Na semana em que se completam cinco anos da morte de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, assassinados a tiros no Rio de Janeiro, em 14 de março de 2018, a luta, a memória e a "cidadania insurgente" da vereadora foram lembradas durante o evento MARIELLE VIVE! Favelas na Reconstrução do País. Promovido pelo Dicionário de Favelas Marielle Franco, o encontro foi realizado na Biblioteca de Manguinhos do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict/Fiocruz), nesta segunda-feira (13/3), e contou com exposição fotográfica, mesas de discussões, performance cultural, além de apresentação de vídeos de familiares, amigos e admiradores, que falaram sobre o legado de Marielle. O evento teve transmissão simultânea no canal da VideoSaúde Distribuidora no YouTube.
A mesa de abertura foi composta por Sônia Fleury, coordenadora geral do Dicionário de Favelas e pesquisadora do Centro de Estudos Estratégicos (CEE/Fiocruz); Rodrigo Murtinho, diretor do Icict/Fiocruz; Cristiani Machado, vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz; Cláudia Rose Ribeiro da Silva, membro do Conselho Editorial do Dicionário de Favelas, integrante do Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré e coordenadora do Museu da Maré; e Richarlls Martins, coordenador executivo do Plano Fiocruz de Enfrentamento à Covid-19 nas Favelas do Rio de Janeiro. Todos destacaram a importância de Marielle e do povo das favelas para um novo momento da democracia no país. "Nós não queremos que a reconstrução signifique uma volta ao passado. Nós queremos que essa reconstrução seja um novo momento. E a Marielle é a representação icônica - e também com sua luta - dessa nova política. Uma política que os jovens se identificam e que está próxima às bases da sociedade, que não abaixa a cabeça para os poderosos (...). Nós queremos simbolizar a Marielle e esse evento como uma 'cidadania insurgente'. É isso que nós vemos hoje em todas as favelas: grupos de jovens, coletivos de mães, grupos que se organizaram durante a pandemia e que disputam, colocam e tensionam o conflito da questão do poder de um outro lugar. A insurgência fez parte da luta da marielle e faz parte do nosso dicionário", enfatizou Sônia Fleury.
Já o diretor do Icict/Fiocruz enalteceu o importante elo institucional entre o Dicionário de Favelas e a unidade. "O Icict tem na sua missão a defesa dos direitos humanos, a defesa da diversidade e o combate às desigualdades. Então, o dicionário é um projeto que, quando veio para a Fiocruz e, especialmente, para o Icict, foi um presente para nós. Ele está totalmente alinhado com a nossa missão e com as nossas prioridades", afirmou Rodrigo Murtinho.
A vice-presidente Cristiani Machado ressaltou o quanto o dicionário revela a potência das favelas. Para ela, o projeto não apenas homenageia Marielle, o que é muito importante, mas também exalta as trajetórias, a memória, a cultura e a força do povo que vive nesses territórios. "Para nós, é uma honra abrigar esse projeto [do Dicionário de Favelas], que é mais uma iniciativa que é articulada com a sociedade civil. Temos certeza que isso é fundamental para a implementação de políticas públicas que sejam mais próximas às necessidades dos nosso povo", disse Machado.
Marielle: vítima de feminicídio político
A mesa seguinte foi intitulada Da Favela ao Parlamento – Reconstruindo o Brasil. A deputada estadual Renata Souza (Psol/RJ), a ex-deputada estadual Mônica Francisco (Psol/RJ), a vereadora Mônica Cunha (Psol/RJ), e Saulo Benicio, presidente do Psol Nilópolis (RJ), compuseram a mesa e falaram sobre o legado e a importância de Marielle Franco e sua influência na ocupação de espaços dentro da política institucional. Souza, que está em seu segundo mandato na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), reforçou que Marielle foi vítima de “feminicídio político", termo cunhado por ela para destacar a violência política de gênero.
"A Marielle foi assassinada, mas a Marielle vive! Ela vive em nós, ela vive em quem vai vir. Ela existiu, então a gente não pode deixar esquecer", exaltou Monica Cunha, ao falar sobre a morte da vereadora e seu legado. Passados cinco anos do assassinato ainda sem respostas, Monica Francisco ressaltou: "Não tenho dúvidas de que a reconstrução do Brasil passa pela mãos de mulheres negras", afirmou. Saulo Benicio destacou o amplo caráter coletivo da vida pública de Marielle, uma inspiração para jovens políticos como ele. "Marielle falava 'eu sou porque nós somos' porque ela sabia que, se não fosse um trabalho coletivo, ela não estaria ali. Ela estava no Parlamento para ecoar as vozes da classe trabalhadora", elogiou.
Após as mesas, o público se reuniu no hall da Biblioteca de Manguinhos para a inauguração oficial da exposição fotográfica Outras Marés, que permanecerá aberta ao público até 12 de abril. O jornalista Dante Gastaldoni, curador da exposição, apresentou integrantes do Coletivo Fotografia Periferia e Memória e também exaltou a importância da data e do legado de Marielle. O evento foi encerrado com uma performance cultural da artista e ativista Rachel Barros, doutora em Sociologia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), cantora e compositora do grupo Som de Preta.
Dicionário de Favelas
O Dicionário de Favelas Marielle Franco tem se dedicado, desde o seu lançamento, em 2019, a impulsionar ações de preservação de memórias em favelas e periferias do Brasil, como parte do nosso compromisso com a expansão da cidadania e do direito à cidade. Sediado no Icict/Fiocruz, o projeto baseia-se na criação coletiva de um espaço virtual capaz de reunir e divulgar os conhecimentos sobre estes territórios de forma interdisciplinar, interinstitucional e plural. Já são mais de 600 colaboradores cadastrados e 1.500 verbetes compartilhados na plataforma, abarcando os mais variados temas, como: cultura, sociabilidade, segurança, saúde, habitação, mídia, comunicação, juventude, relações étnico-raciais, violência, entre outros, além de uma área especial para acompanhamento dos efeitos da pandemia do novo coronavírus nas favelas e periferias do Brasil.