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18/04/2005

Estudo identifica microfilárias insensíveis à dietilcarbamazina (DEC)

Bruna Cruz


Desde 1947, a dietilcarbamazina (DEC) vem sendo usada como principal medicamento no tratamento da filariose. No entanto, seu mecanismo de ação ainda gera polêmica, seja pelas reações adversas que provoca - febre, enjôo, cefaléia - ou pela eficácia na erradicação do Wuchereria bancrofti, parasita causador da doença. Um estudo desenvolvido pelo Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães (CPqAM), unidade da Fiocruz em Pernambuco, no município de Olinda, mostrou que as microfilárias encontradas em pacientes submetidos a vários tratamentos com a dosagem padrão da DEC, estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e utilizada em áreas endêmicas, quando tratadas in vitro, não sofrem alterações celulares.


"Comparando com o que ocorre com os vermes obtidos de indivíduos que nunca receberam o tratamento, isso sugere que as microfilárias de pacientes que receberam repetidos tratamentos são refratárias à DEC", explica Luiz Carlos Alves, pesquisador do Departamento de Biologia Celular e Ultra-Estrutura do CPqAM e autor do estudo.


O trabalho investigou, durante 24 meses, o efeito da terapia com a DEC em três pacientes assintomáticos, repetindo a dose padrão - seis miligramas por quilo (6 mg/kg), três vezes ao dia, durante 12 dias -, após seis meses. A densidade de microfilárias encontradas em amostras de sangue dos pacientes, medida por meio do método de filtração, diminuiu em até 70%, depois dos 12 primeiros meses do tratamento, mas retornou ao nível inicial após dois anos. Análises ultra-estruturais feitas no microscópio eletrônico de transmissão mostraram que essas microfilárias apresentavam poucos danos celulares quando comparadas às de pacientes que não receberam o tratamento. Elas sofreram um processo chamado de apoptose, uma forma de morte programada da célula, onde ocorre degeneração do citoplasma e condensação do núcleo.


Larvas


O estudo também identificou as alterações ultra-estruturais causadas por diferentes concentrações de DEC em larvas infectantes (L3), estágio em que o parasita se encontra no interior do mosquito transmissor, o Culex quinquefasciatus. Larvas tratadas com 3, 5 e 10 microgramas por mililitro (mg/ml) tiveram sua motilidade (capacidade de se deslocar) reduzida. As L3 tratadas com 5 e 10mg/ml também apresentaram várias organelas danificadas e desorganização do citoplasma com presença de vários vacúolos (pequenas cavidades), indicando que a substância exerce efeito direto sobre este estágio larval.


O fato confirma a importância do tratamento em massa feito atualmente em áreas endêmicas, já que, quando o mosquito infectado pica um indivíduo tratado com DEC, a larva possivelmente entra em contato com a droga e sofre degeneração, bloqueando o ciclo de transmissão da doença.


Entretanto, pela resistência apresentada por pacientes tratados repetidamente com a substância, a pesquisa mostra que há necessidade de implantar outros protocolos de tratamento em áreas endêmicas. "Na área de Olinda em que desenvolvemos o trabalho a maioria dos indivíduos tratados continua com filariose. Pretendemos reavaliar todos os pacientes com microfilária refratária e incluí-los num novo projeto, para verificar se, como aconteceu na Índia e na África, a combinação da dietilcarbamazina com outras drogas faz a diferença", adianta o pesquisador.


O estudo teve o financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe), sendo desenvolvido como trabalho de conclusão do doutorado em biologia celular e molecular do Instituto Oswaldo Cruz. 

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