Começou nesta quinta-feira (14/10) mais uma etapa da campanha de vacinação em massa contra a Covid-19 na Maré. A campanha #VacinaMaré é uma iniciativa da Fiocruz, Redes da Maré e a Secretaria Municipal de Saúde e o desafio nesta etapa é completar o ciclo de imunização, aplicando amplamente a segunda dose da vacina nos moradores adultos da região.
Presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima participou da abertura da campanha #VacinaMaré (foto: Aline Câmera)
"Doses de gentileza, é disso que se trata a campanha", afirmou Nísia na abertura do evento. Segundo a presidente da Fiocruz, é preciso ver a vacina como algo que desperta a consciência de que a saúde de um depende da saúde do outro. "A pandemia é um grande mal, mas nos traz aprendizados", pontuou, "olhar como um todo para os problemas da saúde, a partir de várias áreas do conhecimento, e fazer isso junto, isso é um ensinamento". Presente na comunidade, Nísia ainda lembrou a operação policial ocorrida pela manhã na localidade como exemplo para a importância do direito à cidade, que envolve o direito à segurança, à saúde e à educação, com o protagonismo da favela. Para ela, o projeto é uma dose de esperança pelo tipo de construção e pelo trabalho democrático envolvendo tantas pessoas, jovens e organizações.
A abertura da campanha #VacinaMaré – 2ª Dose teve início na Clínica da Família Adib Janete às 9h e contou com a presença do secretário de Saúde, Daniel Soranz; a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima; o assessor de Relações Institucionais da Fiocruz, Valcler Rangel; o pesquisador da Fundação, Fernando Bozza; e a coordenadora da Redes da Maré, Luna Arouca. Também participaram do evento o secretário municipal de Educação Renan Ferreirinha e a deputada estadual Renata Souza (PSOL).
"O projeto #VacinaMaré foi um sucesso já na primeira fase, superando as expectativas. Agora vamos acelerar o processo com a aplicação da segunda dose, possibilitando já avaliar alguns resultados da vacinação em massa na proteção da comunidade local, incluindo as crianças", ressalta o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz. Na cerimônia, Daniel ainda destacou a primeira fase da ação "permitiu a vacinação de 99% da população da Maré, o que levou a uma grade redução de casos, uma das menores taxas da cidade”. A esperança é que a segunda fase possa consolidar a proteção e os bons números, com quase 40 mil pessoas vacinadas. O secretário valorizou ainda a vacina Astrazeneca, uma vacina segura e eficaz, e elogiou a campanha #Vacina Maré: "é um modelo de integração entre unidades, escolas, equipamentos comunitários". Ele ainda agradeceu a Redes da Maré pela campanha e a Fiocruz pela parceria, "por tudo o que fez em benefício da Maré, da cidade e do país".
A expectativa da campanha é vacinar toda a população adulta com a segunda dose até sábado (16/10) e também adolescentes a partir de 12 anos que ainda não tomaram a primeira dose. A ação conta com apoio do SAS Brasil, da PUC-Rio e do projeto Conexão Saúde - De Olho na Covid.
A primeira fase do projeto ocorreu no início de agosto e foi um sucesso. Atualmente, 96% da população adulta do território está vacinada com pelo menos uma dose de um dos imunizantes contra a Covid-19. Referência no combate à pandemia em favelas, a Maré apresenta taxa de letalidade abaixo da média do município do Rio de Janeiro e a Fiocruz lidera estudo no território para avaliar efetividade da AstraZeneca, além de monitorar variantes, contaminação de vacinados, entre outros aspectos.
"O projeto #VacinaMaré foi um sucesso já na primeira fase, superando as expectativas", afirmou o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz (foto: Aline Câmera)
A iniciativa antecipa o retorno dos moradores vacinados com a primeira dose às unidades de saúde para que completem o ciclo de imunização, recebendo a segunda dose. Por isso, embora na carteira de vacinação possa constar outra data, moradores que já tenham sido vacinados com a primeira dose há pelo menos oito semanas estão aptos a tomar a segunda dose.
A campanha #VacinaMaré – 2ª Dose acontece a partir de uma grande mobilização no território, que envolve organizações não-governamentais, associações de moradores, clínicas da família, voluntários, moradores, artistas, comunicadores e influenciadores digitais. A ideia é incentivar e esclarecer a população sobre os benefícios da vacinação em massa e celebrar a alta taxa de imunização de moradores da Maré contra a Covid-19.
“É essencial que os moradores compareçam em massa para garantirmos a imunização de toda a comunidade. A proteção só acontecerá após a aplicação da D2 e não podemos perder esta oportunidade mobilizando 100% das pessoas para comparecer. O vírus ainda circula e não podemos relaxar. Venceremos a Covid-19 mantendo o uso de máscaras, as medidas de higiene e com vacina no braço”, destaca Valcler Rangel, assessor de Relações Institucionais da Fiocruz.
A abertura da campanha #VacinaMaré – 2ª Dose ocorreu na Clínica da Família Adib Janete (foto: Douglas Lopes, Redes da Maré)Desta vez, clínicas da família e associações de moradores formarão a rede de pontos de vacinação, que acontecerá das 8 às 17h, prioritariamente na população entre 18 e 33 anos. A Maré apresenta um perfil populacional majoritariamente jovem (51,9% com menos de 30 anos) e esta faixa etária forma a maior parte da população vacinada na primeira fase da campanha. No entanto, todos os moradores acima de 18 anos que ainda não se vacinaram com a primeira ou segunda dose estão aptos a se vacinar nos dias da campanha, assim como adolescentes a partir de 12 anos que ainda não tomaram a primeira dose.
