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11/11/2005

Ideal de masculinidade compromete a saúde do homem

por Sarita Coelho






A definição do que é próprio da natureza do homem tem sofrido mudanças ao longo das últimas décadas. Se antes a masculinidade era caracterizada por poder, força e virilidade, hoje diversas definições se cruzam para explicar o que é ser homem. É a chamada crise da masculinidade, que passou a ser definida no final do século 20 por cientistas de todo o mundo. A partir dessa perspectiva, o pesquisador Romeu Gomes, do Instituto Fernandes Figueira (IFF) da Fiocruz, escreveu o ensaio Sexualidade masculina e saúde do homem: proposta para uma discussão, que mostra que a sexualidade masculina, quando não devidamente abordada, pode comprometer a saúde do homem, revelando dificuldades, principalmente, no que se refere à promoção de medidas preventivas. O ensaio foi publicado recentemente na revista Ciência & Saúde Coletiva.

De acordo com Gomes, homens intelectualizados da classe média urbana brasileira apontaram para tensões diante do padrão de masculinidade tradicionalmente construído em um estudo realizado no início dos anos 90. Segundo eles, existem alguns marcos vigentes para a afirmação da identidade masculina, como a iniciação sexual com prostitutas e a negação do homossexualismo. E mais ainda: há entre os homens um medo de serem questionados quanto à sua masculinidade. Choques entre manter o poder do macho e viver novos modelos de masculinidade têm sido um dos motivos para se falar de uma crise masculina.

Para alguns pesquisadores, o gênero masculino vive em um estado de crise permanente. A masculinidade não é algo dado, mas algo que constantemente se procura conquistar, e existem inseguranças provocadas principalmente pelo medo do homossexualismo e da impotência. Nesse sentido, a representação da sexualidade masculina tem gerado dificuldade de promoção de medidas preventivas de saúde, em especial contra o câncer de próstata.

O tabu do toque retal

No Brasil, as altas taxas de incidência e mortalidade fazem com que essa neoplasia seja a segunda mais comum entre a população masculina, perdendo apenas para o câncer de pele não-melanoma. A detecção precoce desse câncer é fundamental para que se aumentem as possibilidades de cura. Entre as medidas preventivas, ressalta-se o toque retal realizado por profissionais de medicina.

Apesar de ser uma medida preventiva de baixo custo, esse procedimento mexe com o imaginário masculino, a ponto de afastar inúmeros homens da prevenção do câncer de próstata. Essa recusa não ocorre, necessariamente, por conta da falta de informações acerca da efetividade dessa medida preventiva. Fazer o toque retal é uma prática que pode suscitar no homem o medo de ser tocado em sua "zona proibida". Esse medo pode se desdobrar em muitos outros.

O medo da dor, tanto física quanto simbólica, e o medo de ter ereção são alguns dos exemplos. No imaginário do homem, a ereção pode estar associada tão fortemente ao prazer que não se consegue imaginá-la apenas como uma reação fisiológica. Com isso, ele teme a possibilidade de a ereção ser interpretada por quem o toca como um indicador de prazer. Ficar relaxado, a pedido de quem faz o toque, para que o processo seja menos evasivo também pode trazer receios. O homem pode temer que a sua descontração seja interpretada como sinal de que o toque nessa parte é algo comum e/ou prazeroso. Para Gomes, todos esses receios são indicativos de que se deve promover discussões voltadas para os sentidos atribuídos à sexualidade masculina, "para que não só a prevenção do câncer de próstata como outras ações tangenciadas por tais sentidos atribuídos possam ser melhor abordadas".

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