11/08/2020
Um hotel na China destinado a abrigar indivíduos com infecção por Sars-CoV-2 utiliza robôs para entrega de alimentos. O hospital do futuro, na Romênia, tem empregado robôs em distintas tarefas, podendo-se mencionar a desinfecção dos ambientes com a utilização de raios ultravioleta, a comunicação com os pacientes para o fornecimento de informações relevantes sobre o quadro clínico e a distribuição de alimentos. Nos dois últimos casos, foram utilizados artefatos com formato humanoide. O robô enfermeiro Tommy, em um hospital localizado na Lombardia, Itália, permitiu a verificação de sinais vitais e a comunicação entre enfermo e equipe de saúde, através do envio de mensagens.
No Brasil, modelos de robôs baseados em Inteligência Artificial (IA), embarcados em dispositivos de fácil acesso, como um tablet, já estão em uso, para facilitar o contato remoto da equipe de saúde com o paciente. Um exemplo é o robô de telepresença utilizado no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, que evitou a alta exposição dos profissionais ao contato com os enfermos infectados, durante o processo de cuidado à saúde. A equipe do hospital destacou que a maior disponibilidade de tais equipamentos facilitaria, igualmente, o contato entre familiares e doentes.
Estes são alguns dos casos mencionados no ensaio “O uso de robôs e a pandemia de Covid-19: questões bioéticas”, publicado pelo Grupo de Trabalho (GT) de Bioética do Observatório Covid-19, do qual faz parte a Fiocruz, entre outras instituições. O objetivo do ensaio é discutir os eventuais usos dos robôs para o desenvolvimento das ações de cuidado e para a implementação de medidas de controle da Covid-19. Os autores consideram que, apesar da finalidade nobre, as questões bioéticas que permeiam o uso desses aparatos, caracterizados – de maneira geral – como “sistemas eletromecânicos capazes de exercer funções autônomas, semiautônomas ou remotamente controladas”, são inevitáveis e também merecem atenção.
No rol de agentes robóticos que têm sido desenvolvidos, incluem-se aqueles dotados de Inteligência Artificial (IA), a qual “está relacionada à tomada de decisão dos agentes sem a intervenção de um humano, conferindo-lhes a ideia de uma inteligência”. Segundo eles, o afastamento social tem trazido novas possibilidades de interação, mediadas pela tecnologia. Os autores fazem questão de destacar, no entanto, que os robôs ou as IA não são plenamente autônomas. “Comumente, em função das tarefas, aplicações e confiabilidade adquirida, o grau de autonomia para decisão e atuação é reduzido ou elevado”, esclarece o texto.
O ensaio também lembra que o uso de robôs na área da saúde não é uma novidade trazida pela pandemia de Covid-19. O emprego de sistemas robóticos para o transporte de medicamentos, refeições e outros utensílios e equipamentos de uso hospitalar; a preparação de medicamentos de uso enteral e parenteral e apoio a procedimentos cirúrgicos, realizados com a presença do cirurgião ou à distância), entre outros, já eram conhecidos e vinham se disseminando na prática médica antes da pandemia, de acordo com os autores.
O texto levanta questões de bioética suscitadas pelos usos de robôs para o enfrentamento da pandemia de Covid-19, e aborda problemas relativos à responsabilidade profissional, à obsolescência dos trabalhadores, concernentes à iniquidade do acesso à tecnologia e relacionados às capturas de poder no âmbito das sociedades de controle, incluindo a segurança e privacidade dos dados.
Para os autores, as questões concernentes à responsabilidade – não são diferentes, em linhas gerais, das situações de cuidado à saúde nas quais não se utilizam robôs. O contexto se complexifica ao se considerar os elementos relativos à telemedicina em interseção com o binômio bioética / robótica. “De fato, o profissional que está por trás da interface paciente-máquina deve ser considerado o responsável pela participação robótica nas distintas ações”, afirmam os autores.
Para eles, o distanciamento social tenderá a se tornar “um costume, um novo tipo de protocolo social”. Assim, “se todos os sistemas robóticos dotados de algum grau de IA passarem a ser considerados muito úteis para o bem-estar comum, acabarão por gozar de maior confiança do público”, consideram.
Leia a íntegra do ensaio.