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17/05/2021

Comitê promove debate sobre branquitude e práticas antirracistas

Roberta Costa (CCS/Fiocruz)


Debater sobre o conceito de branquitude e apontar os privilégios simbólicos e materiais das pessoas brancas para estimular a reflexão e o questionamento sobre a visão eurocêntrica de mundo e contribuir na construção de práticas antirracistas. Esse foi o objetivo do encontro Branquitude e práticas antirracistas, realizado na última terça-feira (11/5). O evento on-line, promovido pela Fundação Oswaldo Cruz por meio do Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz, teve transmissão aberta ao público pelo YouTube da VideoSaúde Distribuidora da Fiocruz.

 
Erika Farias, Rita Vasconcelos, Marina Maria, Lia Vainer e Ionara Magalhães durante o evento que contou com os intérpretes de Libras Edécio Ambrósio e Sheila Martins (imagem: Divulgação)

 

A live, organizada pela jornalista do Instituto Aggeu Magalhães (IAM/Fiocruz Pernambuco) e integrante do Comitê, Rita Vasconcelos, contou com a participação da especialista em Estudos Étnicos e Raciais, mestra e doutora em Saúde Coletiva; professora e coordenadora de Políticas Afirmativas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Ionara Magalhães, e da pesquisadora em Psicologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); autora de livros como Famílias inter-raciais e Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: branquitude, hierarquia e poder na cidade de São Paulo, Lia Vainer Schucman. A mediação do debate ficou por conta da jornalista da Coordenação de Comunicação Social (CCS/Fiocruz) e integrante do Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da instituição, Erika Farias. 

A integrante da coordenação colegiada do Comitê Pró-Equidade e jornalista do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), Marina Maria, abriu o encontro falando sobre a atuação do Comitê para consolidar, dentro da Fiocruz, uma agenda para o fortalecimento das relações étnico-raciais e da diversidade de gênero e orientação sexual. “Temos atuado na gestão, nas relações de trabalho, atendimento ao público, pesquisa e ensino da Fiocruz. Falar de saúde é falar de equidade e diversidade. E, por isso, nesse contexto da pandemia, continuamos promovendo encontros virtuais com o objetivo de contribuir com a formação da comunidade Fiocruz e com o público em geral nas pautas ligadas à equidade de gênero e raça”, afirmou. 

Lugar de conforto

Branquitude é um conceito pouco difundido, que só ganha sentido dentro da luta antirracista. É um campo de estudos que se refere ao lugar de vantagem estrutural da pessoa branca em sociedades estruturadas pelo racismo. Ou seja, a pessoa é colocada pela sociedade em um papel de superioridade e assume privilégios simbólicos e materiais que provocam consequências cotidianas para toda a população, em especial a população negra. 

A mediadora Erika Farias apresentou o tema do evento a partir de suas impressões como mulher branca. Segundo ela, ser branco é um lugar cômodo, que não gera para a pessoa questionamentos sobre o que isso representa. “Para a luta antirracista é fundamental que a gente entenda qual é a nossa responsabilidade nesse sistema. Ou então fica parecendo que a luta é do outro, fica parecendo que o racismo é problema das pessoas negras. Mas o racismo é um problema da hierarquização das relações entre as pessoas brancas e as pessoas negras. Ou seja, é um problema de todo mundo, que tem que ser resolvido pela sociedade em conjunto”, declarou a jornalista. 

Especialista em Estudos Étnicos e Raciais, Ionara Magalhães acredita que a sociedade coloca o branco em uma posição de ser intocável. “O branco nunca é responsabilizado. É como se os negros fossem responsáveis por sua própria condição, já que a história nunca vai condená-los”, afirmou. Para a professora, é fundamental que a pessoa branca entenda que o racismo também é prejudicial para ela, já que a coloca em uma falsa posição de poder e superioridade. “Tendo em vista que o negro foi considerado um sujeito inacabado, é importante perceber que a dialética branca também é sujeito inacabado. O branco é construído da mesma forma, mesmo que a sociedade diga o tempo todo que ele é o centro do universo. Isso é muito necessário para enxergar a história por outras lentes e desnaturalizar as desigualdades”, ressaltou a convidada.

