Teve início na manhã desta quinta-feira (1°/12) o 2º Seminário Dengue, Chikungunya e Zika: Desafios na Atenção à Saúde na Chikungunya. O evento, que nesta edição destaca a preocupação dos especialistas com as dimensões que a epidemia de chikungunya pode apresentar no próximo verão no Brasil, tem como objetivo discutir uma proposta para capacitação de profissionais da área de saúde na abordagem das três doenças. A mesa de abertura do encontro contou com representantes da Organização Pan-americana da Saúde (Opas), do Ministério da Saúde, do Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do estado (Consems/RJ), e da Fiocruz.
Evento reuniu especialistas da Fundação e convidados no auditório da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), em Manguinhos (RJ) (Fotos: Peter Ilicciev - CCS)“Certamente 2016 ficará como um ano importante para a Saúde Pública, pela mobilização que foi feita em torno da epidemia de zika e da situação de emergência nacional e internacional. Fizemos um seminário exatamente há um ano, quando essas questões estavam ainda emergindo. Este seminário já é um segundo momento: foi feita uma convocação muito intensa do pessoal que trabalha na rede de saúde do Rio de Janeiro, principalmente do município, para nos organizarmos de tal forma que pudesse haver uma atualização da temática, principalmente no que se refere ao manejo clínico dessas arboviroses”, afirmou o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz Valcler Rangel. “A OMS [Organização Mundial da Saúde] já tomou uma decisão acerca do encerramento da emergência internacional, mas isso não significa que essas questões saiam do cenário brasileiro; pelo contrário, essas questões são aprofundadas e tornam-se importantes para serem trabalhadas no campo da pesquisa, da qualificação, da mobilização social. Sem todos esses elementos a gente não consegue fazer esse enfrentamento”, destacou.
Prefeito de Piraí e secretário-geral da Associação de Municípios do Estado do Rio de Janeiro, Luís Neves chamou atenção para a crise política que pode afetar de forma intensa a área da saúde no Rio. “Gostaria de parabenizar a Fiocruz por mais esse encontro tão importante para todos nós. Particularmente, estou muito preocupado, mais do que nós sempre estamos, face ao quadro econômico gravíssimo que estamos enfrentando no país, em uma crise política que continua se aprofundando e tem repercussões muito graves”, apontou. “Essa crise afeta o Rio de Janeiro e está afetando profundamente os municípios em um ano de encerramento de mandatos, de trocas de muitas equipes que vão comandar a área da saúde e vão lidar com outras áreas de governo que são essenciais para o enfrentamento deste tipo de epidemia, que mais uma vez está aí colocada para todos nós, em um verão que promete ser chuvoso.”
A presidente do Consems/RJ Tereza Cristina Fernandes também chamou atenção para as dificuldades que a crise no estado traz para o enfrentamento da tríplice epidemia. “Teremos um ano de 2017 muito difícil. A situação que enfrentamos hoje financeiramente é muito complicada; se nós tivemos problemas em 2016 com as epidemias, nós vamos ter muito mais em 2017”, disse. “O cenário é grave e precisamos estar bem estruturados nos municípios, com todas os pactos e fluxos regionais também bem organizados, para que nós não tenhamos perdas ou sequelas maiores”.
Tereza Cristina Fernandes chamou a atenção para o impacto da crise financeira sobre a Saúde Pública em 2017Para o secretário de Saúde do estado do Rio de Janeiro Luiz Antônio Teixeira, o momento é de união e enfrentamento. “Nós da Saúde temos a oportunidade de darmos uma prova de que a união e a nossa capacidade de entendimento e de mobilização podem gerar algo de diferente no nosso estado, no nosso país”, afirmou. “Apesar da mudança dos governantes, a população será a mesma que vem enfrentando há anos diversas epidemias de dengue, zika e, agora, chikungunya. Essa população precisa ser alertada da capacidade dela de modificar essa situação. Esse seminário é muito importante e bem estruturado porque aborda não só as terapêuticas, mas o controle do vetor. Só vamos resolver essa situação, principalmente nesse momento em que não existe recurso financeiro, com uma das medidas mais baratas que pode existir: a mobilização e o combate ao vetor”.
