Analisar a reestruturação do trabalho em um grande banco estatal de Minas Gerais e avaliar os possíveis impactos desse processo na saúde dos bancários foram os objetivos de uma pesquisa publicada em dezembro na revista Cadernos de Saúde Pública da Fiocruz. Conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o estudo revela que, entre 1995 e 1998, houve 50 mil demissões e que, de 1998 a 2003, os funcionários totalizaram mais de 300 mil dias de afastamento do trabalho devido a problemas de saúde, principalmente distúrbios osteomusculares e transtornos mentais e comportamentais. Esses problemas, conforme sugere o artigo, podem ser um reflexo da reestruturação do trabalho no banco.
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(Ilustração: Prodeb) |
Os bancos, privados e estatais, vêm passando por um processo onde caixas eletrônicos substituem trabalhadores no atendimento, assim como por mudanças na gestão que exigem cada vez mais produtividade dos funcionários. O resultado é uma redução do número de bancários combinada a uma sobrecarga de atividades para aqueles que conseguem permanecer empregados. “Nos bancos estatais, além dos problemas relativos ao processo de enxugamento de quadros, houve a quebra de um pacto implícito de estabilidade”, acrescenta o artigo. Em outras palavras, o risco do desemprego se tornou presente inclusive para os funcionários de bancos públicos.
Na empresa estudada pela equipe da UFMG, houve diferentes ocorrências relacionadas à reestruturação produtiva. Entre os anos 80 e 90, ocorreu a terceirização dos centros de processamento de serviços, exigindo a realocação ou demissão de trabalhadores do banco. Em 1995, foi anunciado o Programa de Desligamento Voluntário, que, em pouco mais de um mês, contabilizou quase 13.400 rescisões de contrato. Logo depois, teve início o Plano de Adequação de Quadros, com duração de cerca de três anos, demitiu 50 mil pessoas.
Então, em 2001, vieram os chamados atos de gestão, por meio dos quais funcionários eram demitidos, sem justa causa nem instauração de inquérito administrativo, caso fossem considerados ineficientes, improdutivos ou não ajustados à filosofia do banco. “Criava-se, assim, a possibilidade de demissões de trabalhadores que não correspondessem às expectativas de produtividade da empresa”, resume o artigo, assinado por Luiz Sérgio Silva e Tarcísio Pinheiro, da Faculdade de Medicina, e Emília Sakurai, do Instituto de Ciências Exatas.
Nesse cenário, surge a questão de se o clima de insegurança no emprego, associado ao contínuo enxugamento do quadro de funcionários, pode influenciar o estado de saúde dos trabalhadores. Ao investigar essa questão, os pesquisadores constataram, por exemplo, que os profissionais demitidos ou sob risco de demissão durante o período analisado eram justamente aqueles com histórico de mais afastamentos do trabalho por licença-saúde.
Em relação às doenças dos trabalhadores daquele banco estatal, a equipe da UFMG também detectou uma mudança de perfil entre 1998 e 2003. Por um lado, a prevalência de afastamentos por distúrbios osteomusculares caiu de 34 para 19 casos em mil trabalhadores. Por outro, a prevalência de afastamentos por transtornos mentais e comportamentais subiu de 17 para 21 casos em mil.
Já entre 2004 e 2005, os distúrbios osteomusculares representavam 19% dos afastamentos e os transtornos mentais e comportamentais, 25%. Baseados em outros relatos da literatura científica, os autores concluem que as repercussões da reestruturação produtiva dos bancos podem incluir um aumento de doenças não só como a lesão por esforço repetitivo, mas também síndrome do pânico, alcoolismo, depressão e outras.