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26/06/2007

Novo coordenador comenta o Programa Integrado de Esquistossomose da Fiocruz


De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), existem cerca de 200 milhões de pessoas com esquistossomose no mundo, 10% delas sujeitas a morrerem devido à doença, e aproximadamente 650 milhões de habitantes em áreas que a doença é endêmica. No Brasil, onde a esquistossomose é encontrada em todas as regiões geográficas e em pelo menos 19 unidades da Federação, há, segundo estimativas, em torno de 2,5 milhões de portadores da doença e cerca de 25 milhões de pessoas expostas ao risco de contraí-la.


Para conhecer um pouco mais sobre a esquistossomose e sobre o papel dos estudos feitos na Fiocruz nas ações de controle desenvolvidas no Brasil e no mundo, o Informe Ensp conversou com o pesquisador Carlos Eduardo Grault, chefe do Laboratório de Esquistossomose do Departamento de Ciências Biológicas (DCB) da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp), membro do Comitê Técnico Assessor do Programa de Esquistossomose do Ministério da Saúde desde novembro de 2005 e recentemente indicado pelo grupo de pesquisadores em esquistossomose da Fundação para ocupar a coordenação da regional Rio de Janeiro do Programa Integrado de Esquistossomose da Fiocruz, que envolve ainda os centros de pesquisa Gonçalo Moniz, em Salvador, Aggeu Magalhães, no Recife, e René Rachou, em Belo Horizonte.


 Grault: grupo retomou a idéia de criação do Centro Colaborador para o Programa de Controle de Esquistossomose da Organização Mundial de Saúde (Foto: Virginia Damas)

Grault: grupo retomou a idéia de criação do Centro Colaborador para o Programa de Controle de Esquistossomose da Organização Mundial de Saúde (Foto: Virginia Damas)


Em novembro de 2005 uma portaria da Ensp o nomeou como representante da Escola no então recentemente instituído Comitê Técnico Assessor do Programa de Esquistossomose do Ministério da Saúde. Qual é exatamente o objetivo do comitê?


Carlos Eduardo Grault: O Comitê é uma iniciativa bastante interessante da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério. Ele surge quando o Ronaldo Santos do Amaral, gerente técnico de Esquistossomose, e Eduardo Hage Carmo, coordenador geral de Vigilância de Doenças Transmissíveis da SVS, resolvem constituir um grupo de especialistas para assessorar o Ministério na formulação de propostas de ações de controle da esquistossomose no país. Para formar o grupo, eles convidam instituições de reconhecida competência na área, dentre elas a Ensp, cuja direção indica o meu nome para representar a Escola. O objetivo do Comitê é basicamente auxiliar o Ministério na reestruturação do Programa de Controle da Esquistossomose que, atualmente, é uma ação municipalizada, ou seja, é de responsabilidade das secretarias municipais de Saúde.


Então, apesar de as ações estarem municipalizadas, a esquistossomose ainda é motivo de preocupação para o Ministério?


Grault: Bem, no Brasil, o problema da esquistossomose já teve uma dimensão tão grande que precisou ser instituído um Programa Nacional de controle da doença. Com a municipalização, as cidadees, que ainda enfrentam uma carência muito grande de conhecimento técnico e de pessoal especializado, começaram a assumir as ações que eram de responsabilidade do Ministério e o programa nacional sofreu certa descontinuidade, passando a existir como um programa especial. Com o passar do tempo, os técnicos do Ministério perceberam que, graças aos avanços conseguidos com a quimioterapia, que tornou o tratamento muito mais eficaz, e à eficiência das ações que haviam sido desenvolvidas pelo programa nacional, a morbidade devida à esquistossomose diminuiu bastante no Brasil, mas que tem havido uma expansão territorial da doença – atualmente, já há um foco ativo no sul do país. Esse quadro acabou motivando a criação do Comitê.


Como é o trabalho do Comitê e qual o resultado do trabalho até o presente momento?


Grault: O Comitê se reúne periodicamente e várias sugestões bastante importantes já foram feitas pelos especialistas e acatadas pelo Ministério. Uma delas é a realização de um inquérito nacional que permita o conhecimento da prevalência da esquistossomose no Brasil, gerando dados mais completos e confiáveis. Outra proposta é sobre a montagem de uma carta planorbídica que mostre a distribuição geográfica do caramujo hospedeiro do Schistossoma mansoni no território nacional. Nós também estamos trabalhando na atualização do manual de diretrizes técnicas para o controle da esquistossomose, a partir de informações mais recentes e considerando a nova realidade existente no país. Fora isso, existe um grupo mais reduzido de pesquisadores da Fiocruz que também está auxiliando o Ministério na construção de uma proposta de qualidade para os laboratórios de saúde pública que atuam como referência para o exame parasitológico para a esquistossomose, uma vez que o diagnóstico preciso também é essencial.