Apresentações culturais e intervenções artísticas com coletivos e artistas da Maré acontecerão próximas aos locais de vacinação, reforçando o caráter de comemoração de resultados que a campanha propõe. "Depois de um ano e meio de perdas, é uma alegria estarmos reunidos aqui para esse projeto", afirmou Luna Arouca, coordenadora da ONG Redes da Maré e do Projeto #Vacina Maré, que representou a diretora da ONG Eliana Silva na abertura da campanha. "É um momento de celebração e cuidado, ainda temos que seguir com as precauções, mas também podemos aproveitar esse momento juntos". Segundo ela, um novo ciclo para a Maré está se iniciando com essa ampla vacinação. Ela espera que muitas iniciativas semelhantes, com o protagonismo das comunidades, venham pela frente e que esta possa inspirar outras.
Em sua participação no evento, o secretário municipal de Educação Renan Ferreirinha afirmou que espera que a experiência da campanha #Vacina Maré possa mostrar como a academia em conjunto com políticas públicas pode mudar a sociedade. "Em tempos em que a gente precisa reafirmar o papel da ciência", pontuou, "é muito importante que a gente defenda acima de tudo a vida e o consenso de que a gente precisa de vacinas".
A deputada estadual Renata Souza (PSOL) destacou a grande participação e protagonismo da população local na campanha. "Como cria da Maré, sei o quanto a favela está mobilizada", disse. Ela ainda afirmou que a campanha revela o potencial da pesquisa e da união entre saúde, ciência e educação para a transformação da vida das pessoas. "As pessoas precisam se ver no projeto", observou.
A expectativa, ao final da ação, é de que casos graves e óbitos pela doença caiam ainda mais na Maré. Dados do boletim Conexão Saúde – De Olho no Corona mostram que a taxa de letalidade por Covid-19 na Maré é praticamente metade da taxa do município do Rio de Janeiro. De todas as pessoas infectadas pela doença na Maré, desde o início da pandemia, 4% faleceram. Na cidade do Rio, este percentual ficou em 7%.
O combate à pandemia no maior conjunto de favelas do Rio de Janeiro se tornou referência a partir do projeto Conexão Saúde – De Olho na Covid, que oferece gratuitamente – desde junho do ano passado – serviços de testagem, telessaúde e apoio no isolamento domiciliar a pessoas com Covid-19, além de ampla campanha de esclarecimento sobre a doença e combate a notícias falsas no território.
Estudo sobre efeitos da vacina
A vacinação em massa de moradores faz parte de um estudo liderado pela Fiocruz, que acompanhará por seis meses (até janeiro de 2022) os efeitos da vacina em duas mil famílias da Maré, totalizando cerca de 8 mil pessoas. Desde a primeira fase da #VacinaMaré, moradores estão sendo chamados a participar voluntariamente do estudo, assinando um termo de consentimento e se comprometendo a notificar os pesquisadores sobre sintomas e possíveis contaminações por Covid-19. Pontos para seleção e inscrição de moradores da Maré que se interessem em participar dos estudos da Fiocruz serão montados nas clínicas da família durante os dias de vacinação da segunda dose.
A pesquisa está dividida em dois estudos que acontecem simultaneamente. O primeiro pretende medir a efetividade do imunizante AstraZeneca contra infecções, levando em conta os critérios de idade, gênero, tipo de vacina ministrada, tempo de infecção após a vacinação, tempo até a segunda dose, ocorrência de casos graves e prevenção de óbitos.
O segundo estudo vai monitorar a circulação de variantes da Covid-19 entre os moradores, a ocorrência de casos entre pessoas vacinadas, possíveis efeitos adversos da vacina e o nível de proteção de crianças e adolescentes não vacinados.
"Este é um projeto único do ponto de vista do entendimento da efetividade das estratégias de vacinação em territórios urbanos e periféricos. Ela combina múltiplos desenhos de estudo e inova na forma como a pesquisa é feita, uma vez que temos a participação direta da população e das organizações locais na formulação e na execução do projeto", esclarece o infectologista da Fiocruz Fernando Bozza, coordenador da pesquisa.
Na abertura da campanha, Bozza celebrou o sucesso do projeto até aqui e apresentou um cenário: "foram 37 mil pessoas vacinadas, apesar de o alvo inicial ser 34 mil. Agora a meta é vacinar os mesmos 37 mil e mais 4 mil que estão com a segunda dose atrasada". Ele ainda destacou a importância do momento da campanha. "Um bairro, uma comunidade inteiramente vacinada é a marca de um novo tempo", afirmou, e usou a imagem da Orquestra Maré do Amanhã, que tocou no início do evento, para dizer que ela nos faz imaginar um reflorescimento cultural, a partir do trabalho conjunto da saúde, ciência, e ducação, cultura e ação comunitária. Bozza ainda destacou que o povo da Maré está dando um exemplo na campanha e acrescentou: "pessoas querem vacina".
O evento se encerrou com uma apresentação do coletivo Pandeirando, ao som de atabaques e alfaias, e ao ritmo de ijexá e maracatu.