Gerente da área de Vigilância, Controle e Prevenção de Doenças da Opas, Marcos Espinal abordou a relevância do Brasil no enfrentamento de epidemias como a zika e, agora, a chikungunya. Para ele, o conceito de parceria é muito importante. “Para os vizinhos, o papel do Brasil é muito importante, por ser uma potência em questões técnicas”, ponderou. “Precisamos estabelecer que o compromisso político com a saúde continua, com a investigação e a inovação. A zika e a chikungunya não se acabam amanhã, temos muito o que fazer ainda”, complementou. Logo em seguida, a representante do Programa Nacional de Controle da Dengue do MS Lívia Frutuoso falou brevemente sobre a apresentação que realiza em uma das mesas do evento. “Estive na Fiocruz em agosto em um seminário um pouco menor e naquele momento já estávamos discutindo os dados do Rio de Janeiro sobre a epidemia de chikungunya. Irei apresentar um pouco da situação do Brasil, como está o comportamento da chikungunya, da zika e da dengue no território nacional”, comentou.
Presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha destacou o papel do Sistema Único de Saúde no enfrentamento da tríplica epidemiaAo encerrar a mesa, o presidente da Fiocruz Paulo Gadelha falou sobre a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) para o enfrentamento da tríplice epidemia. “No Brasil, ao longo de décadas, nós construímos uma base científica e tecnológica sólida, a partir de programas de formação de cientistas, que nos coloca hoje em condição de termos esse sistema de investigadores que formam o campo da Saúde Pública”, explicou. Essa formação de cientistas, segundo Gadelha, associa-se à história de construção do SUS. “O SUS é algo que nesse momento revela todo seu potencial e diferença na capacidade de enfrentamento de uma emergência desse porte. A integração dos pesquisadores com aqueles que atuam na ponta da assistência que foi trazida por um sistema público e universal em saúde que é fundamental para nossa capacidade de resposta. O patrimônio SUS é algo que deve ser muito valorizado; é um dos sistemas mais significativos que esse país já criou em termos de inclusão social, de reforma de Estado; é, portanto, nossa responsabilidade mantê-lo e aprimorá-lo”.
Atuação da Fiocruz na tríplice epidemia
Atualização das iniciativas Fiocruz em relação à tríplice epidemia foi o tema da primeira apresentação do seminário, que ocorreu logo após a mesa de abertura do evento. O vice-presidente de Pesquisa e Laboratórios de Referência da Fiocruz Rodrigo Stabeli fez um breve histórico do surgimento do vírus zika no mundo, com destaque para a entrada do mesmo nas Américas e no Brasil. Para ele, o decreto de emergência nacional de 11 de novembro de 2015 do Ministério da Saúde brasileiro indicou a gravidade do problema e mudou a forma como os profissionais de saúde no país encaram e enfrentam a tríplice epidemia.
Rodrigo Stabeli afirmou que a Fiocruz pode entregar até 40 milhões de kits sorológicos para 2017Nesse processo, a Fiocruz teria sido uma das instituições de destaque, apresentando estudos, ações e serviços diferenciados. Stabeli apontou como alguns exemplos a constatação da presença do vírus zika ativo (com potencial de provocar a infecção) em amostras de saliva e de urina, o kit de diagnóstico simultâneo de zika, dengue e chikungunya, a confirmação que o zika atinge placenta em qualquer fase da gestação, e o uso da bactéria Wolbachia como uma alternativa natural, segura e autossustentável para o controle do vetor.
Dentre os diversos novos projetos em andamento, Stabeli destacou o kit sorológico que está sendo produzido pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz). “Temos a possibilidade de entrega de 40 milhões de kits sorológicos para 2017. O kit é importantíssimo para sabermos o histórico e o comportamento epidemiológico da doença”, comentou. “Estamos trabalhando também em uma vacina candidata a partir de proteínas heterólogas e vírus inativados. As ações de Bio-Manguinhos projetam que em março já começa a fase pré-clínica de uma vacina potencial”.
O vice-presidente também falou sobre avanços importantes em estudos que estão sendo realizados no Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz). “O manejo clínico de gestante e de neonatos com má formação é importante e deve ser privilegiado pela Saúde. Ainda não temos um manejo clínico adequado para essa nova geração de microcéfalos que nasceu no país e estamos chamando atenção para que o enriquecimento da estimulação dessas crianças aconteça no SUS”, afirmou.