Início do conteúdo

10/07/2005

IFF instala leitura em UTI neonatal

Roberta Monteiro


O mundo que cerca o recém-nascido é repleto de sentimentos, desejos e expectativas por parte de seus familiares. O processo de negação e ausência da figura materna, diante da necessidade de intervenção médico-hospitalar, que às vezes resulta em prolongadas internações, pode causar danos irreparáveis ao desenvolvimento psicossocial da criança. Para amenizar a angústia e incentivar a formação do vínculo entre mãe e filho, a coordenação do Projeto Biblioteca Viva em Hospital (PBVH), do Instituto Fernandes Figueira (IFF) da Fiocruz, iniciou, há dois meses, um projeto pioneiro no Brasil denominado Leitura para Recém-nascidos em Berçário de Alto Risco.


Num primeiro momento, a leitura para recém-nascidos pode causar estranhamento, já que bebês permanecem aproximadamente 20 horas do dia dormindo e o domínio do código lingüístico só ocorrerá bem mais tarde. Entretanto, apesar da linguagem verbal somente começar a se estruturar por volta dos 18/24 meses, o processo de desenvolvimento da linguagem é longo e tem início logo após o nascimento, a partir das interações que a criança estabelece com as pessoas e o ambiente à sua volta. 


Mas, segundo o neurologista infantil, Adailton Pontes, o bebê ao nascer é dotado de praticamente todos os sentidos e está biologicamente preparado para experimentar sensações como ver, ouvir, cheirar e tocar. Dessa forma, a leitura pode proporcionar ao bebê o primeiro contato com sentimentos e emoções, que são identificadas por ele, de acordo com as entonações e o ritmo dado às melodias da voz humana. "Desde a vida intra-uterina, o bebê é capaz de reconhecer a voz da mãe e reage às emoções vividas por ela, através de respostas fisiológicas, como os batimentos cardíacos", constata Adailton, ressaltando a importância do calor materno para o desenvolvimento físico e mental do bebê.


Se por um lado o aparato hospitalar é essencial para a sobrevivência do recém-nascido, por outro o ambiente cercado de tecnologia, com ruídos e procedimentos, muitas vezes dolorosos, podem causar o afastamento da mãe, que teme atrapalhar o tratamento. O neurologista afirma que o período que vai do nascimento até os primeiros anos de vida são fundamentais para o desenvolvimento da personalidade e que a falta de afeto materno pode causar graves conseqüências para o indivíduo em outras etapas da vida.


Segundo a coordenadora do PBVH no IFF, Magdalena Oliveira, mesmo o projeto sendo novidade no Instituto, já é possível observar alguns resultados positivos no berçário de alto risco. Esse fato se deve ao efeito que a leitura exerce na mãe, que passa a encarar o projeto como uma forma de aproximação com o filho. "O momento da leitura é fundamental, pois apresenta uma função mediadora da relação mãe-bebê, auxiliando a mãe a estabelecer um diálogo com o filho e, assim, fortalecer os laços de afeto", destaca Magdalena.


Para desenvolver o trabalho do PBVH, o IFF conta, atualmente, com 45 voluntárias, que reservam no mínimo duas horas por semana, para levar histórias a adultos e crianças. Além do berçário de alto risco, que só foi incorporado pelo Projeto recentemente, desde 2000, o trabalho vem sendo desempenhado nos corredores dos ambulatórios e nas enfermarias de pediatria, cirurgia e DIP (doenças infecto-parasitárias), atendendo a cerca de 960 crianças ao mês.


O grupo de voluntárias é formado na maioria por aposentadas e donas de casa, mas também conta com a participação de pessoas que trabalham. É o caso da jornalista Ana Lins, que participa do projeto desde o final de 2003. Para ela, o voluntariado ocupa um lugar tão importante quanto a vida profissional. "Ler para crianças e bebês é uma das experiências mais emocionantes da minha vida", garante Ana.


Promover a reconstituição de um espaço de vitalidade, de preservação e de desenvolvimento da saúde psíquica, não apenas a bebês e crianças, mas também de apoio à mãe, é o que propõe o PBVH. De acordo com Magdalena, uma ação social como essa possibilita um olhar diferenciado dos pais a respeito do ambiente hospitalar, que passa a ser visto não apenas como um hospital, mas como um local onde a leitura é oferecida como forma de entretenimento, amparo e aprendizagem. "Todo o trabalho assistencial que garanta o afeto, o amor e que fortaleça o vínculo entre a mãe e seu filho é positivo e de extrema importância para o sucesso de qualquer tratamento", completa Adailton.

Voltar ao topo Voltar