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07/08/2006

Saber e sentir: uma etnografia da aprendizagem da biomedicina












Saber e sentir: uma etnografia da aprendizagem da biomedicina

Octavio Bonet

Editora Fiocruz

136p. R$ 16,00


 





Durante cerca de quatro meses, um antropólogo acompanha, em um hospital público, a rotina de um grupo de residentes em clínica médica. O resultado dessa experiência - que revela mecanismos do processo de se tornar médico - está no livro Saber e sentir: uma etnografia da aprendizagem da biomedicina, recém-lançado pela Editora Fiocruz. O autor, Octavio Bonet - doutor em antropologia pelo Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e professor-adjunto do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora - divide com o leitor suas vivências com um grupo de 22 jovens em um hospital-escola em uma cidade da província de Buenos Aires.


Se, no início do século 20, havia grande interesse dos antropólogos sobre as noções de saúde e de doença entre os nativos de aldeias distantes e exóticas, hoje é crescente o número de estudos sobre a própria cultura ocidental. Os cientistas querem compreender, muitas vezes, o que restou das práticas tradicionais após a disseminação do pensamento científico. No livro de Bonet, os 'nativos' em análise são estudantes de medicina. A questão central formulada pelo autor é: como esses jovens rapazes e moças conciliam o saber objetivo encontrado nos livros da faculdade com a subjetividade que aflora no contato com pacientes de carne e osso?


Bonet explica que, no século 17, o hospital não era um espaço para a cura: funcionava como uma instituição de assistência aos pobres. Ele só começa a ser associado à aprendizagem da clínica médica no final do século 18. Hoje, o autor define o hospital como "o espaço fundamental, o 'teatro', onde se manifestam o saber médico e os saberes leigos, os temores e as certezas". E a entrada nesse espaço tão especial marca uma ruptura na vida da maioria dos residentes.


Esses jovens estudantes passam a maior parte do dia no hospital, onde têm que aprender a lidar com a morte, com a incerteza e, muitas vezes, com a sensação de fracasso. "Quando entramos, nos primeiros dias, chorávamos todo o dia. Eu chorava. Não me acostumava a esta vida, a estar aqui. Pensei que havia errado de carreira", disse uma residente a Bonet. Segundo o autor, o sentimento da jovem, compartilhado por tantos outros residentes, está relacionado à constatação de que a aprendizagem na faculdade - "a medicina de livro" - não se adequa ao dia-a-dia do hospital - "a medicina vivida".


As visitas aos leitos dos pacientes representam momentos de tensão tanto para os residentes como para os doentes. "Para o paciente, é o momento em que vários médicos analisam seu caso - na maioria das vezes na sua presença. Pode, assim, perceber expressões de preocupação ou escutar alguns comentários que possa entender", diz o livro. Já o residente precisa encarar os questionamentos do doente. E esses questionamentos, em geral, se referem a aspectos emocionais, inseguranças e medos. Mergulhar nessa atmosfera complexa que envolve o cotidiano dos residentes no hospital: é este o convite que Bonet faz ao leitor em Saber e sentir.

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