Líder técnica da OMS visita Fiocruz para discutir projetos

Publicado em - Atualizado em
Ciro Oiticica (Agência Fiocruz de Notícias)
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A Fiocruz recebeu, na última sexta-feira (10/2), a líder técnica da Organização Mundial da Saúde (OMS) para Covid-19, Maria Van Kerkhove, para a discussão de projetos nas áreas da vigilância epidemiológica e da modelagem computacional para a análise de cenários. Pesquisadores da Fundação apresentaram seus projetos, que poderão auxiliar na antecipação de novas emergências sanitárias. O vice-presidente de Pesquisas e Coleções Biológicas da Fiocruz, Rodrigo Correia, mediou as conversas na parte da manhã e deu as boas-vindas a todos em nome do presidente interino Mario Moreira. “Estamos muito felizes de receber todos vocês para esse trabalho de extrema importância para a preparação para emergências sanitárias por vir”, disse. 

Pesquisadores da Fiocruz receberam, na última sexta-feira (10/2), a líder técnica da OMS para Covid-19, Maria Van Kerkhove (foto: Ciro Oiticica)

 

A líder técnica Maria Van Kerkhove agradeceu as boas-vindas e afirmou que aprecia muito vir à Fiocruz e aprender com a experiência da Fundação. “É muito bom poder saber o que vocês fizeram antes e durante a pandemia”, comentou, “é uma base para ver o que faremos pela frente”. Ela lembrou uma visita anterior, durante a emergência de zika, e valorizou o acúmulo dessa cooperação. “O que vocês fizeram diante da zika foi uma preparação para enfrentar a Covid”, garantiu. “O que estamos fazendo agora nos servirá para futuras emergências que ainda desconhecemos”. 

Também participou da reunião a representante da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas/OMS) no Brasil, Socorro Gross, com a perspectiva de parcerias em vigilância epidemiológica na região das Américas. “É uma honra estar com vocês, nesta instituição que sempre nos apoia”. A representante da Opas enalteceu o trabalho conjunto com a Fiocruz e o Brasil. “Trata-se de uma cooperação diferente porque é horizontal, desenvolve capacidades. Nós nos engajamos nessa cooperação porque ela pode desenvolver nossas comunidades”, explicou. Participaram ainda representantes do Ministério da Saúde (MS) e da Secretaria Municipal de Saúde. 

Projetos apresentados 

O Observatório de Clima e Saúde foi um dos projetos apresentados. Christovam Barcellos, do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), explicou que a pesquisa visa reunir dados e ferramentas para a análise de eventos climáticos extremos e sua relação com surtos. A coleta de dados, que começou em 2009, vem permitindo a construção de uma base para a investigação e para políticas públicas de adaptação às mudanças climáticas no Brasil. “Fatores climáticos afetam de forma diferente a distribuição da doença”, reflete Barcellos. “Várias doenças são chamadas de sensíveis às mudanças climáticas, como a esquistossomose e a leptospirose”. Um dos objetivos do Observatório é subsidiar decisões locais, principalmente a partir do Sistema Único de Saúde (SUS).

Dois sistemas de vigilância foram apresentados em seguida: o InfoDengue, para o acompanhamento de arboviroses, e o InfoGripe, para doenças respiratórias. O pesquisador Marcelo Gomes, do Programa de Computação Científica (ProCC) da Fiocruz, coordena o InfoGripe e apresentou os projetos, na presença da pesquisadora do mesmo programa e coordenadora do InfoDengue, Cláudia Codeço. “O principal foco do trabalho é dividido em dois grupos: vigilância e modelo”, explicou Gomes. A vigilância, segundo ele, permitiria o acompanhamento de infecções respiratórias severas e de arborviroses, definindo um retrato do momento. A modelagem, por sua vez, se referia à produção de estatísticas e à modelização computadorizada. “O que precisamos não é só o que está acontecendo agora, mas também o que aconteceu no passado”, explica Gomes. Isso permitiria traçar um perfil do atraso entre o evento e sua observação. “O próximo passo é a capacidade de estimar o que irá acontecer”. 

A última apresentação da manhã abordou o Sistema de Informação em Saúde Silvestre (Siss-Geo), a plataforma de vigilância participativa de emergências de zoonoses coordenada pela pesquisadora Márcia Chame, da Plataforma Institucional Biodiversidade e Saúde Silvestre (Pibss/Fiocruz). “Esse sistema é um modelo para estimar a favorabilidade de emergência de zoonoses”, apresentou Chame, que expôs a dinâmica da plataforma, que conta com um aplicativo para celular. “Qualquer pessoa no celular ou na web pode registrar um animal vivo, morto ou doente. Isso gera pontos no mapa, por georreferenciamento a partir de satélites. Observadas anormalidades, o sistema gera alertas, distribuídos em tempo real para gestores que levam sua equipe em campo para fazer coleta do animal e a de amostras biológicas que são levadas ao laboratório”. O mote de estudo é a febre amarela, mas o projeto também aborda outras zoonoses. 

