19/02/2024
Camila De’Carli e Cristina Azevedo (Agência Fiocruz de Notícias)
Durante a reunião da 37ª Cúpula da União Africana (UA), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, no último sábado (17/2), a ampliação da cooperação em saúde com o continente, com a criação de uma representação da Fiocruz em Adis Abeba, capital da Etiópia. Na viagem pelo país, o presidente da Fundação, Mario Moreira, acompanhou a comitiva brasileira, representando a ministra Nísia Trindade Lima, durante o encontro dos ministros da Saúde do continente africano.
A pedido da ministra da Saúde Nísia Trindade Lima, Mario Moreira participou da reunião com os ministros de Saúde do continente, coordenada pelo CDC África (foto: Divulgação)
A abertura da nova representação da Fiocruz – a segunda na África - vem a partir da experiência bem-sucedida em Moçambique, onde a Fundação vem atuando de forma estruturante para o fortalecimento do sistema público de saúde local. Em seu discurso, o presidente Lula defendeu uma cooperação voltada para a equidade em saúde. Ele destacou a importância da colaboração com o Centro Africano de Controle e Prevenção de Doenças (CDC África).
“Quero igualmente estender nossa parceria para a área da saúde. Vamos trabalhar com o Centro Africano de Controle e Prevenção de Doenças para enfrentar doenças tropicais negligenciadas. Teremos como meta a ampliação do acesso a medicamentos, evitando a repetição do ‘apartheid’ de vacinas que vimos na Covid-19”, disse Lula. “Para levar adiante todas essas iniciativas, vamos criar um posto avançado de cooperação junto à União Africana em setores como pesquisa agrícola, saúde, educação, meio ambiente e ciência e tecnologia. Nossa representação diplomática em Adis Abeba contará em breve com funcionários de órgãos governamentais como a Agência Brasileira de Cooperação, a Embrapa e a Fiocruz, nossos órgãos de pesquisa e desenvolvimento em agropecuária e saúde”, acrescentou.
A pedido da ministra Nísia, Mario Moreira participou da reunião com os ministros de Saúde do continente, coordenada pelo CDC África. O ponto forte do encontro foi a proposta de presença da instituição no continente africano, de forma articulada com os objetivos do Ministério da Saúde brasileiro e do CDC África.
“Estamos muito orgulhosos pela confiança que o governo brasileiro depositou na Fiocruz para que sejamos um ponto fundamental de cooperação com o continente africano no campo da saúde. A abertura de uma representação nossa em Adis Abeba, onde fica a sede da União Africana, reforça e aprofunda a cooperação estruturante do Brasil com a África”, disse Mario Moreira.
Na reunião dos ministros da saúde da UA, a Fiocruz foi apresentada como uma grande parceira do continente. O diretor geral do CDC África, Jean Kaseya, destacou a necessidade de fortalecer os sistemas de saúde dos países do continente, por meio, sobretudo, do aumento da produção local e da formação de quadros profissionais para a saúde pública. Kaseya observou que essa ampliação da produção deve ir desde o desenvolvimento e a realização de estudos clínicos, até os aspectos regulatórios e da produção propriamente dita. Ele se mostrou interessado ainda na transferência de tecnologia do Brasil.
O diretor geral do CDC África considerou a força de trabalho o ponto mais frágil do continente. Kaseya disse que gostaria de usufruir da capacidade Fiocruz de formação pessoal, com os programas de pós-graduação em saúde pública e em ciências biológicas, tanto recebendo alunos africanos na Fundação como na organização de programas na África – iniciativas que têm sido bem-sucedidas em Moçambique.
O desdobramento esperado da viagem é a consolidação do projeto de colaboração através de um documento firmando os compromissos a ser assinado na Assembleia Mundial da Saúde em maio deste ano, em Genebra. Moreira teve ainda uma reunião bilateral com Kaseya.
Cooperação com Moçambique
A União Africana é formada por 55 países e passou a integrar o G20 com o apoio do Brasil. Juntas estas nações reúnem 1 bilhão e 500 milhões de habitantes e enfrentam muitos desafios semelhantes ao Brasil.
A Fiocruz tem um escritório em Moçambique desde 2008, num dos mais bem-sucedidos exemplos de cooperação estruturante da Fundação no continente. E uma das áreas mais ativas de cooperação tem sido na educação, com cursos de nível técnico à pós-graduação para profissionais da saúde. Somente o Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde, fruto da cooperação entre a Fiocruz e o Instituto Nacional de Saúde (INS) moçambicano já formou mais mais de 60 mestres. No ano passado, foi lançado o Programa Educacional em Sistemas de Saúde (SIS-Saúde Brasil/Moçambique) para fortalecer os sistemas de saúde na região. O programa é um grande consórcio institucional de seis diferentes programas de pós-graduação da Fundação em parceria com o INS e a Universidade Lúrio, ambos de Moçambique. O mais recente projeto prevê ainda a criação de uma escola nacional de saúde pública no país.
Outra iniciativa que teve êxito foi a cooperação para a implantação dos bancos de leite humano. Essa iniciativa começou com a Fiocruz auxiliando inicialmente a formação de uma rede brasileira na década de 1980 e partindo depois para a formação de redes regionais, como a que envolve os países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). Desde 2011, foram implantados na África, com base na cooperação da Fiocruz e da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), dois bancos de leite humano em Cabo Verde, um em Moçambique e um em Angola, beneficiando milhares de bebês e ajudando a combater a mortalidade infantil. Essa experiência deve crescer este ano, com a ampliação do número de bancos nos países e uma conferência em maio. Há projetos para as possíveis aberturas de um novo em Cabo Verde e três novos em Moçambique. A colaboração com a União Africana ajudará agora a estabelecer essa cooperação para além dos países de língua portuguesa.