Fioflix Resenha: Sala Lilás

Publicado em
Madu Negreiros (estágio supervisionado na VideoSaúde Fiocruz)
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Entre os 500 filmes disponíveis na Plataforma de Filmes em Acesso Aberto da Fiocruz, a Fioflix, é possível encontrar incontáveis histórias potentes do universo da saúde pública. O curta-metragem documental Sala Lilás: Atendimento Humanizado no Combate às Violências é uma das obras que compõem este rico catálogo. Dirigido exclusivamente por mulheres - Hanna Carneiro, Irlaine Arruda, Juliana Pereira - o documentário explora um serviço do Sistema Único de Saúde (SUS), localizado em Mangaratiba (Costa Verde do Rio de Janeiro) no Hospital Municipal Victor de Souza Breves. Trata-se da Sala Lilás, um ambiente que propicia atendimento especializado e humanizado às vítimas de violência, principalmente mulheres. Mas, para além das definições de dicionário, o filme traz uma indagação: o que faz de alguém uma vítima? 

Mais do que um filme informativo, Sala Lilás é um filme empoderador. O documentário aborda a violência doméstica no contexto da saúde pública, mais especificamente, na iniciativa da Sala Lilás. Logo em seu princípio, a obra contextualiza a si mesma com um dado relevante: uma em cada três mulheres é submetida à violência física e/ou sexual por parte de seu parceiro ou de terceiros. Somos enganados ao sermos introduzidos a uma música de um tom grave e sério, nos preparando para uma narrativa de tragédias. Sóbria e angustiante. Uma jornada em preto e branco. Ao invés disso, embarcamos em um percurso em tons de lilás. Mesmo que bombardeado por poderosos dados e uma trilha sonora dramática, o fundo da imagem abre mão do vazio para colorir a tela com silhuetas de mulheres, as verdadeiras protagonistas dessa história. Por mais que sejam vítimas, não é dessa forma que elas são retratadas aqui, mas sim como um símbolo de força e resiliência.

Um plano detalhe de mãos esmaltadas em vermelho nos convida a ouvir a voz que por muitas vezes foi calada: a das mulheres. “A violência psicológica machuca, ela é como se fosse uma faquinha entrando todos os dias em você”. É a partir dessa frase que somos levados a uma tela preta e ao completo silêncio. O som do mar - forte e determinado - quebra o silêncio assim como as suas ondas quebram contra as areias de uma praia arroxeada, que nos liberta da tela preta que havia se instaurado anteriormente. Por um momento, vemos apenas isso: o mar lavando as areias daquela praia lavanda. Quando as águas recuam, abre-se espaço para que o tão esperado título nos contemple: Sala Lilás, Atendimento Humanizado no Combate às Violências.

Para além de falas informativas, o filme utiliza esses elementos estéticos para contar uma história e passar uma mensagem. Ao invés de simples cortes secos, a transição entre os planos é, por muitas vezes, feita por pequenas animações coloridas e vibrantes. A trilha sonora, antes sombria, agora é doce e sutil. É dessa forma que podemos entender o que é a Sala Lilás: um espaço em ambiente hospitalar, voltado ao acolhimento e atendimento diferenciado para pessoas em situação de violência, principalmente mulheres. É através dessa narrativa que também se fala do BAM (boletim de atendimento médico), dos diferentes tipos de violência doméstica e dos procedimentos que se seguem para que a segurança da vítima seja efetiva. 

Não apenas informações diretas nos são compartilhadas, como também relatos das vítimas que narram a sua própria história. Um plano em preto e branco enquadra uma moça a partir do seu nariz até o seu busto. Não vemos os seus olhos, assim como as estatísticas não vêem a sua identidade. Ela nos fala sobre como abriu o seu boletim de ocorrência e, ao mencionar a equipe que a fez sentir acolhida e protegida, seu sorriso ganha cor assim como a sua imagem. Seus cabelos, antes escuros e cinzas, agora assumem um tom de rosa forte e intenso. É nesta mesma dinâmica que uma outra sobrevivente relata a sua história. Um rosto enquadrado da boca para baixo, em preto e branco, abre espaço para para lábios tingidos do tão poderoso batom vermelho. É através dessa narrativa que as mulheres ganham cor e identidade. Elas não são apenas vítimas, mas sim protagonistas.

Esse documentário não desempenha unicamente o papel informativo comumente relacionado ao gênero documental. Ele também é um registro e um relato poderoso da força de mulheres que sobrevivem à violência. “Eu sofria muito calada. Hoje não. Hoje eu estou empoderada.” Uma jornada que poderia ser pesada e difícil se demonstra colorida, vibrante e, principalmente, lilás. Para assistir Sala Lilás e outros 500 filmes sobre saúde, ciência e tecnologia, acesse a plataforma Fioflix: VídeoSaúde