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06/12/2017

Foco no Aedes pode invisibilizar determinantes sociais do zika

André Costa (Agência Fiocruz de Notícias)


A epidemia do vírus zika no Brasil em 2016 teve determinantes sociais, como a desigualdade social e a ausência de saneamento básico, que correm o risco de ser invisibilizados caso o combate à doença foque-se exclusivamente no mosquito Aedes aegypti, afirmou a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima. A declaração foi concedida no simpósio Intervenção e diagnóstico precoces em malformações do neurodesenvolvimento pediátrico, onde Nísia fez a apresentação O impacto social da síndrome pós-zika, ao lado do pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) Gustavo Corrêa da Matta.

A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, e o pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), Gustavo Corrêa da Matta, durante a apresentação 'O impacto social da síndrome pós-zika' (foto: Academia Brasileira de Ciências)

 

“A forma de enquadrarmos uma doença, tanto em termos conceituais, quanto de perspectiva de terapia, tem impactos relevantes no combate a essa mesma doença. Quando se associa o zika exclusivamente ao Aedes aegypti, nosso olhar é guiado para determinada direção, o que invisibiliza uma série de questões que pesquisas têm mostrado como relevantes”, disse Lima.

Lima ressaltou que a maioria das famílias afetadas pertencem classes sociais desfavorecidas, vivendo em situação de precariedade. Segundo ela, motivou o “aprofundamento do debate sobre direitos reprodutivos e aborto no país, que ainda é uma questão-tabu na sociedade”.

A presidente da Fundação, que, ao lado do cargo, mantém a atividade como pesquisadora, exaltou a reação da comunidade científica ao desafio colocado pelo vírus zika,  levando a “avanços importantes no sequenciamento do vírus, no estabelecimento de seu mapeamento do vírus e também de seus determinantes sociais”.

Lima observou, entretanto, haver um vácuo entre o “conhecimento científico e a resposta de políticas de saúde para a epidemia e suas consequências”. Esta diferença, segundo ela, é recorrente no Brasil, onde “a resposta das políticas de saúde sempre esteve atrás do conhecimento científico”.

Para a pesquisadora, uma resposta à altura exigirá uma abordagem interdisciplinar, tanto do ponto de vista do desafio intelectual, quanto do desafio de saúde pública. Nesse sentido, o papel da Fiocruz, “por abrigar todas as áreas de saúde, da pesquisa biomédica à atenção da saúde, é imprescindível”.

Em adição à fala de Lima, o pesquisador da Ensp Gustavo Corrêa de Matta afirmou que ignorar “condições de vida, como saneamento, acesso a água e condições ambientais não são fatores menores. Focar-se unicamente no mosquito reduz bastante o problema”.

Matta elogiou o papel de institutos de pesquisa, como o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) e o Instituto Aggeu Magalhães (Fiocruz Pernambuco) que tiveram papel não só de pesquisa, mas também de assistência. O pesquisador também disse que um aspecto louvável no combate ao zika foi a “organização e participação de movimentos sociais no auxílio às famílias afetadas, com muitas pessoas diretamente envolvidas assumindo papel ativo nas pesquisas”.

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