matéria com declaração de Márcia Chame que apontava que o surto de febre amarela poderia ter relação com o crime ambiental da Samarco, ocorrido em Mariana (MG), em 2015. Para a Radis, a pesquisadora esclarece que não existe apenas uma causa para o grande surto da doença. “É um processo complexo que vem sendo observado em diversas situações. São impactos de muitas origens, inclusive ao longo da história”, explica. Segundo ela, essa situação não é nova e já era esperado um “encontro marcado” com a doença — a diferença foi só a proporção do número de casos.

Segundo a pesquisadora, já existem estudos no Brasil que apontam a associação de algumas doenças com a degradação ambiental. É o caso da febre maculosa e da doença de Chagas, por exemplo. Nessa última, o inseto transmissor — o barbeiro — prefere se acomodar em palmeiras — plantas comuns em áreas que sofreram degradação. “A perda da biodiversidade (isto é, a perda de um conjunto de espécies silvestres que estão relacionadas num ciclo) faz com que uma doença silvestre extravase para a zona rural e para a área urbana”, analisa. Para Márcia, quanto maior a diversidade de espécies dentro de áreas naturais, maior a chance de ser mantido o equilíbrio ambiental, assim como o ciclo natural das doenças tende a permanecer restrito a esses espaços.

Já para o epidemiologista Pedro Luiz Tauil, é possível que haja uma relação entre as alterações ambientais e o surto da doença, mas ainda não está comprovado. “A gente não conhece todas as razões para explicar a quantidade de casos no surto desse ano”, afirmou à Radis. Para ele, a única explicação é que apenas 50% da população de Minas Gerais estavam vacinados, quando a recomendação é de pelo menos 80%. “A causa de haver tantos casos humanos é a baixa cobertura vacinal na área que ocorreram as mortes de macacos”, disse. Segundo ele, é possível evitar que as pessoas se infectem, fazendo com que a população que vive nessas áreas seja protegida por meio da vacina, assim como aqueles que se dirigem para essas regiões.

Afinal, quando vacinar?

A vigilância ajuda a apontar a necessidade de vacinas, afirmou ainda o coordenador da Unidade Técnica de Vigilância do Ministério da Saúde, Renato Vieira Alves. Segundo ele, a prioridade deve ser tentar identificar possíveis casos para antecipar a circulação do vírus. “Se há uma vacina extremamente eficaz, que confere uma imunidade excelente, esse é um grande diferencial da febre amarela, que nos permite investir em vigilância”, pontuou. De acordo com Renato, diferente de zika e dengue, outras doenças também transmitidas pelo Aedes, a vantagem no enfrentamento da febre amarela é a existência da vacina produzida no país, o que dá a possibilidade de gestão sobre esse insumo para garantir a resposta às emergências. “Podemos pensar em estratégias em predizer a circulação do vírus, já que dispomos de uma ferramenta que pode evitar que as pessoas adoeçam”, disse.

A vacina contra febre amarela é considerada a medida mais importante para prevenção e controle da doença. Ela existe desde 1937 e é produzida no Brasil, pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz). É uma vacina feita com vírus vivos atenuados, a partir de ovos de galinha. Uma questão que pode ser recorrente no senso comum é: por que não vacinar toda a população e deixá-la imune à febre amarela? O alerta da médica infectologista Juliana Arruda de Matos é que a vacina não é um recurso que pode ser recomendado de forma indiscriminada. “Existem precauções gerais em relação à vacina, que precisam ser analisadas caso a caso, diante do custo/benefício se vale a pena vacinar ou não”, pontuou. Para gestantes, mulheres que estão amamentando e crianças abaixo de seis meses, a vacina não é indicada. Também é recomendado evitar a primeira dose em pacientes com mais de 60 anos. “Nesse caso, o especialista precisa avaliar se vale a pena vacinar a pessoa, levando em conta o risco de exposição à doença”, completou. (Leia mais informações sobre a vacina na página 16)

Vacinar toda a população para impedir a expansão da doença esbarra em outro dilema: não existe vacina no mundo suficiente para isso, aponta Pedro Luiz Tauil. “A vacina produzida tem um processo de fabricação muito antigo, que existe desde 1937, e as indústrias não se interessam muito por esse sistema de produção”, analisa. Segundo ele, também não há necessidade de pânico e da busca indiscriminada por vacina. O recomendado seria pensar em imunizar gradualmente a população a longo prazo. “Há mais de 10 anos, nós temos discutido a necessidade de, gradualmente, vacinar toda a população brasileira, por meio da inclusão da vacina contra febre amarela no calendário vacinal de todas as crianças, não só aquelas que vivem na área com recomendação”, defende. De acordo com o pesquisador, seriam aplicadas duas doses: uma com nove meses e outra com 4 anos. “Ao vacinar progressivamente seria possível ter uma proteção para toda a população brasileira, com menos riscos de eventos adversos”, explica. Ele conta que, quando se faz a vacinação em massa e às pressas, motivada por um surto, muitas das contraindicações não são respeitadas.

