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09/11/2010

Brasil e Moçambique dão mais um passo na criação de fábrica de antirretrovirais na África


Um dos mais expressivos empreendimentos da cooperação bilateral entre Brasil e Moçambique dará um passo importante em sua implementação nesta quarta-feira (10/11), quando haverá a apresentação das instalações da Sociedade Moçambicana de Medicamentos. A fábrica será a primeira empresa de capital 100% público do setor na África e tem como principal objetivo a produção de antirretrovirais e outros medicamentos. O evento contará com a presença dos presidentes de Moçambique e do Brasil, Armando Emílio Guebuza e Luiz Inácio Lula da Silva, além de ministros e autoridades de ambos os países. Pela Fiocruz estarão presentes o presidente Paulo Gadelha, a vice-presidente de Ensino, Informação e Comunicação, Maria do Carmo Leal, e o diretor do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos), Hayne Felipe da Silva - a unidade da Fundação é responsável pela implantação da fábrica em Moçambique. A Fiocruz também mantém parcerias com Moçambique na área materno-infantil, por meio da capacitação de profissionais e na implantação de um banco de leite humano e um centro de lactação, e em outros setores. Para saber mais sobre o projeto da fábrica, clique aqui.


 Fachada da fábrica de produção de antirretrovirais em Moçambique

 Fachada da fábrica de produção de antirretrovirais em Moçambique


O apoio do governo brasileiro contempla todas as etapas do projeto, passando pelos estudos de viabilidade, aquisição de equipamentos, transferência de tecnologias, capacitação técnica, validação e registros e outros módulos. Entre os resultados esperados destacam-se a ampliação do acesso aos medicamentos para os pacientes que vivem com HIV em Moçambique, com a produção anual de 226 milhões de unidades farmacêuticas por ano para pacientes (cinco medicamentos, dentre eles o Lamivudina + Zidovudina + Nevirapina, formulação adulta e pediátrica), além de 145 milhões de unidades farmacêuticas de outros medicamentos (tais como ácido fólico, diclofenaco de potássio, captopril e metronidazol). Outro ponto fundamental da parceria é a capacitação técnica e gerencial de profissionais moçambicanos e a transferência de tecnologia de 21 medicamentos.


Hoje, 80% dos recursos financeiros para a aquisição de medicamentos em Moçambique vêm de países doadores. Com a implementação da fábrica, o país iniciará a aquisição do conhecimento tecnológico na produção pública de medicamentos em consonância com os atuais padrões internacionais de Boas Práticas de Fabricação (BPF). Assim, Moçambique caminha para a redução da dependência e ampliação da autonomia no setor, com a possibilidade de converter os atuais doadores em parceiros desta nova iniciativa.


 Aperto de mãos entre os presidentes de Moçambique, Armando Emílio Guebuza, e da Fiocruz, Paulo Gadelha, em julho de 2009, celebrou uma aproximação dos dois países na saúde (Foto: Peter Ilicciev/CCS)

Aperto de mãos entre os presidentes de Moçambique, Armando Emílio Guebuza, e da Fiocruz, Paulo Gadelha, em julho de 2009, celebrou uma aproximação dos dois países na saúde (Foto: Peter Ilicciev/CCS)


Para executar o projeto, o Ministério da Saúde do Brasil designou o Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos) da Fiocruz, principal laboratório público produtor de medicamentos para o Sistema Único de Saúde. Outras instituições brasileiras também participam do projeto e têm um papel de alta relevância, tais como, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que vem trabalhando junto ao Governo de Moçambique para o fortalecimento da agência regulatória local; e a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) do Ministério das Relações Exteriores (MRE), que apoia a capacitação dos técnicos moçambicanos no Brasil e em Moçambique.


A fábrica está localizada em Matola, cidade nos arredores de Maputo, capital de Moçambique. O local foi adquirido em 2008 pelo governo moçambicano, onde já funcionava uma unidade produtora de soluções parenterais. O espaço, que tem ao todo cerca de 20 mil m², conta com 3 mil m² de área construída e com uma área ociosa de 2 mil m², no interior do armazém, que será adaptada para a instalação da nova fábrica de medicamentos.


Assim, com a realização do estudo pelo Brasil e a aquisição do espaço por Moçambique, consolida-se um dos mais expressivos empreendimentos da cooperação técnica dos dois países, marco nas atividades da cooperação sul-sul. Uma ação estruturante, com desenvolvimento da visão de negócios, da tecnologia industrial e, principalmente, do comprometimento social, com a produção de medicamentos que serão distribuídos à população moçambicana e africana.


Além da fábrica de medicamentos, a Fiocruz apoia vários outros programas na área da saúde em Moçambique: participa das atividades do Acordo Trilateral entre Brasil, Moçambique e os Estados Unidos no controle do HIV; promove o mestrado em ciências da saúde na área de pesquisa e de laboratórios, em cooperação com o Instituto Nacional de Saúde de Moçambique, formando pesquisadores da primeira turma ainda este ano;  desenvolve atividades que contribuem para a redução da mortalidade materna, neonatal e infantil;  capacitação de profissionais em serviço, implantação de banco de leite humano e de centro de lactação; e apoia a formação politécnica em saúde, entre outras ações de parceria. Esses projetos de cooperação em Moçambique se inserem no âmbito mais amplo da cooperação em saúde com os países da CPLP, conforme definido no Plano Estratégico de Cooperação em Saúde (Pecs) assinado pelos ministros de Saúde da CPLP em 2009, em Lisboa.