Qual a importância de conhecer a distribuição dos moluscos no país?


Grault: A expansão territorial da esquistossomose está muito relacionada aos movimentos populacionais, ou seja, ao deslocamento de pessoas de áreas endêmicas para áreas que, apesar de não terem a doença, não têm saneamento básico, o principal fator de contaminação, e têm presença do molusco hospedeiro. É fundamental, portanto, que se conheça as áreas de risco da doença.


Pelas propostas do Comitê, se percebe que existem problemas relacionados à questão da informação sobre esquistossomose no Brasil. Por que isso acontece?


Grault: No que se refere à informação sobre esquistossomose existem alguns problemas, dentre os quais a subnotificação, por conta da sensibilidade do diagnóstico utilizado – que tem uma sensibilidade de cerca de 70%, o que demandaria a repetição do exame, o que é inviável devido ao custo – e por conta de a investigação epidemiológica sobre esquistossomose só ser feita, na maioria dos municípios, a partir de casos constatados. O que nós estamos propondo é que seja feita uma busca ativa em nível nacional para que se conheça, de fato, a taxa de positividade da esquistossomose no Brasil. Isso é fundamental para que sejam propostas ações e medidas de controle mais adequadas, associadas ao que já conhecemos: informação e educação em saúde, saneamento e tratamento.


Pesquisadores de Farmanguinhos, por exemplo, vêm se dedicando a desenvolver novas tecnologias que facilitem o tratamento. O medicamento utilizado atualmente pelo MS, o Praziquantel, além de ter um gosto muito ruim, encontra-se disponível apenas na forma de comprimido e, portanto, para ser administrado em crianças é necessário que seja macerado, a fim de facilitar a ingestão do medicamento. Neste sentido, o primeiro passo foi facilitar o fracionamento do comprimido criando ranhuras no medicamento, contudo, ainda assim fica o problema do sabor que é muito desagradável. Para superar esta questão, Farmanguinhos vêm trabalhado para desenvolver a formulação líquida do medicamento e tornar o sabor mais agradável.


Sobre a portaria da Fiocruz que formaliza o Programa Integrado de Esquistossomose na instituição e o nomeia coordenador para a região do Rio de Janeiro, o que isso significa?


Grault: Esse programa existe desde 1985, quando a OMS solicitou que a Fiocruz atuasse como Centro Colaborador para o Programa de Controle de Esquistossomose da Organização. Nessa época, o então presidente da Fiocruz, Sergio Arouca, sugeriu a formação de um grupo que reunisse pesquisadores em esquistossomose de todas as unidades da Fundação e promoveu um primeiro encontro em Petrópolis. A partir daí, a cada dois anos, é feita uma reunião na qual são discutidas questões de organização do próprio programa, ou seja: formas de torná-lo mais integrado às atividades de pesquisa já realizadas por áreas de conhecimento, possibilitando o intercâmbio entre os pesquisadores e o estabelecimento de novas parcerias dentro da Fiocruz, a fim de melhorar a qualidade da pesquisa feita e permitir a racionalização de recursos. Além disso, também a cada dois anos, é realizado pela Fiocruz um simpósio internacional nessa área. Em 2007 haveria um simpósio internacional, mas o evento foi adiado para coincidir com os 100 anos do descobrimento, por parte de Manuel Augusto Pirajá da Silva, do parasito da esquistossomose no Brasil. Um fato importantíssimo para a ciência brasileira e para todos os pesquisadores que vêm trabalhando com a doença desde então. O XI Simpósio Internacional de Esquistossomose será realizado na Bahia e está sendo coordenado por Mitermayer Galvão dos Reis, diretor do Centro de Pesquisa Gonçalo Muniz (CPqGM) da Fiocruz.


O que motivou a formalização do programa e o que representa para o grupo e para a Fiocruz?


Grault: Este ano, o XI Encontro de Pesquisadores em Esquistossomose na Fiocruz, em Ouro Preto, contou com a presença do vice-presidente de Serviços de Referência e Ambiente da Fiocruz, Ary Carvalho de Miranda, que foi sensível à nossa demanda e sugeriu a institucionalização do programa, o que ocorreu por meio da portaria 201/2007 da Presidência. A idéia é que isso também servisse para estimular a formação de outros programas de pesquisa integrada em outras doenças. Com ânimo renovado, o grupo retomou a idéia do Centro Colaborador e, com apoio da Presidência, está preparando a documentação a ser enviada para a OMS. Vale destacar que vários laboratórios que compõem esse grupo já são laboratórios de referência nacional e o programa desenvolve, além da pesquisa, atividades de ensino regular ou por demanda do Ministério ou de secretarias de Saúde.


Fonte: Informe Ensp

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