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08/08/2018

Artigo analisa tratamento de complicações do aborto

Informe Ensp


Cerca de 18 milhões de abortos são realizados por ano em condições inseguras nos países de renda baixa e média. Um artigo publicado na revista Cadernos de Saúde Pública aponta que, no Brasil, onde o acesso ao aborto induzido é restrito, as mulheres enfrentam dificuldades para receber cuidados pós-aborto.

Os pesquisadores que produziram o artigo, Thália Velho Barreto de Araújo e Sandra Valongueiro Alves, da Universidade Federal de Pernambuco; Estela M. L. Aquino e Greice M. S. Menezes, da Universidade Federal da Bahia; Maria Teresa Seabra Soares de Britto e Alves e Liberata Coimbra, da Universidade Federal do Maranhão, Maria-da-Conceição C. Almeida, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz); e Oona M. R. Campbell, da London School of Hygiene and Tropical Medicine, dizem que o tempo gasto pelas mulheres com complicações para chegar às instalações, onde podem receber cuidados adequados pós-aborto, pode influenciar o risco de morte e a extensão de complicações ou morbidades adicionais. 

O artigo foi baseado em uma pesquisa realizada nas capitais de três estados do Nordeste do Brasil (Salvador, na Bahia; Recife, em Pernambuco; e São Luís, no Maranhão), em 2010. Essas cidades contam com 22 hospitais públicos que prestam atendimento obstétrico e pós-aborto. Hospitais com mais de 120 internações no ano anterior foram incluídos, ou seja,19 hospitais (8 em Recife, 7 em Salvador e 4 em São Luís). Um total de 3.064 mulheres foram eleitas pela pesquisa, das quais 2,7% se recusaram a participar, e 5,8% tiveram alta ou morreram (2 mulheres) antes de poderem ser entrevistadas, restando 2.804 mulheres entrevistadas.

Segundo o estudo, a maioria das mulheres (91,7%) tinha menos de 30 anos, com média de 27,6 anos, e eram, em sua maioria (88,6%), casadas, em coabitação ou em união estável. A maioria (89,1%) declarou-se não branca, mas 0,4% não se classificou. Quase dois terços (64,3%) tinham oito anos de educação ou mais. Um terço (35,5%) não estava trabalhando, mas apenas 7% nunca tinham trabalhado.

A pesquisa relata que os meios de transporte para essa primeira tentativa de procura de cuidados foram carro particular - família, namorado, amigo ou carro do vizinho - (32,5%), transporte público (32,2%), táxi (18%) ambulância (7,8%), a pé (5%), ou de bicicleta ou moto (0,9%). O total de 76,6% das mulheres foram para um hospital primeiro (dos quais 97% eram hospitais públicos); no entanto, apenas 47% permaneceu lá para a totalidade de seus cuidados. 

Mas, o estudo observou que o transporte era uma barreira menor, sendo o medo / estigma das mulheres motivos importantes para atrasos no México; e desumanização do atendimento, desrespeito, abuso e julgamento por profissionais de Saúde foram documentados no Brasil e em outros lugares. "Mesmo as mulheres com abortos espontâneos enfrentam atitudes discriminatórias".
 
Quase 23% dessas mulheres entrevistadas não compareceram a um estabelecimento apropriado, embora 16% tenham procurado atendimento dentro do sistema de saúde, indo primeiro para um serviço de saúde (ambulatório ou unidade de atenção primária) para os cuidados de que precisavam. A porcentagem, cujo primeiro local de procura de cuidados estava fora do sistema de saúde (isto é, uma farmácia, uso de medicamentos tradicionais em casa, ou uma visita a uma parteira tradicional ou outra), era inferior a 7%.

O artigo alerta que, para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, o desafio do Brasil é consolidar os ganhos em saúde materno-infantil, melhorar o acesso das mulheres e a qualidade dos cuidados e reduzir ainda mais as desigualdades, abordando questões de saúde marginalizadas e mulheres marginalizadas.

O aborto é um evento comum no Brasil, embora seja permitido apenas em casos de estupro, quando a vida de uma mulher está ameaçada ou, mais recentemente, para a anencefalia fetal. Os pesquisadores indicam que a revisão da Lei restritiva brasileira contribuiria para reduzir atrasos e permitir o acesso oportuno a complicações relacionadas ao aborto. “A legalização do aborto em outras situações reduziu as complicações relacionadas ao aborto e, provavelmente, o tempo gasto pelas mulheres para procurar atendimento.”

Esse artigo, intitulado Atrasos no acesso ao tratamento das complicações relacionadas ao aborto: a experiência das mulheres no Nordeste brasileiro, foi publicado na edição de junho de 2018 da Cadernos de Saúde Pública, publicada pela Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz).

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