“Uma vez que você usa uma abordagem científica na arte ou emprega um método artístico na ciência, você na prática mostra que nenhuma barreira real existe”. Quem defende essa tese é a escultora americana Rhonda Shearer, que apresentará a palestra Art or Science? It`s both..., nesta segunda-feira (09/10), durante o simpósio Ciência e Arte 2006. O evento é uma parceria entre a Fiocruz (por meio do Museu da Vida e do Instituto Oswaldo Cruz), o British Council e o Centro Federal de Educação Tecnológica de Química de Nilópolis, com apoio da Faperj e do CNPq.
No site da ONG Art Science Research Laboratory a senhora fala da falsa divisão existente entre arte e ciência. Que elo utiliza para aproximá-las?
Rhonda: A noção de que há uma separação entre ciência e arte é uma convenção, não uma realidade objetiva. Por exemplo, filosofia e psicologia foram por um tempo apenas um campo. No caso da arte e da ciência, a diferença entre elas recai num esquema maior e mais poderoso de categorização que projeta a ilusão de que é real. A fundamental dicotomia que opõe masculino versus feminino ou geométrico versus orgânico e mente versus emoções. Eu nem preciso dizer que a ciência é categorizada como masculina e mental enquanto a arte como feminina e emocional.
Com isso dito, as revoluções científicas explodem belamente e re-configuram os esquemas geométricos que literalmente formam nossas opiniões. Um exemplo é a crença pré-Copérnico de que no Sistema Solar o planeta Terra era central, e assim, o corpo planetário mais importante, de acordo com nossos valores. Quando a ciência mudou, não foi apenas uma simples troca que tornou o Sol como centro. A Terra foi, de fato, rebaixada. Os esquemas de categorização são em si mesmos fundamentais no mapeamento e na ordenação de nossos pensamentos e valores. Eu chamo esta teoria de Flatland Hypothesis. Minha opinião é de que a própria mente opera usando geometrias. Quando as geometrias mudam, pensamentos e valores mudam. Historicamente, revoluções em geometrias criaram revoluções na arte e na ciência.
Quais são os prejuízos dessa divisão para o conhecimento?
Rhonda: Se os limites entre a ciência e a arte se reduzissem, isso poderia ajudar a arte a ganhar financiamento e respeito. Entretanto, a ciência poderia ser desvalorizada se mais associada à arte. Outra vez, nós estamos lidando com uma profunda polarização social. A arte é emoção e o feminino. No século 19, quando era trabalho de homem, o secretariado era um trabalho muito respeitado e com alta remuneração - quando se transformou em “trabalho de mulher”… bem, você sabe o resto. O mesmo poderia acontecer à ciência se demasiadamente associada com a arte.
Outros estudiosos tentaram aproximar esses dois campos?
Rhonda: Minha experiência diz que os cientistas são muito mais abertos, confortáveis e interessados em aproximar o assunto da arte/ciência. Minha opinião é que os artistas e os historiadores de arte deveriam aprender mais ciência e matemática. Para compreender Marcel Duchamp em toda a profundidade, por exemplo, você necessita estar familiarizado com o trabalho de Henri Poincaré, “o pai da teoria do caos” e geometria fractal.
Como essa visão pode ser transmitida para as novas gerações de artistas e cientistas?
Rhonda: A melhor maneira de ensinar a arte/ciência é pelo exemplo e estudo de casos que mostram que a separação entre a arte e a ciência é fluida. Uma vez que você usa uma abordagem científica na arte; ou emprega um método artístico na ciência, você na prática mostra que nenhuma barreira real existe. É uma questão de tradição social e acadêmica. Aplicar métodos através dos limites é um meio muito poderoso que significa produzir o trabalho original em outro campo. Em anos recentes, eu ampliei meu trabalho de “arte e ciência” através de estudos disciplinares para incluir também todos os humanities (1) junto com a ciência.
1. Humanities – Grupo de assuntos acadêmicos unidos pelo comprometimento de estudar os aspectos da condição humana com uma abordagem qualitativa que em geral impede que um único paradigma venha a definir uma disciplina.