13/10/2020
As notificações da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) em Pernambuco foram objeto de um estudo da Fiocruz PE, na busca de compreender o cenário das formas graves de Covid-19. Recém publicados na Revista Ciência e Saúde Coletiva, os resultados mostram que houve um aumento de 13 vezes nas ocorrências de SRAG no 1º semestre de 2020 - que inclui o início da pandemia no estado - na comparação com os primeiros seis meses dos anos de 2015 a 2019. A média mensal de casos, que era de 187 no intervalo observado nos cinco anos anteriores, passou para 2.517 este ano, sob o impacto da chegada da Covid-19.
No total, foram 15.100 ocorrências de SRAG, de janeiro a junho de 2020, em sua maioria provocadas pelo novo coronavírus (66%), seguidas pelas não especificadas (31,2%) e pelas causadas por influenza ou outros vírus respiratórios (2,5%). Um número bem superior aos 5.617 casos registrados no período pré-pandêmico, dos quais 11,5% foram causados por influenza e outros vírus respiratórios e 88,2% ficaram como não especificados.
Além de revelarem o crescimento no número de casos, os dados sinalizam uma melhoria na testagem. “Esse volume de notificações sugere que - mesmo passível de subnotificações - o sistema de vigilância da SRAG em Pernambuco é sensível a alterações da ocorrência da doença, tendo o potencial para captar epidemias e mudanças no perfil dos casos”, explica a docente colaboradora da Fiocruz Pernambuco e autora do estudo, Amanda Cabral.
A vigilância dessa síndrome foi implantada em 2009, em decorrência da pandemia de influenza H1N1. O diagnóstico da SRAG, por definição, envolve pessoas hospitalizadas com síndrome gripal (febre e tosse ou dor de garganta) e que apresentaram dispneia (falta de ar) ou saturação de oxigênio menor que 95% ou desconforto respiratório. Sintomas que, a partir deste ano, ficaram associados também a pacientes com a Covid-19. A investigação desses dados utilizou plataformas públicas abertas, que estão disponíveis para o acompanhamento dos gestores da saúde, como o Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan Influenza Web) e plataforma Sivep-Gripe. Ao processar as informações, a sanitarista associou técnicas de análise espacial, com o objetivo de conhecer o panorama das formas graves da Covid-19 e contribuir para o planejamento de ações de enfrentamento à pandemia. O trabalho, desenvolvido com a colaboração da pós-doutoranda Lívia Maia, foi orientado pelo pesquisador da Fiocruz Pernambuco Wayner Vieira.
Risco aumentado
A pesquisa apontou para o excesso de risco de ocorrência de SRAG no estado. Em todas as macrorregiões foram detectadas Regionais de Saúde (Geres) com risco superior em dez vezes a média esperada. Na VI e IX Regionais, que têm como sedes os municípios de Arcoverde e Ouricuri, respectivamente, foi encontrado um risco 20 vezes aumentado de SRAG. “O maior excesso de risco está associado a município com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que tem no seu território rodovia federal, a exemplo da BR 232, ou que é sede de Geres”, esclarece Amanda. Isso acende o alerta para o impacto em localidades com menor disponibilidade de serviços de saúde para dar conta desse aumento na procura.
Outro achado do estudo foi a mudança do perfil dos pacientes. Se antes da Covid-19, eram em sua maioria (78,6%) crianças menores de 10 anos, na pandemia, os adultos a partir dos 40 anos passaram a concentrar 76,8% dos casos. Ao se focar apenas nas pessoas com 60 anos ou mais (48,3% dos casos), percebe-se um grande aumento nas ocorrências de SRAG, de 16 vezes em relação aos anos anteriores. Diante deste cenário, os pesquisadores consideram a proteção aos idosos como estratégia prioritária, tendo em vista que eles constituem grupo com maior risco de complicações e de morte pela Covid-19. Mas alertam que, mesmo na faixa mais jovem (de 10 a 39 anos) houve um significativo aumento, de cinco vezes no número de casos de SRAG, correspondendo a 15,6% do total.
O dado é preocupante quando se verifica que o mundo assiste, em países do continente europeu, à segunda onda da epidemia de Covid-19, a qual está acometendo sobretudo os jovens. E que esse deslocamento da faixa etária tem sido atribuído, principalmente, ao relaxamento das medidas de distanciamento físico.
Em Pernambuco, a flexibilização para as atividades econômicas e sociais tem avançado. Por outro lado, há cerca de 3 semanas, ainda persiste, em média, o registro de um óbito por Covid-19 por hora no estado. “Nessa condição, torna-se fundamental reforçar a adoção das medidas de proteção individual por parte da população, a exemplo do uso de máscaras e álcool em gel, além da frequente lavagem de mãos. Para os órgãos governamentais, além de redobrar a vigilância, cabe oferecer condições que protejam aquelas populações de maior vulnerabilidade”, ressalta a docente.
Veja mais detalhes da pesquisa no artigo Síndrome Respiratória Aguda Grave em Pernambuco: comparativo dos padrões antes e durante a pandemia de Covid-19, publicado na Revista Ciência e Saúde Coletiva.