13/12/2013
Desde 2005, a busca por métodos alternativos que dispensem o uso de animais em pesquisas laboratoriais tem sido prioridade para um grupo de pesquisadores do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz). A partir uma parceria da instituição com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), esse esforço conjunto originou, em setembro de 2012, o Centro Brasileiro de Validação de Métodos Alternativos (BraCVAM), o primeiro da América Latina a validar e coordenar estudos de substituição, redução ou refinamento do emprego de cobaias em testes de laboratório.
“No Brasil, já existe cerca de 20 grupos de pesquisadores que trabalham com a elaboração de métodos alternativos para o uso de animais e que realizavam seus estudos isoladamente, tendo a oportunidade de se encontrar apenas em congressos internacionais. Isso porque faltava um espaço que reunisse esses estudos e organizasse o potencial de pesquisa brasileiro”, explicou Octavio Presgrave, pesquisador do INCQS e coordenador do novo centro de validação. “O BraCVAM surge para preencher essa lacuna e, junto com o Conselho Nacional de Experimentação Animal (Consea) e a Rede Nacional de Métodos Alternativos (Renama), organizar o expertise e a demanda nacional por métodos que substituíam ou reduzam o uso de animais em pesquisas”.
Segundo o coordenador, a proposta é que o BraCVAM identifique, nacional e internacionalmente, métodos alternativos, sugerindo a adaptação à demanda nacional e estimulando a substituição dos métodos em estudos brasileiros. Além disso, o centro também seria responsável por receber propostas de universidades, instituições de pesquisas e indústrias que tenham criado novos métodos e queriam submetê-los a aprovação no Brasil. A Renama, constituída por laboratórios públicos, privados, universidades e indústrias, executaria efetivamente esses estudos, verificando a eficácia, e o Consea avaliaria o método e os resultados, propondo sua oficialização. “A ideia é que o BraCVAM recomende ao Concea a oficialização de métodos substitutivos, nacionais ou internacionais. O processo de validação a ser usado pelo centro no Brasil foi enviado ao Concea para ser avaliado e homologado, e precisa ser oficializado para que possa ser implantado”, destacou Presgrave. “Hoje, o Brasil ainda não valida esses métodos, nem obriga os laboratórios a substituírem suas práticas. Nós temos todas as instâncias necessárias, mas ainda precisamos definir exatamente como estas trabalharão em conjunto”.
Presgrave acrescentou que o INCQS tem trabalhado métodos que visam substituir diversos procedimentos, como testes de irritação ocular em coelhos, relacionados a estudos de medicamentos, e de contaminação por produtos injetáveis em camundongos, usado na produção e controle de soros ou vacinas. “Os resultados são promissores, mas dependem de financiamento e de liberação de entraves burocráticos. É importante dizer que resolver essas questões não significa que concluiremos esses estudos em um ano, mas os resultados obtidos mostram que podemos substituir e adaptar alguns métodos que foram validados no exterior para produtos de uso e interesse brasileiros”, afirmou. “Se conseguirmos validar o método de produtos injetáveis, por exemplo, que é de especial interesse aqui no país, podemos reduzir muito o uso de animais em pesquisas.”
De acordo com o pesquisador, a validação de métodos alternativos não é um processo simples. Na maioria das vezes, é possível substituir os animais em uma etapa ou procedimento do estudo, mas não em toda a metodologia utilizada. “Existem métodos que foram criados e validados rapidamente, mas também existem aqueles criados há quase 20 anos e que ainda não foram. Inúmeros são os fatores para a não validação, mas boa parte dos procedimentos ou metodologia depende de avanços na tecnologia empregada. Em média, o processo de validação dura de cinco a 10 anos”, elucidou.
Ele ainda apontou que existem leis no Brasil que restringem a importação de material humano como, por exemplo, pele reconstituídas, utilizadas em pesquisas de irritação cutânea. “Um kit com esse material dura cerca de uma semana e o processo alfandegário vai além disso”, comentou o pesquisador. “Se não conseguirmos vencer esses entraves de processos burocráticos, a pesquisa com esses kits fica inviabilizada. Em São Paulo, há estudos para o desenvolvimento de um kit nacional, mas o modelo ainda precisa ser validado frente ao utilizado internacionalmente, o que constitui mais uma barreira que temos que vencer”.
Apesar das dificuldades, Presgrave destacou que, nos últimos anos, os estudos envolvendo métodos alternativos apresentou avanços consideráveis em todo o mundo. “Atualmente, existem estudos em que podemos substituir o uso de animais: há 20 ou 30 anos, era impossível pensar nisso. É a mesma coisa agora: hoje, ainda há áreas em que não é possível deixarmos de utilizar, mas a medida que o conhecimento humano for aumentando e novas tecnologias forem surgindo e sendo implementadas, essas podem contribuir para que um dia deixemos totalmente de usar animais em pesquisas", concluiu.
Conheça alguns dos métodos alternativos já desenvolvidos pela Fiocruz:
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Experimentação Animal
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