13/11/2014
Desafio da saúde pública mundial, o combate à malária tem nos inseticidas contra o mosquito transmissor um importante aliado. Utilizando uma metodologia pioneira, pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) deram início a um estudo que pretende definir um protocolo de aplicação mais eficaz para estes produtos. A iniciativa, em parceria com o Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA), conta com o apoio do Ministério da Saúde (MS) e da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS).
À pedido do Ministério da Saúde, pesquisadores do IOC e o do IEPA estão testando seis simulações de inseticidas. Resultado final pode otimizar o uso das composições em benefício da saúde da população, além de gerar economia de recursos públicos (foto: Gutemberg Brito)Atualmente, uma das formas de combate à malária no Brasil consiste no uso de inseticidas. Para combater um mosquito que vive em florestas – mas entra no ambiente doméstico para se alimentar com sangue e depois repousa nas paredes - uma das perguntas importantes para os cientistas é saber se a eficácia da aplicação de inseticidas em diferentes revestimentos poderá apresentar variações. Outra questão relevante é definir qual a periodicidade ideal das aplicações.
“Esperamos preencher uma lacuna de informação. Nossa expectativa é ter dados que permitam inclusive aperfeiçoar as indicações de uso presentes nos rótulos dos inseticidas”, diz José Bento Pereira Lima, pesquisador do Laboratório de Fisiologia e Controle de Artrópodes Vetores do IOC e coordenador do estudo. “O projeto, que foi encomendado pelo Ministério da Saúde, não poderia ser realizada sem a parceria com o IEPA, um instituto com capacidade técnica para o estudo e localizado na região que concentra 99% dos casos de malária no país”, reforça.
Na busca de respostas para estes e outros questionamentos, o “tubo de ensaio” não poderia ser outro: uma casa foi construída especialmente para os testes na sede do IEPA, em Macapá. Simulando o ambiente residencial, a casa possui os quatro tipos de superfícies encontradas com mais frequência na Região Amazônica, onde ocorre a transmissão da malária no Brasil, incluindo alvenaria com reboco, alvenaria sem reboco, madeira pintada e madeira sem pintura. As seis formulações de inseticidas atualmente disponíveis estão sendo aplicadas em cada um dos tipos de revestimento, de acordo com as condições reais de uso. Os estudos vão determinar o prazo exato de efeito residual – tempo em que o produto permanece ativo, combatendo a presença do mosquito, em cada tipo de superfície.
Mosquitos em ação
Vinte e quatro horas após a aplicação dos inseticidas, os mosquitos são colocados em contato com cada tipo de superfície ao longo de 30 minutos. Em cada teste, cerca de 20 fêmeas do gênero Anopheles foram usadas – são as fêmeas que transmitem a doença em busca de sangue para sua alimentação. Em seguida, os mosquitos são levados para análise em laboratório. “Em até 24 horas, pelo menos 80% dos mosquitos devem, obrigatoriamente, estar mortos. Esse processo se repetirá mensalmente para as diversas superfícies, até verificarmos que o produto não está mais tendo o efeito esperado”, explica Ana Paula Sales de Andrade Corrêa, pesquisadora do IEPA e integrante da iniciativa.
A preocupação com cada detalhe é constante entre os especialistas. “Estamos de olho em cada particularidade. Para uma melhor análise da exposição aos inseticidas, vamos estudar grupos de mosquitos em três diferentes alturas: 50cm, 1,0m e 1,50m. Estas são as distâncias do solo em que as fêmeas geralmente repousam após a alimentação com sangue”, justifica Allan Kardec Ribeiro Galardo, chefe do Laboratório de Entomologia Médica do IEPA e coordenador do estudo juntamente com José Bento.
Para assegurar a qualidade dos resultados, 20 fêmeas do gênero Anopheles são colocadas em três diferentes alturas. Testes devem durar dois anos (foto: Gutemberg Brito)Além do benefício para a saúde pública, o Consultor Nacional em Malária da OPAS, Oscar Mesones Lapouble, que acompanha de perto o estudo, chama a atenção para o aspecto econômico da iniciativa. “Teremos redução no uso de recursos públicos, uma vez que a pesquisa busca otimizar um dos processos de controle do vetor”, afirmou Lapouble. “Procuramos contribuir para que o Programa Nacional de Controle da Malária adote um controle cada vez mais eficiente do vetor”, conclui Bento.
Próximos passos
Os mosquitos que sobreviverem à exposição aos inseticidas serão guardados para futuros estudos sobre a resistência aos produtos químicos usados no combate. “Pouco se sabe sobre resistência dos Anopheles aos inseticidas disponíveis. Vamos aproveitar a oportunidade deste projeto e ir além”, enfatiza Ana Paula Sales. O trabalho deve durar, em média, dois anos.