10/07/2013
“Os objetivos da atual agenda de reforma regulatória no Brasil espelham austeridade regulatória em busca de uma regulação mais sinérgica, eficiente e efetiva, numa visão de governo como um todo. Em vez de simplesmente debater sobre ‘menos’ ou ‘mais regulação’, busca-se, atualmente, por estratégias, mecanismos e práticas que favoreçam a 'melhor regulação' a partir do controle e acompanhamento da qualidade do processo decisório, em busca de uma regulação mais democrática e responsiva aos interesses legítimos da sociedade”. A opinião é do aluno Gustavo Henrique Trindade da Silva, que defendeu sua dissertação de mestrado profissional em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), em 4 de julho, intitulada Performance regulatória: uma análise do Programa de Melhoria do Processo de Regulamentação da Anvisa no contexto da atual agenda de reforma regulatória no Brasil.
A Anvisa foi instituída com a finalidade de promover a proteção da população pelo controle da fabricação e comercialização de produtos e serviços que direta ou indiretamente se relacionem com a saúdePara Silva, a regulação sinérgica é uma forma encontrada por governos democráticos de ajustar esse novo modelo de governança, para manter a autonomia dos reguladores e, ao mesmo tempo, legitimar a regulação por meio de mecanismos de “governo indireto” que fortaleçam a transparência, a participação e o controle social sobre a atividade regulatória. Portanto, disse ele, “reflete uma perda de discricionariedade procedimental em favor da preservação da autonomia decisória dos reguladores, em busca de eficiência e efetividade para o sistema regulatório”.
O aluno lembrou que o debate político e acadêmico da reforma regulatória no Brasil sempre foi muito intenso, principalmente a partir de meados da década de 1990, com o advento das agências reguladoras no aparato administrativo brasileiro. “No primeiro momento”, comentou ele, “o debate da reforma regulatória relacionava-se com a típica questão de engenharia institucional, fortemente influenciada pela conformação política e ideológica sobre o tamanho e o papel do Estado”.
“Nos últimos dez anos, a tônica das discussões mais recentes volta-se para as chamadas ‘falhas de governança’ desse novo ambiente regulatório insulado burocraticamente da arena política, apontando para a necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos de transparência, participação e responsabilização dos reguladores perante os interesses legítimos da sociedade”, afirmou. Ele acrescentou que isso não tem sido uma peculiaridade brasileira; até mesmo países com larga experiência regulatória e que disseminaram o modelo de reguladores autônomos para o resto do mundo passaram por questões semelhantes e encontraram caminhos de superação.
O principal resultado da pesquisa, apontou Silva, é que o modelo do programa da Anvisa apresenta-se como experiência teoricamente consistente e operacionalmente válida a produzir os efeitos e benefícios pretendidos em termos de melhoria da qualidade do processo de regulamentação da agência. “Suas estratégias e ações são condizentes com as melhores práticas internacionais e com o atual debate político e acadêmico do país, sendo capazes de contribuir para a transparência, previsibilidade, consistência, participação social e responsabilização da atividade regulatória perante os diferentes grupos de interesses da sociedade”, destacou. Apesar disso, ressaltou ele, a instituição não está imune a críticas, porque todo o esforço institucional e de caráter inovador da maioria das práticas regulatórias adotadas em termos de administração pública brasileira, há espaço para aperfeiçoamento e avanços, sobretudo no que diz respeito aos mecanismos e arranjos de implementação do processo de gestão regulatória para garantia de eficácia e efetividade quanto aos resultados pretendidos pelo programa.
Histórico da Anvisa
A Anvisa foi instituída por meio da Lei n.º 9.782, de 26 de janeiro de 1999, com a finalidade de promover a proteção da saúde da população por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços, que, direta ou indiretamente, se relacionem com a saúde, compreendidas todas as etapas e processos, da produção ao consumo, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras. Além disso, também é responsável pela coordenação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), que compreende o conjunto de atividades de regulação, regulamentação, controle e fiscalização na área de vigilância sanitária, executadas por instituições da administração pública direta e indireta da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.
Com o crescimento do país no âmbito econômico e social, cada vez mais está sendo exigida uma atuação regulatória efetiva e eficiente por parte da agência, que perceba riscos e seja capaz de evitá-los para proteger a saúde, mas também promover a inovação e impulsionar o desenvolvimento econômico e social do país. A Anvisa buscou formular um programa abrangente de melhoria da qualidade de seu processo de regulamentação a fim de promover o fortalecimento da capacidade institucional para gestão em regulação; a melhoria da coordenação, da qualidade e da efetividade da regulamentação; e o fortalecimento da transparência e do controle social no processo de regulamentação.
Gustavo Henrique Trindade da Silva tem graduação em Direito pelo Centro Universitário do Distrito Federal (1998). É especialista docente em direito público pelo Instituto de Ciências Sociais do Centro Universitário do Distrito Federal (2004), em políticas públicas e gestão estratégica da saúde pela Ensp (2007) e vigilância sanitária pela Fiocruz (2008). Atua na área de direito e políticas públicas, regulação e saúde coletiva, com ênfase em saúde pública e vigilância sanitária.