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28/04/2008

Pobreza amplia o risco de contrair leptospirose


Um estudo feito no bairro de Pau da Lima, em Salvador, se tornou pioneiro por utilizar um sistema de informação geográfica (ferramenta que possibilita atribuir coordenadas espaciais a dados epidemiológicos) para identificar deficiências na infra-estrutura de saneamento de uma comunidade carente como fatores de risco para a infecção pela bactéria Leptospira. A pesquisa revelou que 15,4% dos 3.171 moradores que participaram do estudo haviam sido infectados pela bactéria, que causa a leptospirose. A pesquisa também mostrou que moradores de comunidades carentes que residem em casas localizadas próximas a esgotos abertos, acúmulos de lixo e áreas de risco para alagamento, como os fundos de vales, e que têm menor renda apresentam maior chance de serem infectados pela bactéria. O trabalho acaba de ser publicado na revista PLoS Neglected Tropical Diseases e foi coordenado pelos cientistas Albert Ko, pesquisador-visitante da Fiocruz Bahia e professor do Weill Cornell Medical College, e Mitermayer Galvão dos Reis, pesquisador-titular e diretor da unidade da Fundação no estado.


 Barracos em Pau da Lima, bairro em que foi feito o estudo sobre leptospirose

Barracos em Pau da Lima, bairro em que foi feito o estudo sobre leptospirose


De acordo com a pesquisa, diferenças no ambiente próximo à casa dos moradores são responsáveis por determinar o risco de infecção. Pessoas que residiam a menos de 20 metros de esgotos abertos e em áreas propensas a alagamentos, nos fundos dos vales, tinham uma chance de infecção 42% maior que pessoas que moravam a mais de 20 metros de locais semelhantes. E residir a menos de 20 metros de um acúmulo de lixo aumenta a chance de infecção em 43%. Os pesquisadores identificaram que os moradores que relataram ter visto dois ou mais ratos perto de suas casas e que criavam galinhas, um hábito que propicia a infestação por roedores atraídos pelos restos de alimentos oferecidos às aves, tinham um maior risco de infecção pela Leptospira. Estes achados sugerem que deficiências de saneamento, como esgotos abertos, presença de lixo, risco de alagamento e infestação por roedores próximos às casas são importantes fatores na cadeia de transmissão da leptospirose.


Outro achado importante foi a relação entre a renda per capita da família e o risco de infecção. O estudo mostrou que o risco de infecção diminuiu 11% para cada acréscimo de US$ 1 na renda familiar diária per capita. Segundo os autores, a elucidação dos “determinantes específicos de pobreza que levaram ao aparecimento de leptospirose em zonas urbanas”, são essenciais para orientar as intervenções de base comunitária. “Precisamos focar intervenções para remover as fontes de transmissão identificadas na comunidade e desenvolver políticas sobre saneamento e sua implementação”, acrescenta Ko.


Não é à toa que este debate emerge. No Brasil, 37% população urbana vive em bairros sem condições mínimas de saneamento e com índices elevados de pobreza. Em Salvador, o percentual é bem maior, chegando a 67%. No bairro de Pau da Lima, os indicares são bastante desfavoráveis: 85% dos indivíduos entrevistados não têm título da propriedade; a renda domiciliar per capita é de apenas US$ 1,30 por dia (cerca R$ 2,15 por morador por dia, ou R$ 64,60 por morador por mês); 76% não têm sequer o ensino fundamental concluído, sendo que 23% são analfabetos. Estima-se que nos próximos 20 anos a população mundial de residentes em favelas dobrará de 1 para 2 bilhões de pessoas. Estudos sobre a transmissão da doença nessas comunidades serão fundamentais para guiar intervenções ambientais que possam controlar a leptospirose.


A enfermidade é adquirida durante contato direto com água e solo contaminados com urina de animais infectados. Nos centros urbanos o rato de esgoto é o principal reservatório e disseminador da bactéria no ambiente. No Brasil são registrados mais de 10 mil casos de leptospirose grave por ano. A doença inicia-se com febre alta, dor de cabeça e dor no corpo e pode ser confundida com dengue, gripe e outras viroses. Os casos graves evoluem com icterícia (olhos e pele ficam amarelos), falência dos rins (redução do volume da urina) e sangramentos. Cerca de 10% dos pacientes internados com leptospirose grave morrem. O risco de óbito é 50% maior entre os paciente que apresentam sangramento pulmonar.

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