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21/06/2019

Pesquisador analisa o trabalho do Observatório da Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, da Floresta e das Águas

OTSS


O atual contexto socioambiental preocupa ambientalistas, pesquisadores e, mais ainda, os povos e comunidades tradicionais que guardam a sociobiodiversidade dos biomas brasileiros. Em entrevista ao Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), o pesquisador da Fiocruz Ceará Fernando Carneiro, aborda a importância de se demonstrar cada vez mais, por meio de estudos científicos, a importância da proteção naturalmente exercida pelos chamados povos dos campo, das florestas e das águas na salvaguarda da sociobiodiversidade brasileira. Ele tem sua trajetória profissional ligada à promoção da saúde no campo e integra GT Saúde e Ambiente da Abrasco e o Observatório da Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, Floresta e das Águas – Teia de Saberes e Práticas (OBTEIA).

"Cuidar das populações do campo, da floresta e das águas é cuidar de quem hoje são os guardiões da nossa biodiversidade", pontua Fernando Carneiro (Foto: Acervo Pessoal)

 

OTSS: Como a Fiocruz atua na promoção da saúde para as populações do campo e seus ambientes?

Fernando Carneiro: Quando a Fiocruz lança o Programa Institucional de Territórios Sustentáveis e Saudáveis, o PITSS, percebemos que se trata de um tema importante, e que bom que está sendo institucionalizado. Sabemos que, a cada momento, esses territórios estão sendo mais ameaçados frente à nova conjuntura política econômica, e social, pois estamos vivendo profundas ameaças à democracia e aos direitos humanos. 

De que forma o trabalho do OBTEIA e do OTSS dialogam?

Fernando Carneiro: O OTSS tem algumas convergências com o OBTEIA como, por exemplo, essa forma de gestão que envolve movimentos sociais e a academia, criando os diálogos de saberes e as parcerias com os povos tradicionais. Acredito que esse seja o maior ponto de convergência entre os nossos trabalhos. Na medida em que assumimos esse apoio com pesquisas, cooperação e construção coletiva, convergimos, cada qual em seus territórios de atuação. 

Quais as áreas de atuação da Fiocruz Ceará para os povos do campo, das florestas e das águas?

Fernando Carneiro: Aqui na Fiocruz Ceará nossa área de saúde e ambiente se desdobra em quatro grandes eixos de atuação: água e saneamento; direitos humanos para o semiárido; impactos de grandes empreendimentos e agroecologia. Tudo isso fazendo junto a integração dos assuntos de saúde da família, atenção básica e ambiente de trabalho. Nosso trabalho é realizado por meio de metodologias críticas e participativas como a ecologia de saberes. Nós também temos feito pelo Brasil pesquisas de formação e cooperação em territórios sertanejos e pesqueiros. 

Agroecologia é sinônimo de saúde. Como vê essa relação?

Fernando Carneiro: Nós entendemos que promover a agroecologia também é uma forma de promover a saúde. Por isso, cuidar dessas populações do campo, da floresta e das águas é cuidar de quem hoje são os guardiões da nossa biodiversidade. As pescadoras que estão preservando o mangue, os indígenas e seringueiros que estão preservando as florestas, os ribeirinhos que estão preservando os rios, os sem terra que querem produzir sem veneno. Essas populações hoje são invisibilizadas tanto pelos dados oficiais quanto pelas políticas públicas, e o capital as enxerga como empecilho ao desenvolvimento porque elas "atrapalham" a usurpação dos recursos naturais. Esses povos estão há muitas  gerações cuidando e sendo cuidados pela natureza. 

Quais os principais impactos para as populações tradicionais do Ceará?

Fernando Carneiro: O Ceará não tem tantas florestas como a região da Bocaina. Lá estão concentradas as populações sertaneja e litorânea. No caso  dos povos do mar, eles têm recebido muito impacto do polo portuário, a poluição atmosférica, desterritorialização das populações pesqueiras para construção dos grandes parques de usinas eólicas. Esses são apenas alguns exemplos das atividades altamente impactantes para essas populações. Sem contar a contaminação por agrotóxico, a mineração de ferro e toda a questão da falta de políticas públicas adequadas que gera enorme desequilíbrio e desigualdade social. Hoje o Ceará vive o medo do retorno da fome em regiões em que ela já tinha sido banida. 

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