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20/07/2005

Novas moléculas para o tratamento da asma são alvo de pesquisas

Fernanda Marques


Desde meados da década de 90, pesquisadores vêm reunindo indícios de que a lidocaína - anestésico local de curta duração utilizado, por exemplo, na odontologia e em certos procedimentos cirúrgicos - pode aliviar os sintomas da asma. Recentemente, um grupo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fiocruz obteve as primeiras evidências experimentais que ajudam a explicar por que a lidocaína se mostra eficiente quando empregada como alternativa no tratamento de pacientes asmáticos. A equipe também analisou duas moléculas derivadas da lidocaína, sintetizadas pelo Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos). Em ensaios preliminares, elas tiveram ação contra a asma e seu uso parece mais adequado que o da lidocaína. Portanto, as duas moléculas, codificadas como JM24-1 e JMF2-1, são candidatas a novas drogas contra a doença.


Antiinflamatórios e broncodilatadores são as principais classes de medicamentos usadas no tratamento da asma - doença respiratória crônica que já atinge 20% da população brasileira. Porém, em alguns pacientes, esses medicamentos podem causar efeitos colaterais graves, como diabetes, desmineralização óssea e problemas cardíacos. Isso demonstra a necessidade de novas estratégias terapêuticas contra a asma. Nesta doença, estão envolvidos fatores genéticos e ambientais. Em pacientes asmáticos, certos patógenos - que para a maioria das pessoas não causariam nenhum problema - desencadeiam uma resposta exagerada do sistema imune, provocando inflamação e constrição das vias respiratórias.


Nos anos 90, grupos de pesquisadores investigavam as células imunológicas em fluidos das vias respiratórias de pacientes asmáticos. Esperavam encontrar nesses fluidos quantidades aumentadas de eosinófilos, células que parecem desempenhar um papel importante no processo inflamatório da asma. Nesses estudos, uma equipe dos Estados Unidos utilizou lidocaína para anestesiar os pacientes submetidos à broncoscopia (técnica para o exame visual direto da traquéia e dos brônquios que usa um aparelho também capaz de coletar material). Foi observado que, nesses pacientes, ao contrário das expectativas, o número de eosinófilos era reduzido.


Foi então que surgiu a suspeita de que a lidocaína teria um efeito modulador dos eosinófilos e, portanto, o anestésico poderia ser empregado no tratamento da asma. Depois, outras pesquisas revelaram que o uso de lidocaína, na forma de aerossol, aliviava os sintomas da asma. Alguns trabalhos chegaram a mostrar que a substância reduzia o número de eosinófilos no sangue. Contudo, a primeira prova de que, quando o anestésico é usado com o propósito de tratar a doença, realmente ocorre uma redução do número de eosinófilos nos fluidos das vias respiratórias foi obtida no Laboratório de Inflamação do Departamento de Fisiologia e Farmacodinâmica do IOC. Os experimentos foram, inicialmente, realizados in vitro e in vivo, neste caso em ratos.


Além da evidência de que a lidocaína pode controlar o processo inflamatório da asma, os pesquisadores do IOC, coordenados pelo biólogo Marco Aurélio Martins, têm outros resultados que chamam a atenção. Ao que parece, o anestésico também pode atenuar a constrição das vias respiratórias característica da doença. Pelo menos foi o que mostrou um estudo ex vivo feito com anéis de traquéia de ratos. "Observou-se o relaxamento da musculatura lisa da traquéia tratada com lidocaína, JM24-1 ou JMF2-1 após estímulo antigênico, que mimetizou o que acontece durante uma crise de asma", afirma Martins.


No entanto, cientistas de todo o mundo ainda têm dúvidas sobre como a lidocaína atua no controle da asma. Estudos conduzidos pela equipe de Martins sugerem que o efeito anestésico da susbtância não influencia sua ação contra a doença. Os pesquisadores chegaram a essa conclusão ao testar as duas moléculas que, embora análogas à lidocaína, não apresentam suas propriedades anestésicas.


Em experimentos com animais, as moléculas análogas se mostraram tão ou mais promissoras que a lidocaína no tratamento da asma. "Em algumas pesquisas no exterior, pacientes asmáticos que usaram lidocaína relataram incômodo devido ao efeito anestésico após a nebulização da substância. Nesse sentido, as novas moléculas que sintetizamos devem causar menos desconforto na administração", diz Martins. No entanto, antes que sejam testadas em humanos, essas novas moléculas precisam passar uma série de análises toxicológicas.

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