O último projeto, apresentado no período da tarde, é parte dos trabalhos do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia). Trata-se do Sistema de Alerta Precoce para Surtos com Potencial Epi-Pandêmico (Aesop). Pesquisador do Instituto Gonçalo Moniz (Fiocruz Bahia), Manoel Barral-Neto coordena o projeto, apresentado na ocasião pelo pesquisador da mesma unidade, Pablo Ramos. “Este sistema de vigilância explora diferentes tipos de dados, técnicas de inteligência artificial e machine learning, para identificar áreas com início de surto infeccioso com potencial de espalhamento”, detalhou Ramos. “São reunidos dados da Atenção Primária, além daqueles relacionados às manifestações da doença, como venda de medicamentos e rumores nas redes sociais. O foco atual é calibrar métodos para assinalar detecções, engajando tomadores de decisão para o acesso aos dados rotineiros.”

Variáveis sociais e cooperação regional

Ao fim do encontro, abriu-se um debate para um balanço e possíveis desdobramentos, mediado pelo assessor da presidência, Valber Frutuoso. A líder técnica da OMS, Maria Van Kherkhove, elogiou a qualidade das apresentações. “É fantástico continuar aprendendo com a Fiocruz e se manter conectada”. Ela apontou alguns dos objetivos contemplados com a visita. “Procurei saber como o país lidou com a Covid, como foram aplicadas as vacinas, como sistemas foram adaptados para responder e como está a preparação para novas emergências, em termos de vigilância e atenção primária”, enumerou. 

A líder técnica ressaltou que o modo como se dão respostas tem sido mais importante do que saber o que precisa ser feito, o que a levou a destacar a importância de aspectos sociais. “É preciso pensar em diferentes tipos de dados para integrar, trazer a Ciência Política, aspectos comportamentais, o papel da desinformação, a fim de modelar também a confiança e a comunicação”, pontua. “É menos sobre o que fazer, e mais sobre como fazer, como manter a capacidade de resposta, como ajustar, como modelar dinâmica da confiança e da desinformação”, disse. 

Representante da Opas no Brasil, Socorro Gross também ficou satisfeita em ver o desenvolvimento dos projetos. “Sempre que venho, acho que sei o que está sendo feito, e sempre fico positivamente surpreendida”, brincou. “Tem sempre algo que está sendo começado ou que cresceu muito”. Em seguida, disse querer olhar para a região e enfatizou a importância de se retomar a cooperação para fortalecer a resposta do continente, o que pode ser favorecido pelos projetos em curso. “Com a pandemia, ficamos dois anos separados, os países ficaram sozinhos, viraram-se para dentro, sem compartilhar experiências e respostas”, lamentou. “Essa é a oportunidade de trazer novamente os países juntos, em redes importantes, de conhecimento, pesquisa, fixação. É um aprendizado grande, é uma janela de oportunidade”. 

Valber Frutuoso, ao final, agradeceu aos presentes e apontou alguns desdobramentos, como a formulação de uma minuta com as diferentes contribuições que possam embasar futuras ações. “Vamos agora trabalhar na minuta de um documento que irá circular entre as organizações presentes para termos o conjunto da obra e traçarmos encaminhamentos. Em nome da presidência, agradeço a todos”.

Da parte da Fiocruz, além das autoridades e dos pesquisadores citados, acompanharam a reunião Pedro Burger, coordenador adjunto do Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz); Luiz Augusto Galvão, assessor sênior do Cris/Fiocruz; Tania Fonseca, da Coordenação de Vigilância em Saúde e Laboratório de Referência (CVSRL/Fiocruz); e Marilda Siqueira, chefe do Laboratório de Vírus Respiratório e Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Pela Opas/OMS, estiveram Alexander Rosewell, coordenador da Unidade Técnica de Vigilância, Preparação e Resposta às Emergências e Desastres no Brasil; Juan Cortez Escalante, oficial nacional de emergências; Rodrigo Said e Rodrigo Frutuoso, consultores nacionais para emergências; e Mábia Milhomem, consultora internacional para emergências. Gislani Aguilar, superintendente de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro; e Márcio Garcia, diretor do Departamento de Emergências em Saúde Pública do Ministério da Saúde, também acompanharam a reunião.