Ionara considera que, para o negro, há um processo doloroso de descoberta e de ‘tornar-se negro’ que rouba uma energia muito grande, enquanto para o branco não existe essa questão existencial. “O branco tem uma segurança psíquica e não precisa olhar para o espelho e pensar: como eu vou lidar com essa cor nos dias de hoje? será que alguém vai me discriminar em determinado momento? será que eu vou chegar aos 70 anos? Essas preocupações não existem”. Entretanto, quando um branco observa uma pessoa negra começando a se admirar, a gostar de suas características, ele não fica tranquilo. “Qualquer conquista de uma pessoa negra pode ser considerada uma afronta. Olhar para o branco e não desejar o seu cabelo, por exemplo, isso é terrível para ele”, afirmou a especialista. 

Racismo institucional e práticas antirracistas

O racismo institucional é uma forma de discriminação, silenciosa ou não, que ocorre dentro das instituições públicas ou privadas com pessoas negras e que promove a exclusão ou o preconceito racial. “A gente tem que pensar que o racismo não é só quando não se gosta da pessoa negra, mas também é o fato de ver que, em algumas instituições, todas as pessoas que tiveram o poder de decisão política eram homens brancos. E aí é imprescindível que a gente associe que o poder político, econômico e jurídico desse país está na mão de pessoas brancas. Ou seja, todas as Instituições de prestígio estão na mão de pessoas brancas”, explicou Lia Vainer. 

Segundo a pesquisadora, nosso país é dividido a partir de uma ‘racialidade’ que coloca pessoas brancas e negras em lugares completamente assimétricos. Lia frisou que a branquitude é um lugar de vantagem estrutural, onde todos os brancos são beneficiados com o racismo e recebem recursos simbólicos e materiais que distribuem entre si. “Não basta apenas não ser racista, é preciso ser antirracista. E para isso é muito importante pensar em práticas antirracistas, principalmente em nossas Instituições. Só é possível chegar em resultados de conquista universal em um país em que há uma divisão pela raça quando há políticas focadas em distribuir os recursos igualitariamente, já que eles foram produzidos pela sociedade como um todo”.

Para Lia Vainer, o mito da democracia racial compõe a ideia do mérito e de que brancos e negros têm oportunidades iguais. “Se a gente resolver fazer a vacinação contra a Covid-19 sem colocar uma ação afirmativa para as pessoas negras, os brancos tomam mais vacinas. Se fizermos cotas sociais sem incluir cota racial, os brancos pobres entram mais do que os negros pobres na universidade. Exatamente por isso precisamos ter, além de práticas individuais, ações afirmativas, como inclusão de cotas raciais, distribuição de bolsas e abertura de vagas em todas as Instituições para combater o racismo”, finalizou a pesquisadora.

O encontro virtual do Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz teve tradução para a Língua Brasileira de Sinais (Libras), em acordo com a política institucional para implementação de medidas de acessibilidade comunicacional. O evento está disponível na íntegra no canal VideoSaúde no YouTube:

Comitê

O Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz foi criado em 2009, para consolidar uma agenda institucional pelo fortalecimento dos temas étnico-raciais e de gênero na Fundação, colaborando para uma constante atualização e reorientação de suas políticas, bem como de suas ações, seja nas relações de trabalho, seja no atendimento ao público e na produção e popularização do conhecimento. Periodicamente, o Comitê realiza atividades de formação e iniciou essa série de encontros virtuais diante das recomendações de distanciamento social para o enfrentamento ao novo coronavírus.

Uma instituição de saúde pública cuida de pessoas. A Fiocruz acredita no conceito de saúde ampliado, em que ter saúde não é apenas o contrário de estar doente. Saúde é um aspecto amplo e que envolve diversas esferas da vida pessoal e em sociedade. Promover cidadania, equidade de gênero e raça e acesso igualitário a oportunidades é também promover saúde. O Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz, assim como outras frentes de atuação da instituição, entre as quais pesquisa, ensino, assistência, inovação e comunicação, está em constante desenvolvimento para promover saúde ampla para seus mais de 10 mil trabalhadores e para a população brasileira. Todos permanentemente em defesa da vida.

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