26/02/2016
Um problema extremamente complexo, que envolve uma tríplice epidemia: dengue, zika e chikungunya. Assim o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) da Fiocruz, Valcler Rangel, classificou a situação enfrentada pelo Brasil, durante sessão especial realizada na última quinta-feira (25/2) no plenário do Senado Federal, para “avaliar as dimensões do vírus zika no Brasil bem como averiguar os meios para conter a propagação do mosquito Aedes aegypti em território nacional”. O Ministro da Saúde, Marcelo Castro, a médica Adriana Melo, do Instituto de Pesquisa Joaquim A. Neto, da Paraíba, e Lúcia Bricks, diretora médica do Laboratório Sanofi-Pasteur, participaram da sessão.
Já são oito séculos de doenças similares à dengue transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti, explica Rangel
Valcler Rangel disse que o enfrentamento do problema requer união de esforços - da ciência, do poder público, da sociedade civil e de cada indivíduo. Relatou que após o Ministério decretar emergência sanitária nacional devido ao vírus zika, a Fiocruz, em dezembro de 2015, constituiu um Gabinete de Enfrentamento da Emergência que coordena as ações de todas as unidades da instituição, situadas no Rio e em outros estados. Foi traçado um plano de ação que observa cinco dimensões: atenção à saúde, vigilância em saúde, desenvolvimento tecnológico e laboratórios de referência, ensino e mobilização social.
A identificação do vírus zika, primeiro em líquido amniótico e posteriormente na urina e na saliva, a confirmação da transmissão inter-placentária, o multi-teste molecular para diagnóstico simultâneo da dengue, zika e chikungunya são alguns dos achados de pesquisadores da Fiocruz relacionados pelo vice-presidente. Ele informou que estão em curso estudos de longo prazo com o acompanhamento das gestantes e das crianças para verificar a ocorrência de alterações além das já identificadas, como o comprometimento da audição e da visão.
Na área de ensino, anunciou a abertura de editais para cursos à distância sobre zika e chikungunya. Até o dia 25 de fevereiro, somavam 11 mil as inscrições para o curso zika: abordagem clínica na atenção básica, e 14 mil para o de chikungunya. Os cursos resultam da parceira Fiocruz, UNA-SUS e a UFMS e serão estendidos para 16 países da América Latina.
A imensa capacidade de adaptabilidade do mosquito e o fato de haver relatos que remontam há oito séculos a respeito de doenças transmitidas pelo Aedes foram destacados por Valcler. Ele desenhou um rápido panorama sobre resultados de pesquisas na área de controle do vetor, a exemplo da unidade dispersora de larvicida, dos mosquitos esterilizados por radiação nuclear, do biolarvicida DengueTech, dentre outros. Destacou a importância da informação e da comunicação e da mobilização social nas ações de controle do vetor e apresentou alguns projetos em desenvolvimento, como o escalonamento da experiência da bactéria Wolbachia, incorporação do vírus zika no Kit NAT para controle de sangue, dentre outros.
O Ministro da Saúde, Marcelo Castro, traçou um panorama mundial da incidência da dengue, informando a ocorrência da doença em 113 países, com registro de 50 mil mortes por ano. Relacionou todas as medidas adotadas, desde a constatação da relação zika-microcefalia e anunciou o repasse de R$ 300 milhões para o Ministério de Desenvolvimento Social (MDS) para a compra de repelentes que serão distribuídos para gestantes atendidas pelo Bolsa Família. A estratégia tem como objetivo reduzir o risco de casos de zika entre grávidas e, consequentemente, de nascimento de bebês com microcefalia. Ainda não há prazo para o início da distribuição.
A médica paraibana Adriana Melo defendeu o uso da ultrassonografia durante a gravidez para detecção da microcefalia, destacando a necessidade e importância da melhoria da qualidade dos equipamentos e a capacitação dos profissionais. Ela falou sobre a angústia que a domina todas as sextas-feiras. Neste dia ela atende dezenas de mulheres e tem de dar às futuras mães uma má ou boa notícia. “É desesperador”, diz ela.
A diretora médica da América Latina do Sanofi Pasteur, Lúcia Bricks, considerou "uma bobagem" a associação do uso de vacinas com o surto de zika. Um dos boatos difundidos sobre microcefalia é o de que a doença teria sido causada por um lote vencido de vacina contra rubéola aplicado em gestantes no Nordeste. Para a médica, é um boato sem qualquer fundamento.
Parlamentares
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) pediu ao ministro da Saúde, Marcelo Castro, a adoção de políticas públicas que facilitem o acesso dos mais pobres a repelente de insetos. Destacou a iniciativa do Ministério da Saúde de disponibilizar gratuitamente os repelentes às gestantes beneficiárias do Bolsa Família. Elogiou os pesquisadores da Fiocruz e do Ministério da Saúde que têm se debruçado em pesquisas de combate ao Aedes aegypti, que já têm dado resultados concretos a nível nacional e internacional.
O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) vinculou o agravamento do problema da dengue e do zika no Brasil à diminuição de repasse orçamentário para as ações de combate ao mosquito Aedes aegypti. Para ele, outra causa é a redução de investimentos em saneamento. Pensamento similar foi defendido pelo Senador José Serra (PSDB-SP), que atrelou a redução de investimentos em saneamento ao aumento da incidência e da letalidade da dengue.
A senadora Ana Amélia (PP-RS) lastimou o baixo comprometimento do brasileiro com ações perenes capazes de resolver problemas coletivos enfrentados pela população. Ela mencionou um projeto de erradicação do mosquito da dengue na cidade de São Sebastião, no entorno de Brasília, conduzido por pesquisador da Embrapa e que conseguiu, durante um determinado período, mobilizar a população e solucionar o problema. Reduzido o problema, a população negligenciou as ações de combate ao mosquito. Para ela, o mesmo desleixo se repete agora com o combate ao mosquito Aedes aegypti. “Enfrentar o mosquito é uma obrigação de todos e seu perigo pode estar num vaso de flores, numa piscina abandonada, na displicência da população”, observou a senadora.