22/10/2008
Fernanda Marques
Designers e arquitetos podem contribuir para a promoção da saúde. Foi a partir desta constatação que o designer Elio Grossman produziu sua tese de doutorado na Fiocruz, onde trabalha há 22 anos. Na pesquisa, ele analisou o ambiente físico de laboratórios da instituição, promoveu oficinas para ouvir os trabalhadores que ocupavam esses espaços e estudou a legislação sobre o tema. Os resultados se transformaram em propostas de intervenção para garantir, cada vez mais, a biossegurança, a eficiência e o bem-estar nesses locais de trabalho. “Quanto mais a interação entre o ser humano e o ambiente físico se aproxima do conflito, maior é o grau de adoecimento. Quanto mais perto da sintonia, maior é o grau de sustentabilidade e qualidade de vida”, escreveu o autor na conclusão da tese, defendida no Programa de Pós-Graduação em Ensino em Biociências e Saúde do Instituto Oswaldo Cruz (IOC).
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Para o autor, há necessidade de se fazer um cuidadoso projeto de design e arquitetura para os utensílios e ambientes de trabalho, visando estimular os indivíduos a exercerem suas tarefas com criatividade |
A trajetória de Grossman na Fiocruz ilustra bem como o design e a saúde podem estar conectados. Levando em conta estética, funcionalidade, durabilidade, emoção e produtividade, ele projetou mobiliário para laboratórios de pesquisa, embalagem de vacinas e berços hospitalares para recém-nascidos, entre outros trabalhos. A idéia é que os projetos de design auxiliem a transformação positiva do estado de espírito daqueles que utilizam os ambientes destinados à saúde.
Grossman explica que, para essa transformação, é preciso ter em mente que as pessoas e os objetos não só estão no mesmo ambiente, mas também se relacionam entre si no espaço. E essa relação não se resume aos aspectos funcionais: ela tem uma dimensão simbólica, que pode despertar sentimentos bons ou ruins. Daí a necessidade de um cuidadoso projeto de design e arquitetura para os utensílios e ambientes de trabalho, visando estimular os indivíduos a exercerem suas tarefas com criatividade e, ao mesmo tempo, assegurar a saúde física e mental da equipe.
Contudo, essas questões que vão além da parte física e englobam a dimensão psicológica ainda não encontram eco na legislação sobre espaços destinados à saúde. “A maior parte das leis, normas e portarias governamentais que dizem respeito a planejamentos, projetos e obras desses ambientes atenta somente para os aspectos de riscos físicos que possam agredir a fisiologia do trabalhador. Não contempla os aspectos psicofisiológicos, que devem ser aprofundados e considerados na formulação de normas contemporâneas”, recomenda Grossman.
De acordo com o pesquisador, para que os projetos de design e arquitetura, de fato, atinjam seu objetivo de promover a saúde de forma integral, eles não devem ser elaborados sem a participação dos trabalhadores ou usuários daquele espaço. “Quando um grupo de trabalhadores reivindica melhorias no seu ambiente de trabalho, como por exemplo a reforma do laboratório, há várias formas de encaminhar a solicitação: podem solicitar a reforma e simplesmente aguardar os resultados ou tentar planejá-la juntamente com arquitetos, designers e engenheiros, para garantir um laboratório de acordo com as necessidades dos que ali trabalham e, depois, acompanhar a obra”, diz Grossman. “A participação individual e coletiva dos atores é um fator central na discussão da promoção da saúde”.
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Ambiente de sala de descanso em uma empresa de tecnologia de ponta dos Estados Unidos |
Como instrumento de coleta de dados para sua pesquisa e também como ferramenta para os profissionais envolvidos em reformas de locais de trabalho, Grossman idealizou e executou a oficina Espaço, Criação e Alegria. Ela inclui estratégias de sensibilização e reflexão sobre o tema e se configura como um momento no qual os trabalhadores ou usuários se expressam, os gestores e projetistas registram as diferentes percepções, opiniões e demandas, e todos trocam conhecimentos e vivências.
No doutorado, Grossman promoveu oficinas com cerca de 40 trabalhadores que representavam as diferentes atividades feitas em laboratórios: pesquisa, ensino, administração e apoio. Durante as oficinas, os participantes desenharam seu ambiente de trabalho e sua casa, sendo que esta, quase sempre, foi retratada de forma mais colorida e alegre, com janelas amplas e paisagens. “Já nos desenhos do ambiente de trabalho nos laboratórios, os computadores aparecem em maior número e, por vezes, em maiores dimensões do que as cadeiras, o que demonstra uma valorização destas máquinas. As mesas, por sua vez, quase sempre têm um excesso de objetos sobre o tampo”, conta Grossman.
A proposta do pesquisador é, gradualmente, transformar os laboratórios em ambientes menos sisudos, sem – é claro – abrir mão da biossegurança e do rigor do trabalho. Grossman sugere estratégias que envolvem, por exemplo, a escolha certa da iluminação, das cores, dos materiais, das texturas, dos móveis e dos demais objetos que compõem aquele ambiente, bem como a criação de novos espaços de lazer e convivência. Como exemplo de equilíbrio, o autor cita o Castelo da Fiocruz. “Mesmo vinculado à sua época, à visão de Oswaldo Cruz e ao traço do projetista Luiz Moraes Júnior, o prédio nos fascina e nos ensina o diálogo entre a beleza e a funcionalidade, articulando ciência e arte no cotidiano dos trabalhadores”, destaca.