Primeira máquina chega a Moçambique


A primeira máquina da fábrica de medicamentos de combate ao HIV em Moçambique chegou no dia 27 de outubro ao país para dar início aos treinamentos industriais. O equipamento – uma emblistadeira  – serve para moldar e embalar comprimidos. Já teve início o processo de treinamento dos técnicos para aprenderem a montagem e utilização deste tipo de máquina. Além da emblistadeira, outras máquinas irão do Brasil a partir de março de 2011, resultantes da doação do governo brasileiro. Também foram encomendados diversos equipamentos para fabricação, controle de qualidade e armazenamento de remédios.


Cronologia da cooperação


A cooperação entre Brasil e Moçambique no combate à problemática do HIV na África iniciou-se em 2003, quando os governos dos dois países começaram a traçar a ideia de implantação de uma unidade produtora de medicamentos antirretrovirais no país. O passo a seguir foi o desenvolvimento de um estudo de viabilidade técnico-econômica, que decorreu entre 2005 e 2007, culminando com a oficialização da aquisição do espaço destinado à nova fábrica de medicamentos, em ocasião da visita do presidente Lula a Moçambique, em 2008.


Com a aquisição pelo governo moçambicano do espaço para a instalação da nova fábrica, iniciam-se as próximas etapas de concretização do projecto: a adequação do espaço, a instalação dos equipamentos - que já foram adquiridos pelo Ministério da Saúde brasileiro -, a transferência de tecnologia e a certificação internacional para a produção de 21 medicamentos, cinco dos quais para o combate do HIV. Inicialmente, a fábrica apenas embalará os remédios enviados a granel pelo Brasil. A etapa da produção propriamente dita deve entrar em funcionamento até o final de 2012. A capacitação e qualificação de profissionais moçambicanos, em diferentes áreas vinculadas ao projeto, já está em curso e continuará durante todo o período. A estimativa é de que até 2014 esteja concluído o processo de transferência tecnológica de todos os medicamentos. O investimento total estimado como compromisso do governo brasileiro é de US$ 21 milhões até 2014, dos quais cerca de US$ 7 milhões foram executados até o presente momento, com estudos de viabilidade técnica e econômica, projeto executivo da obra de instalação e aquisição dos equipamentos.


O HIV em Moçambique


Segundo a estimativa de 2008 do Conselho Nacional de Combate ao HIV (CNCS), um total de 1,6 milhão de pessoas vive com HIV em Moçambique, dos quais 37% são homens e 54% são mulheres maiores de 15 anos, respectivamente, e 9% correspondem a crianças até 14 anos. Aproximadamente 463 mil crianças perderam o pai, a mãe ou ambos devido à Aids, um número que poderá crescer até 558 mil crianças em 2010.


Atualmente, o grupo com maior vulnerabilidade é o das mulheres: aproximadamente seis em cada dez portadores de HIV são do sexo feminino. As faixas etárias com maior risco são de 15-29 e de 20-24 anos, quando as mulheres têm aproximadamente três vezes mais chance de adquirir a doença do que os demais.


De acordo com o relatório de 2009 do CNCS, apesar da expansão significativa dos serviços de tratamento antirretrovirais (TARV), a cobertura para quem necessita deste tipo de serviço ainda é baixa em Moçambique. De acordo com a estimativa, cerca de 374 mil adultos e 72 mil crianças estão no estágio avançado da doença e necessitam de TARV, mas apenas respectivamente 42% e 19% deles recebem o tratamento.


Cooperação no ensino


O mestrado em ciências da saúde foi organizado em parceria com o Instituto Nacional de Saúde do Ministério da Saúde de Moçambique e é realizado por um consórcio de três Programas de Pós-Graduação do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz): biologia celular e molecular, biologia parasitária e medicina tropical. A primeira turma foi financiada pela Capes e teve início em março de 2008, com 15 alunos.


Durante os seis primeiros meses do curso foram oferecidas 15 disciplinas obrigatórias, que totalizaram mais de 430 horas de atividades presenciais. Ao longo de 2009, em continuidade ao processo de desenvolvimento técnico-acadêmico, sete alunos vieram ao Brasil para um período de aproximadamente três meses de estágio na Fiocruz. A estadia dos alunos foi financiada com bolsa Capes.


As defesas dos projetos da primeira turma serão realizadas em novembro de 2010, com temáticas que englobam DST/Aids, malária, protozoários e helmintos, entre outros. A ratificar o sucesso da empreitada, nova turma teve início em março de 2010, já tendo sido ministradas, até o momento, sete disciplinas. No final desse processo deverá ocorrer um efeito multiplicador, pois o retorno dos alunos, quando mestres, aos seus laboratórios induzirão a um impacto positivo na produção de conhecimento em Moçambique.


Publicado em 9/11/2010.

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