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21/02/2006

Estudo identifica fatores ligados ao uso da cocaína em presídios

Sarita Coelho


Para cada ano a mais que se passa na prisão, a chance de usar cocaína aumenta em 13%. A conclusão é de um estudo realizado por pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp), uma unidade da Fiocruz, com dados da Secretaria de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que acaba de ser publicado na Revista de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Foram selecionados 1.314 indivíduos que cumpriam pena no sistema penitenciário do Rio de Janeiro em 1998. A análise do questionário respondido pelos detentos revelou que o ambiente carcerário, o uso de álcool, de maconha e o tempo de cumprimento de pena são fatores estimulantes para o uso de cocaína na prisão.


O objeto do estudo eram os aspectos ligados à saúde. Por isso não se questionou a forma como as drogas chegam à cadeia. "Procuramos identificar o perfil de reclusos com maior predisposição de usar a droga na prisão para atuar de forma preventiva. Eles são usuários e dependentes. O serviço de saúde penitenciário tem de agir sobre isso", explica a médica Márcia Lazaro de Carvalho, do Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde, que assina o artigo juntamente com Joaquim Gonçalves Valente e Ana Glória Godoi Vasconcelos, do mesmo departamento, e Simone Gonçalves de Assis, do Centro Latino Americano de Estudos sobre Violência e Saúde (Claves).


O estudo revela que a maioria dos presos que ingressam no sistema penitenciário do Rio de Janeiro é condenada por tráfico de entorpecentes. Os especialistas partiram do pressuposto de que existem alguns fatores que podem explicar comportamentos diferentes na prisão e outros que podem agir direta ou indiretamente sobre o uso de cocaína. Assim, foram selecionados presos com comportamentos opostos em relação ao uso da cocaína (usuários e não usuários).


Dos 1.314 reclusos que responderam ao questionário, 376 presos (29%) já tinham feito uso da droga na prisão. Desses, 42 passaram a usá-la após terem sido presos e 334 já faziam uso antes da prisão e mantiveram o hábito mesmo depois da entrada no sistema prisional. No outro grupo foram incluídos 938 presos (71%) que disseram não ter história de uso de cocaína na vida. As variáveis utilizadas na descrição do perfil dos internos versavam sobre a situação sócio-demográfica, a história penal, a história de uso de outras drogas e a história de doenças sexualmente transmissíveis antes e depois da prisão.


Os usuários de cocaína na prisão apresentaram maior freqüência de terem sido jovens infratores, de terem visitado alguém na prisão, de serem reincidentes no crime e de já terem cumprido maior parte da pena. O uso de cocaína na prisão também esteve associado ao uso de outras drogas, como álcool, maconha e tranqüilizantes, ao consumo simultâneo de diferentes substâncias entorpecentes e à história de DST.


Os pesquisadores consideraram como um único grupo os internos que relataram continuidade do uso da cocaína e aqueles que só passaram a usar a droga após terem sido presos. Isso dificultou buscar informações quanto as prováveis explicações para os detentos começarem a fazer uso da droga a partir da entrada na prisão. Segundo os pesquisadores, é possível que a associação entre tempo passado na prisão e uso da cocaína se deva ao fato de que com o passar do tempo neste ambiente o uso da droga seja assumido com mais naturalidade e menos preconceito, mas esse viés de informação não pôde ser medido.

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