A implementação do estudo sobre Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) na América Latina é objeto da mais nova parceria coordenada pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), através do Laboratório de Pesquisa Clínica em DST/Aids (LaPClin-Aids). O projeto reúne instituições de saúde do Brasil, do México e do Peru e estuda o uso da truvada – combinação dos medicamentos tenofovir e emtricitabina em um único comprimido – como forma de prevenir a infecção por HIV em populações com risco considerável, como os homens que fazem sexo com homens (MSM), travestis e mulheres transexuais (TGW). O estudo é fruto de um esforço conjunto do Ministério da Saúde brasileiro e da Fiocruz e prevê o desenvolvimento de políticas públicas e posterior disponibilização do medicamento visando reduzir o contágio pelo vírus HIV nos respectivos países. A iniciativa conta com financiamento da Unitaid e apoio dos Ministérios da Saúde dos países participantes e da Fiotec.
O projeto foi apresentado e discutido durante um encontro de quatro dias realizado no INI/Fiocruz, de 23 a 26 de janeiro, onde diversos pesquisadores e profissionais envolvidos com estudos sobre HIV/Aids acertaram os pontos finais da parceria. No primeiro dia de atividades, no Auditório do Pavilhão de Ensino do Instituto, a pesquisadora do LaPClin-Aids, Valdiléa Veloso, coordenou a reunião onde foram apresentados os objetivos e metas da parceria tríplice entre Brasil, México e Peru.
Para o gerente geral da Fiotec, Adilson Gomes dos Santos, é positivo para todos reunir os agentes envolvidos no estudo que estão preocupados em resolver problemas de Saúde Pública nos seus respectivos países, comprovando assim o comprometimento de todos na luta contra o HIV. Já a representante da Unitaid, Judith Polzky, destacou o pioneirismo brasileiro em adotar a PrEP através dos estudos desenvolvidos no INI, auxiliando assim a Organização Mundial de Saúde na multiplicação dos resultados obtidos a outros países.
Já Giovanni Ravasi, da Organização Pan-americana de Saúde, afirmou que a parceria é fundamental para as novas estratégias de adoção da PrEP no combate a essa doença crítica para a saúde pública. Por fim, a diretora do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Adele Benzaken, citou o Brasil como exemplo no tratamento para todos os pacientes com HIV/aids e lembrou que o MS está trabalhando intensamente para a implementação efetiva da PrEP, aguardando apenas os trâmites técnicos para tal, o que deve ocorrer ainda esse ano.
Desenvolvimento do projeto
Coube a Valdiléa Veloso, pesquisadora do INI/Fiocruz, apresentar os objetivos e a estrutura do projeto, explicando os determinantes estruturais, programáticos e individuais que contribuem para as altas taxas de prevalência do HIV entre homens que fazem sexo com homens (MSM) e travestis e mulheres transexuais (TGW). Nos países que integram o estudo a prevalência de HIV é: MSM – Brasil (14,2%), México (16,9%) e Peru (12,4%). No caso das TGW – Brasil (33,1%), México (20%) e Peru (30%).
“O projeto abordará áreas estratégicas, visando fornecer as informações identificadas nos programas públicos desses países para sanar brechas estratégicas que dificultam o escalonamento dos planos, servindo como um catalisador para a preparação da implantação efetiva da PrEP”, explicou Valdiléa. A pesquisadora lembrou ainda que até dezembro de 2016, nenhum país da América Latina havia implementado a PrEP como uma política pública de saúde.
Ao todo, 19 cidades foram incluídas no estudo: oito no Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba. Florianópolis, Recife, Manaus e Brasília), cinco no México (Cidade do México, Guadalajara, Puerto Vallarta, Oaxzaca e Juchitan) e seis no Peru (Lima/Callao – – províncias que concentram 71% dos casos de Aids do país), Iquitos, Pucallpa, Tarapoto, Chiclayo e Trujillo.
“Nosso principal objetivo é contribuir para reduzir a incidência de HIV nessas populações específicas através da PrEP como um componente do serviço de saúde local”, disse. A expectativa é que participem do estudo 7.500 pessoas dos três países ao longo de três anos.
Perspectivas para Peru e México
O Peru enfrenta uma série de questões quanto à prevenção do HIV, relatou Carlos Cáceres, da Universidad Peruana Cayetano Heredia (UPCH) [1], entre elas a queda no uso do preservativo, a pouca frequência na realização de exames de HIV/Aids, a barreira no acesso ao início do tratamento e o alto estigma da doença. O fortalecimento da estratégia geral de prevenção e incremento da cobertura PrEP, a partir da incorporação de novas tecnologias, o desenvolvimento do conceito de prevenção combinada, o maior potencial para abordar, de forma efetiva, a epidemia nessas populações (MSM e TGW), e a identificação de critérios para fortalecer o conhecimento e a capacidade das equipes de saúde em sua relação com a prevenção combinada e a PrEP são algumas das metas esperadas pelo representante peruano com essa parceria.
Já Hamid Vegas, da Clínica Especializada Condesa [2], do México, espera aproveitar as evidencias positivas do uso da PrEP no Brasil para incorpora-las no sistema de saúde mexicano, além de mudar o conceito e as propriedades de investimentos nessa área e promover a integração das diretrizes nacionais de diagnóstico e tratamento do HIV. O representante mexicano lembrou que no país a utilização da medicação é feita apenas para tratamento, não para prevenção da doença, e espera mudar esse conceito com o estudo.
Sobre a medicação da PrEP
O medicamento deve ser tomado diariamente fazendo com que o usuário desenvolva uma espécie de “barreia química” contra o vírus HIV, oferecendo proteção ao manter relações sexuais. Entretanto, quem adotar a medicação não deverá abrir mão do uso da camisinha. A PrEP é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) mas é adotada apenas para o tratamento e não prevenção à doença em diversos países.