Para Renato, a vacinação deve respeitar os critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde, como a prioridade para a população que vive nas áreas onde há surto da doença. “É fundamental que as ações sejam muito precisas e direcionadas para as áreas prioritárias e para as populações que de fato estão mais expostas ao risco de contrair febre amarela”, disse. A busca por vacinas tem levado as pessoas aos postos de saúde, mesmo em áreas sem surto. “Só para se ter uma ideia, no estado do Rio de Janeiro [onde não há suspeita de surto], o histórico de vacinação era de 15 mil pessoas por mês. Hoje a gente está perto de vacinar 250 mil”, contou o subsecretário de Vigilância em Saúde do estado do Rio de Janeiro, Alexandre Chieppe. Ele também defende que sejam mantidos os critérios de prioridade para áreas em risco. “Discutir mudança de política pública no calor do surto talvez não seja a melhor ideia”, pontuou. Mesmo sem suspeita de casos, o estado estabeleceu um cinturão formado pelos municípios na região de fronteira com Minas Gerais onde os moradores devem ser vacinados.

Trilha das mudanças

As pesquisas sobre febre amarela se misturam com a história das ciências da saúde. Ela foi a primeira doença a ser descrita pelos cientistas como transmitida por um vetor, ainda no século 19, conta a virologista do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Ana Bispo. “Naquela época era motivo de fechamentos de portos e impactava na atividade econômica. A forma silvestre só foi descrita em 1932 e, entre 1931 e 1937, houve o desenvolvimento da vacina atenuada”, relata. Ela explica que o vírus é classificado pelos cientistas como “arbovírus” (transmitido por artrópodes) e pertence à mesma família dos causadores de dengue, zika e febre do oeste do Nilo. Já a especialista em vetores e também pesquisadora do IOC/Fiocruz, Goreti Rosa Freitas, conta que a doença ficou instalada no Rio de Janeiro durante 61 anos, de 1849 a 1910, porque havia muita dificuldade para sua erradicação. A eliminação de casos só foi conseguida com o trabalho da equipe do sanitarista Oswaldo Cruz. “Oswaldo Cruz não era popular, diante da incredulidade que havia na época de que um mosquito pudesse transmitir uma doença”, narrou também durante o painel sobre “Febre Amarela” (31/01).

Nos novos tempos, a febre amarela desafia a pensar a saúde em escala global e sua relação com fatores ecológicos, ambientais e de mudanças no padrão evolutivo, apontou a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade. “No passado, as elites do Rio fugiam para Petrópolis, mas nós não temos mais para onde fugir, por isso a necessidade de interdependência das ações e da vigilância de caráter sistemático e permanente”, destacou. Segundo ela, os especialistas tiveram que repensar a separação entre saúde humana e saúde animal. “Um fator fundamental é a alteração no padrão de mobilidade entre áreas urbanas e silvestres, com mudanças de hábitos e na circulação de pessoas e mercadorias”, avaliou.

“Não conseguimos vencer as doenças do passado”, destaca à Radis a pesquisadora Márcia Chame. De acordo com sua avaliação, o Brasil é um misto de grandes centros urbanos e áreas rurais gigantescas e fazer a vigilância em um país tão grande é um desafio. “Precisamos de um contingente muito grande de agentes de saúde, que devem estar capacitados para os novos desafios trazidos por aquelas endemias que chamávamos de endemias rurais”. A capacitação dos profissionais deve estar atenta aos velhos agravos e às novas emergências, que incluem vírus que chegaram ao país com a circulação de pessoas, como foi o caso de zika e chikungunya. “Isso é um efeito da globalização: as pessoas circulam e os vírus também. É um processo muito dinâmico”, completa.

Na visão do epidemiologista Pedro Luiz Tauil, os municípios são os responsáveis pelas ações de controle, mas devem ser apoiados e estimulados nessa tarefa. Segundo ele, o que falta é uma estratégia de equipes móveis de vacinação para a população de áreas rurais das cidades com recomendação de vacina. “Para uma pessoa da zona rural, é mais difícil ir para a cidade tomar a vacina. E essa população é a mais vulnerável, porque está mais próxima das matas”, considera. Além da vigilância sobre a cobertura vacinal, ele também defende estratégias de educação em saúde para a população que se dirige para essas áreas. Para Márcia Chame, o que deixa de ser um problema do presente passa a ser negligenciado e pode retornar mais à frente, com mais força. “Nós somos um país tropical e biodiverso e o monitoramento ambiental tem que fazer parte da nossa política de saúde”, afirma. Antes de serem encaradas como coisas do passado, velhas conhecidas da ciência como a febre amarela precisam estar sempre na agenda de prioridades.

O que você precisa saber sobre a vacinação?

A vacinação contra a febre amarela é recomendada para a área do Brasil onde a transmissão é considerada possível, principalmente para indivíduos não vacinados e que se expõem em áreas de mata. De acordo com o Ministério da Saúde, a vacinação imediata no estado de Minas Gerais deve ser, preferencialmente, para pessoas que vivem em áreas rurais dos municípios com casos suspeitos e as que nunca se imunizaram contra a doença. A recomendação para o restante do país continua a mesma: toda a pessoa que reside em Áreas com Recomendação da Vacina (ACRV) e viajantes que vão se deslocar para essas regiões. “Não é necessário vacinar toda a população agora, mas progressivamente ter a população vacinada é muito bom”, aponta à Radis o epidemiologista Pedro Luiz Tauil. O médico também lembra que a vacina leva 10 dias para imunizar a pessoa, por isso não adianta vacinar hoje se você vai viajar amanhã. Vale também lembrar das contraindicações.

Fora da área de recomendação:
Ceará
Rio Grande do Norte
Paraíba
Pernambuco
Alagoas
Sergipe
Espírito santo*
Rio de Janeiro*

*Alguns municípios com recomendação temporária

Fonte: Ministério da saúde

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