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05/02/2020

Radis de fevereiro debate o uso de psicodélicos na medicina

Luiz Felipe Stevanim (Revista Radis)


Muito além da regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre a venda de produtos à base de maconha para fins medicinais, o neurocientista Sidarta Ribeiro defende que o futuro da medicina está no uso de psicodélicos como a maconha, o LSD e a ayahuasca. Essas substâncias aumentam as sinapses do cérebro e podem ser a chave para doenças como Alzheimer, Parkinson e depressão, aponta o pesquisador de 48 anos que ajudou a fundar o Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Ao permitir a venda de remédios à base de cannabis nas farmácias, mas manter a proibição do cultivo no país, a Anvisa deu apenas um passo simbólico, mas nada efetivo, segundo Sidarta, pois a maconha medicinal vai continuar pouco acessível para a população. Atualmente, as empresas precisam importar os componentes da planta, já que ela não pode ser cultivada em solo brasileiro — o que encarece a venda para as pessoas que dependem do tratamento com essas substâncias.

A ciência do cérebro, no entanto, aponta em outra direção e o uso de psicodélicos na saúde tem um “futuro promissor”, nas palavras do neurocientista que estuda há quase três décadas a biologia da mente. “Não se trata do consumo indiscriminado, mas em doses muito baixas e muito esporadicamente”, explica em entrevista exclusiva à Radis. Um dos campos científicos em que o Brasil possui maior destaque internacional é a neurociência e Sidarta é um dos responsáveis por isso: o Instituto do Cérebro da UFRN, que ele fundou e do qual hoje é vice-diretor, promove pesquisas sobre o que acontece na mente durante os sonhos e os efeitos de substâncias encontradas em plantas como a cannabis para a saúde humana. Os estudos desenvolvidos por seus pesquisadores já comprovaram, dentre outras coisas, que o DMT (dimetiltriptamina) presente na ayahuasca, bebida do Santo Daime, atua como antidepressivo e que o LSD (dietilamida do ácido lisérgico, obtida a partir de um fungo) pode ajudar a conter o declínio mental que acompanha doenças como o Alzheimer.

Essas conclusões têm sido chamadas de “renascimento psicodélico” e são, para Sidarta, a constatação científica de conhecimentos milenares da humanidade. Contudo, ainda há um longo percurso até reconhecer os benefícios dessas substâncias, pois as evidências se chocam com interesses da indústria farmacêutica e preconceitos entranhados na sociedade. “O grande pesadelo é que a maconha é uma farmacopeia inteira. Se essa planta puder ser cultivada em casa, ela quebra a indústria, pois compete com muitas substâncias que estão na farmácia”, sintetiza.

Outro tema de interesse do neurocientista é a bioquímica dos sonhos. Ele defende que aquilo que sonhamos durante a noite é fundamental para entendermos o que acontece conosco durante o dia. As conclusões de quase três décadas de estudo sobre o papel dos sonhos e do sono estão reunidas no livro “O oráculo da noite”, lançado pela Companhia das Letras em 2019. “Prestar atenção aos sonhos é compreender as possibilidades existentes no presente com base nas experiências vividas no passado”, pontua.

O futuro dessas e de outras pesquisas pioneiras no Brasil está, de acordo com Sidarta, sob ameaça diante dos cortes de bolsas e do cenário de perseguição contra as universidades. Integrante da diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Sidarta também faz parte desde 2015 do Conselho Consultivo da Plataforma Brasileira de Política de Drogas e é seu coordenador científico desde 2018. É professor titular de neurociências da UFRN, com doutorado em Comportamento Animal pela Universidade Rockefeller, nos Estados Unidos. Com a Radis, ele conversou sobre política de drogas e o uso de psicodélicos na saúde, o papel dos sonhos no cotidiano e o futuro da ciência brasileira.

Leia a entrevista completa no site da Radis

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