Início do conteúdo

05/12/2013

A história dos internacionalistas americanos e a luta por justiça social e igualdade

Danielle Monteiro


A história da vida de profissionais e ativistas americanos que dedicaram suas vidas ao internacionalismo na saúde é tema do livro Camaradas na saúde: A história dos Internacionalistas americanos e a luta pela justiça social e igualdade, da historiadora e professora da Universidade de Toronto Anne-Emanuelle Birn. A publicação foi apresentada durante palestra da historiadora na Fundação, como parte do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde (PPGHCS). A coleção de ensaios chama atenção para as atividades internacionais da esquerda sanitarista americana, desde a década de 1930 até tempos atuais, e as lições que esses profissionais levaram de volta para sua terra, em diálogo com os movimentos sociais e a política da saúde global. Foram médicos, enfermeiros, entre outros profissionais, engajados na luta por justiça social, equidade e direito à saúde em diversos países do mundo. “O livro não retrata a vida dos internacionalistas de saúde mais famosos do século 20, mas sim daqueles que morreram lutando por suas crenças políticas e que lutaram como verdadeiros solidários internacionais”, destacou a autora.

O livro é inspirado em figuras que foram símbolo de mobilização do internacionalismo na saúde: a canadense Norman Bethune – uma cirurgiã comunista que lutou por um sistema de assistência médica estatal no Canadá, inovou o esquema de transfusões de sangue durante a guerra civil espanhola e participou da Revolução Chinesa – e o revolucionário médico argentino Che Guevara, que deixou Cuba para dar apoio à luta comunista no Congo e na Bolívia.  “Escolhemos um grupo de personagens, não só médicos, ligados ao campo da saúde que adquiriram aprendizado fora de seus países e tentaram implantar essas reflexões em um país de política conservadora”, explicou Anne-Emanuelle.

A obra divide os profissionais em quatro gerações. Na primeira, é narrada a trajetória dos internacionalistas da saúde que viveram nos momentos turbulentos da Grande Depressão. Personagens como os médicos Edward Barsky e Milton Roemer, pioneiro dos estudos comparativos entre sistemas universais e políticas de saúde. “Roemer foi perseguido nos EUA, mudou-se para o Canadá, onde fundou o Sistema Nacional de Saúde canadense, tornando-se figura-chave para o sistema de saúde do país”, contou Anne-Emanuelle. Outro personagem da época foi John Kingsbury, fundador da Fundação Milbank Memorial, que, após visitar a União Soviética, escreveu o livro Medicina vermelha, defendendo uma reforma na saúde americana similar à da URSS. “Kingsburry foi o início de uma tentativa de instauração de uma força de esquerda nos EUA”, disse a historiadora. Naquele momento turbulento, também viveu Walter Lear, ativista em saúde pública e direitos civis e organizador dos movimentos de esquerda na saúde juntamente com movimentos sociais externos. Assim como Lears, outros ativistas pagaram um preço por lutarem por esse ideal. “Eles foram acusados de atividades subversivas pelo governo americano e punidos pessoal e profissionalmente durante a Guerra Fria”, narrou Anne- Emanuelle.

Já a segunda geração vivenciou o macartismo e as lutas pelos direitos civis, sexuais, das mulheres e do trabalho, durante a década de 1960; movimentos que abriram os olhos de uma geração de esquerdistas da saúde para as possibilidades da medicina social. Entraram em cena, então, personagens como o estudante de medicina e ativista Jack Geiger, que participava de um movimento antirracista e levou experimentos de atenção primária à saúde adquiridos na África do Sul ao estado do Mississipi, nos EUA, durante a luta por direitos civis no país. E Victor e Ruth Sidel, médico e assistente social, respectivamente, que adaptaram o conceito chinês de barefoot doctor – profissional de cuidado à saúde treinado para atender às necessidades médicas básicas de zonas rurais – a um programa de saúde comunitária no bairro do Bronx, em Nova York.

A terceira geração foi constituída por médicos como Paula Braveman, que após anos de atividades médicas solidárias na Nicarágua, nos anos 1980, levou as lições sobre saúde e igualdade social que lá aprendeu para a Organização Mundial da Saúde, onde ajudou a implantar uma Iniciativa Global de Equidade em Saúde e Cuidado à Saúde. Já os médicos Stephen Gloyd, James Pfeiffer e Wendy Johnson mostraram como construir uma comunidade voltada à atenção primária à saúde na África.

Nascida nos anos 1960 e 1970, a quarta geração traz um grupo de ativistas que, por meio do trabalho junto a grupos políticos de oposição locais, traz uma voz transnacional aos mais vulneráveis, na tentativa de implantar movimentos de esquerda na saúde dos Estados Unidos. Integram essa parte da história, entre outros profissionais, os paramédicos Michael Terry e Laura Turriano; a advogada de direitos civis Alicia Ely, que fez pesquisas sobre direitos humanos e saúde no México e Peru; e ainda Lenny Smith, que desempenhou forte papel na promoção da Medicina da Libertação na América Central e na organização de esforços da solidariedade em saúde nos EUA. “Smith tentou instaurar a Medicina da Libertação com o conceito de cooperação estruturante”, contou a historiadora. Anne-Emanuelle é também autora dos livros Casamento por conveniência: a saúde internacional de Rockefeller e o México revolucionário e o Livro-texto da saúde internacional.

Voltar ao topo Voltar