07/05/2007
Pela primeira vez o Brasil decretou o licenciamento compulsório de um medicamento. O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou nesta sexta-feira (04/05), em Brasília, um decreto que oficializa o licenciamento compulsório do anti-retroviral Efavirenz. O laboratório Merck teve prazo de sete dias para se pronunciar após a declaração de interesse público pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, por meio da portaria 886, de 24 de abril. Nesse período o laboratório ofereceu desconto de 30% sobre o preço de US$ 1,59 por comprimido, valor pago atualmente pelo Governo Federal. Essa proposta foi considerada insatisfatória, já que o Brasil pode conseguir o produto até por US$ 0,45.
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Produção de anti-retroviral em Farmaguinhos (Foto: Rogério Reis) |
O licenciamento compulsório permite que o Ministério da Saúde importe versões genéricas do Efavirenz de laboratórios pré-qualificados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A qualidade, a segurança e a eficácia do medicamento importado oferecido aos pacientes brasileiros estão asseguradas pelos testes de bioequivalência e biodisponibilidade exigidos. Atualmente, três laboratórios indianos atendem as exigências da OMS. São eles: Cipla, Ranbaxy e Aurobindo.
O anti-retroviral Efavirenz é o medicamento importado mais utilizado no tratamento da Aids. Atualmente, 38% dos doentes utilizam o remédio nos seus esquemas terapêuticos. Estima-se que até o final deste ano, 75 mil das 200 mil pessoas farão uso daquele medicamento. Parte da produção será feita no Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos), uma unidade da Fiocruz, e parte no Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco (Lafepe).
Com os valores praticados pelo laboratório para o país, o custo por paciente/ano equivale a US$ 580, o que representaria um orçamento anual de US$ 42,9 milhões para 2007. Os preços do produto genérico variam de US$ 163,22 a US$ 166,36 o custo por paciente/ano. A partir desses valores, com o licenciamento compulsório, a redução de gastos em 2007 será em torno de US$ 30 milhões. A estimativa de economia até 2012, data em que a patente Efavirenz expira, é de US$ 236,8 milhões.
A decisão do governo brasileiro está em absoluta conformidade com os preceitos internacionalmente exigidos, bem como com a legislação nacional vigente. O licenciamento compulsório por interesse público caracteriza-se como medida legítima e necessária para a garantia do acesso ao Efavirenz a todos os pacientes que fazem uso do medicamento por intermédio do Programa Nacional de DST/Aids, do Ministério da Saúde.
Interesse público
O licenciamento compulsório é uma flexibilidade prevista no artigo 31 do Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionadas ao Comércio (Trips, na sigla em Inglês). A prática é utilizada por países desenvolvidos, como Itália e Canadá para produtos farmacêuticos e também por países em desenvolvimento. No caso dos anti-retrovirais, Moçambique, Malásia, Indonésia e Tailândia já se utilizaram do dispositivo. Tailândia, inclusive, decretou recentemente o licenciamento compulsório do Efavirenz. No Brasil, o licenciamento compulsório pode ser implementado a partir de circunstâncias previstas na Lei de Propriedade Industrial Brasileira, tais como o exercício abusivo dos direitos, abuso do poder econômico, não-exploração local, comercialização insatisfatória, emergência nacional e interesse público.
No caso do anti-retroviral Efavirenz, a licença compulsória se fundamentou no interesse público tendo em vista a necessidade de assegurar a viabilidade do Programa Nacional de DST/Aids. Essa forma deve ser concedida para uso não-comercial, exploração não exclusiva, e de forma temporária, com prazo de vigência determinado, podendo, entretanto, ser prorrogado, perdurando enquanto existir o interesse público. Ressalta-se que, de qualquer forma, está assegurado o pagamento de royalties ao detentor da patente.
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