07/05/2021
Um estudo pioneiro desenvolvido na Fiocruz, fruto da parceria de duas de suas unidades, o Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI) e o Instituto Oswaldo Cruz (IOC), demonstrou a relação entre a exposição e/ou infecção de animais de estimação e a infecção de seus tutores pelo Sars-CoV-2, além de analisar a prevalência do vírus em cães e gatos e possíveis alterações clínicas e laboratoriais associadas à infecção animal. O estudo, coordenado pelo médico infectologista Guilherme Calvet, do Laboratório de Pesquisa Clínica em Doenças Febris Agudas, e pelos médicos veterinários Sandro Antonio Pereira, Isabella Dib Gremião e Rodrigo Caldas Menezes, do Laboratório de Pesquisa Clínica em Dermatozoonoses em Animais Domésticos,do INI, contou com a colaboração do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do IOC, referência em coronavírus da OMS para as Américas, na análise dos casos de 21 pacientes e de seus 39 animais de estimação na Região Metropolitana do Rio de Janeiro entre maio e outubro de 2020.
A pesquisa, publicada pela revista científica internacional Plos One no artigo Investigation of SARS-CoV-2 Infection in Dogs and Cats of Humans Diagnosed with COVID-19 in Rio de Janeiro, Brazil, selecionou o grupo de pacientes de famílias distintas com exame RT-PCR positivo, elegendo partir dali 39 animais de estimação, sendo 29 cães e 10 gatos. Nos casos de pacientes que viviam simultaneamente com outras pessoas, os outros moradores da casa foram convidados a participar mesmo que não apresentassem sintomas de infecção, considerando a possível circulação do coronavírus.
Após a confirmação dos casos humanos de Covid-19, os pesquisadores coletaram as primeiras amostras nasofaríngeas/orofaríngeas e retais dos animais envolvidos para identificar se havia infecção ou exposição ao vírus. Também foram coletadas amostras de sangue para realização de Teste de Redução e Neutralização de Placas (PRNT90) para analisar se os animais desenvolveram anticorpos contra Sars-CoV-2. Os pesquisadores também avaliaram a presença de alterações clínicas e laboratoriais associadas à infecção animal. Foram feitas até três coletas em dias diferentes de cada animal, sendo a última coleta repetida cerca de 30 dias da primeira.
“Os principais resultados da pesquisa demonstram que, de 21 domicílios diferentes, quase a metade apresentava um ou mais animais de estimação positivos para Sars-CoV-2. Foram nove cachorros (31%) e quatro gatos (40%) infectados ou expostos ao Sars-CoV-2. Os animais obtiveram resultados de RT-PCR positivos de 11 a 51 dias após o aparecimento dos primeiros sintomas de seus tutores. Entre os cães, três apresentaram dois testes positivos realizados num intervalo de 14, 30 e 31 dias. As amostras de sangue determinaram presença de anticorpos contra o Sars-CoV-2 em um cão e em dois gatos”, explicou Calvet, destacando que 46% dos animais infectados apresentaram sinais clínicos leves e reversíveis que podiam estar associados a infecção pelo vírus.
“Este trabalho - fruto da colaboração entre o INI e o IOC - é de grande importância, uma vez que não estava claro, no início da pandemia do Sars-CoV-2, se os animais domésticos poderiam se infectar ou transmitir o vírus. A pesquisa foi bastante meticulosa por analisar, além de diversos fatores, o soro de cães e gatos infectados, demonstrando a neutralização viral pelos anticorpos produzidos por esses animais. É um estudo bastante completo e que contribui para um melhor entendimento da capacidade do novo coronavírus de infectar diferentes espécies animais”, afirmou a chefe do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do IOC/Fiocruz, Marilda Siqueira.
Como conclusão, o estudo aponta a importância do distanciamento social de humanos infectados inclusive com seus animais de estimação, que podem ser infectados. Foi observado também que animais castrados são mais suscetíveis e que dividir a cama com o tutor eleva o risco de infecção. Os casos apresentados no artigo foram notificados ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil que também notificou os casos na plataforma da The World Organization for Animal Health (OIE).
“A pesquisa só pôde ser realizado pelo trabalho de uma equipe multiprofissional que incluiu médicos, enfermeiros, veterinários, biólogos e estatístico, pelo apoio recebido da diretora do Instituto Nacional de Infectologia, Valdiléa Veloso e da chefe do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do IOC/Fiocruz, Marilda Siqueira. Também foram fundamentais os apoios financeiros do Ministério da Saúde (CGLab/MoH), Fiocruz, da Faperj e do CNPq. O intenso e meticuloso trabalho de Maria Ogrzewalska, Alex Pauvolid-Corrêa e Paola Cristina Resende, responsáveis pela identificação do SARS-CoV-2 e dos anticorpos nos animais do estudo, também foi muito importante”, destacou Guilherme Calvet.
O que fazer caso o animal de estimação seja positivo para o novo coronavírus (Sars-Cov-2)
Os cães e gatos raramente se infectam com o vírus e dificilmente apresentam doença, que quando ocorre normalmente tem um a evolução branda. Adicionalmente, nos casos de infecção desses animais relatados mundialmente, essa infecção é de curta duração e o vírus é encontrado geralmente em quantidade muito baixa. Essa baixa quantidade de vírus pode explicar o fato de que não há comprovação de que cães e gatos possam transmitir naturalmente esse vírus ou ser fonte de infecção para seres humanos.
A propagação atual do novo coronavírus é resultado da transmissão de humano para humano. Os casos de infecção natural de cães e gatos até o momento foram relacionados a transmissão pelos tutores contaminados pelo vírus. Até o momento está comprovado que gatos são mais susceptíveis a infecção pelo novo coronavírus do que os cães e podem transmitir esse vírus para outros gatos em condições de laboratório. No entanto, não está comprovada a transmissão do novo coronavírus dos cães para outros cães ou gatos.
Pelos motivos explicados acima, não há motivo para deixar de ter cães e gatos e abandoná-los em caso de estarem positivos para o novo coronavírus. Saiba como proteger seu animal de estimação clicando aqui.