Uma armadilha prática e econômica, chamada BR-OVT, destinada à captura de ovos da muriçoca (Culex quiquefasciatus), foi desenvolvida, avaliada e patenteada pelo Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM), unidade da Fiocruz em Pernambuco. Os primeiros testes de campo com o equipamento demonstraram bons resultados na retirada, do meio ambiente, de conjuntos de ovos (chamados de jangadas, por seu aspecto) depositados pela muriçoca em locais com água empossada. Foram coletados, no bairro da Mustardinha, na Zona Oeste do Recife, mais de seis milhões de ovos do mosquito transmissor da filariose, doença endêmica na região metropolitana da capital pernambucana.
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Técnicos manuseiam a armadilha, que simula um criadouro natural (Foto: Bruna Cruz) |
A experiência com a nova armadilha foi realizada de janeiro a dezembro de 2006 em 146 residências. A Mustardinha foi escolhida porque, segundo dados da Secretaria de Saúde do Recife, tem uma alta densidade do mosquito. Na metodologia utilizada pela equipe responsável pela patente foram colocadas de 129 a 148 armadilhas em campo. A coleta dos ovos com o equipamento foi feita a cada três dias, obtendo, nesse período, uma média de 43.151 jangadas - cada jangada tem, em média, de 150 a 280 ovos. Um teste piloto, feito de agosto a novembro de 2003 e de junho a setembro de 2004, no bairro do Caçote, também Zona Oeste do Recife, já havia retirado mais de 719 mil ovos do ambiente.
A armadilha de oviposição BR-OVT consiste numa uma caixa preta, que simula um criadouro natural e protege o mosquito do vento e da luz. No interior encontra-se um recipiente, também preto, com água, biolarvicidas e atraentes que ajudam a “chamar” as fêmeas grávidas da muriçoca. Diferentemente da maioria das armadilhas usadas para captura do Culex em todo o mundo, a BR-OVT não exige o uso de energia elétrica, tornando-se, assim, mais econômica e, portanto, com mais chances de adoção por parte da população e do poder público. Além desse diferencial, a armadilha é de fácil construção e manejo.
Variações
A armadilha também se revelou sensível para indicar variações na densidade do mosquito, mostrando que, mesmo após o período das chuvas (de março a junho), o número de jangadas coletadas por armadilha na Mustardinha, por dia, manteve-se alto. Em 2006, maio foi o mês com maior índice pluviométrico (333,01 mm) e a densidade registrada do mosquito foi de 4.043 jangadas.
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A armadilha ajudou a coletar mais de seis milhões de ovos do mosquito |
Já nos meses de agosto e outubro, mesmo com menor índice pluviométrico (171,2 mm e 25,7 mm, respectivamente) foram contabilizados os maiores picos da presença do mosquito (5.858 e 5.894 jangadas coletadas, respectivamente). Essas informações podem orientar as ações de controle ambiental, o que, conseqüentemente, implica a eficiência do controle da filariose. No futuro, os dados também podem ajudar a avaliar o impacto das armadilhas sobre a população do mosquito.
Segundo uma das inventoras da armadilha, a bióloga Rosângela Barbosa, estes picos na densidade são atribuídos à existência de um grande número de alagados e fossas nos bairros citados. Ela realizou os testes em campo e em laboratório como parte do trabalho de conclusão do doutorado em saúde pública do CPqAM intitulado Aperfeiçoamento e avaliação da armadilha de oviposição BR-OVT para Culex quinquefasciatus. O trabalho foi orientado pela pesquisadora do Departamento de Entomologia do CPqAM Lêda Regis, também responsável pela criação do equipamento, junto com o professor Antônio Souto, do Departamento de Zoologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
A armadilha desenvolvida pelo CPqAM está sendo utilizada, desde 2005, pelo Programa de Saúde Ambiental (PSA) da Prefeitura do Recife como instrumento de coleta de jangadas. Os grupos de ovos coletados são utilizados em testes de susceptibilidade ao biolarvicida Bacillus sphaericus (Bs), substância utilizada pela prefeitura para combater o desenvolvimento de larvas do mosquito. No total, dez armadilhas foram instaladas no bairro de Água Fria, na Zona Norte. As coletas ocorrem a cada seis meses. Os equipamentos permanecem nas residências durante uma semana. Neste período, todos os dias são feitas coletas das jangadas até que se alcance o número de 100 jangadas. O material é encaminhado ao Serviço de Referência em Controle de Culicídeos Vetores do CPqAM, onde são feitos bioensaios para verificar a eficácia do larvicida contra o mosquito.
Antes do uso da BR-OTV, os técnicos da prefeitura precisavam coletar as jangadas do mosquito manualmente. Como o acesso manual aos criadouros é mais difícil, o número de jangadas coletadas era bem menor.