Apenas um genótipo para cada um dos três tipos do vírus da dengue está circulando em Pernambuco desde 1987, quando foi registrada a primeira epidemia da doença no estado pelo tipo 1 (DENV-1). Desde então, sempre que um novo sorotipo foi inserido na localidade, observou-se um aumento significativo na incidência de casos, devido ao grande número de pessoas susceptíveis ao vírus. Essas e outras constatações são fruto de um estudo do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM), unidade da Fiocruz em Pernambuco, em colaboração com o Laboratório Central de Saúde Pública do estado (Lacen-PE), que analisou os aspectos epidemiológicos, clínicos e laboratoriais da evolução da dengue no estado até o ano de 2006.
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Marli Tenório analisou a evolução da dengue até 2006 |
As análises genéticas dos vírus isolados em Pernambuco mostraram que, para o tipo 1, o conjunto de genes que o caracterizam é o Américas/África. Para o tipo 2, é o denominado Sudeste da Ásia. Já o tipo 3 circulante, e que causou a última grande epidemia no estado em 2002, é o Índia Subcontinental. “Esses genótipos são considerados de alto impacto epidemiológico e estão associados à ocorrência de casos de dengue hemorrágica em vários países. Entretanto, ainda não se pode afirmar se eles são os responsáveis pelo aumento do número de casos de dengue hemorrágica em Pernambuco nos últimos anos”, comentou Marli Tenório Cordeiro, autora do estudo e pesquisadora do Departamento de Virologia e Terapia Experimental (Lavite) da Fiocruz de Pernambuco.
De 1988 a 1994, não houve registro de casos nativos da doença, o que os especialistas chamam de “silêncio epidemiológico”. Mas em 1995 o estado voltou a apresentar casos de dengue (9.982), desta vez, pelo tipo 2, em sua maioria. Em 1996, o número chegou a 22.722, 128% maior que no ano anterior. De 1997 a 1998, os casos foram aumentando (32.627, em 1997, 52.633, em 1998), mas de 1999 a 2001, o número de registros caiu 32% (17.112, em 2001). Neste período, o contágio se alternou entre os sorotipos 1 e 2. Já em 2002 (116.254 casos), o tipo 3 foi inserido, afetando tanto os que já haviam tido a doença em outras ocasiões, como os que ainda não haviam entrado em contato com o vírus, contabilizando um aumento de 877% em relação ao número de casos de 2001. Cerca de 380.492 casos foram notificados no período do estudo, com 612 confirmados da forma hemorrágica, levando 33 pessoas a óbito.
A taxa de incidência da doença aumentou de 134 para 1.438 casos por cem mil habitantes nas epidemias de 1995 e 2002, respectivamente. O maior número de casos de dengue em cada epidemia (83,3%) foi notificado no primeiro semestre de cada ano, durante os meses de março a maio, período em que ocorrem chuvas sazonais.
Sintomas
As manifestações clínicas mais importantes entre os casos confirmados laboratorialmente (48.900) foram febre (91,4%), cefaléia (84,1%), dores musculares (61%), dor atrás do olho (61%), dor nas articulações (56,4%), prostração (52,8%) e erupções cutâneas vermelhas (49,2%). Mas foi a ocorrência de formas atípicas da doença que chamou a atenção. A partir de 1997 foram registrados e confirmados 32 casos de manifestações neurológicas, tanto em casos de infecção primária, como secundária, pelos três sorotipos da dengue. “Poucos profissionais foram capazes de associá-las com a infecção pelo vírus da dengue. Nesse caso, o diagnóstico laboratorial é imprescindível”, alertou Marli.
Segundo a pesquisadora, o estudo contribuirá para o trabalho de vigilância epidemiológica e laboratorial da doença no estado. O trabalho, apresentado como tese de doutorado em saúde pública do CPqAM, foi orientado pelos pesquisadores Eduardo Freese (CPqAM), Hermann Schatzmayr e Rita Nogueira, os dois últimos do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), e realizado com dados da Secretaria de Saúde e do Laboratório Central (Lacen) de Pernambuco. Os resultados serão publicados em formato de livro ainda este ano.