Iniciativa propõe atuação integrada de saúde e ambiente na Amazônia

Publicado em - Atualizado em
Ricardo Valverde (Agência Fiocruz de Notícias)
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A Fiocruz lançou, nesta terça-feira (16/5), em Porto Velho, uma iniciativa que tem por objetivo promover uma atuação de saúde integrada na região amazônica a partir dos compromissos da Agenda 2030, produzindo conhecimentos e serviços e contribuindo para elaborar políticas públicas. O seminário Saúde e ambiente na Amazônia: integração necessária hoje para atuação nos cenários futuros e o fortalecimento do SUS reuniu dirigentes municipais e estaduais, representantes do Ministério da Saúde, de instituições governamentais e internacionais e o presidente da Fiocruz, Mario Moreira. Em sequência, serão organizados mais dois seminários que estenderão o debate e as propostas sobre o tema, em Manaus e Belém.

Seminário reuniu dirigentes municipais e estaduais, representantes do Ministério da Saúde, de instituições governamentais e internacionais e o presidente da Fiocruz, Mario Moreira (foto: José Gadelha / Fiocruz Rondônia)

 

De acordo com o presidente da Fiocruz, a meta é suscitar a articulação entre os diferentes atores dos setores de saúde, ciência, tecnologia e inovação, além de movimentos sociais. “Estou feliz com a pluralidade de instituições e pessoas aqui representadas. Essa é a cooperação que defendemos, em parceria com os sistemas de saúde e de ciência locais. A Fiocruz tem duas unidades na região, em Rondônia e no Amazonas, e quer contribuir com todo o seu arcabouço científico, tecnológico e educacional a favor do desenvolvimento dos territórios onde está presente e também daqueles em que não está”.

O coordenador-geral da Fiocruz Rondônia, Jansen Fernandes de Medeiros, citou a satisfação com a organização do evento, cuja pauta, segundo ele, foi elaborada durante alguns meses. “É um momento de emoção reunir toda essa representatividade da ciência e da saúde para pensar a saúde da Amazônia. Que este evento permita materializar políticas públicas em prol da melhoria da qualidade de vida das populações amazônicas”.

O professor Paulo de Tarso Oliveira, da Universidade Federal do Pará (UFPA), afirmou que o seminário representa um esforço importante dos pesquisadores da região. “É algo de grande importância, para nós, a realização deste evento, que mais do que um seminário científico é um seminário de trabalho. E esperamos que as propostas aqui definidas sejam incluídas nas políticas do Ministério da Saúde e que os atores da Amazônia sejam não apenas consultados, mas que sejam igualmente protagonistas deste processo”.

Em seguida foi lida uma carta da ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima, que não pôde comparecer ao seminário. A ministra escreveu que “é impossível pensar a saúde e o ambiente sem essas duas dimensões caminharem juntas. A saúde ambiental para um ambiente saudável confirma a visão dos determinantes sócioambientais da saúde. Talvez o caso mais dramático dessa relação se expresse na emergência yanomami. Desde as primeiras semanas do governo estamos atuando em uma ação interministerial para reverter a desassistência criminosa a que foram submetidas essas populações. Essa é uma das situações que mostram a importância do seminário, a importância de uma ação integrada para fortalecer o SUS e a saúde ambiental da região e das pessoas que nela vivem. Da saúde da Amazônia e de seus povos depende o bem-estar de todo o planeta, reforçando a perspectiva de uma só saúde”.

O presidente da Fiocruz, Mario Moreira, lembrou que as unidades da Fundação completarão 30 anos (no Amazonas) e 15 anos (em Rondônia) em 2024. Ele sublinhou que a saúde é uma base fundamental para a democracia. “Saúde é um direito, é cidadania e é um projeto de sociedade. Portanto, tem importância central nesse esforço que compartilhamos de reconstrução do país e do Estado brasileiro. O SUS é a política pública mais inclusiva e que mais tem possibilidade de reduzir assimetrias”.

Moreira disse que é preciso considerar a Amazônia como área estratégica, incluindo saúde e a chamada sociedade do conhecimento. Ele acrescentou que é preciso repensar o desenvolvimento, que tem afetado de forma inequívoca o ambiente, com impactos imensos na saúde da população. Entre os desafios da região ele listou o fortalecimento da vigilância em saúde, interiorizar a rede pública, ampliar e qualificar o acesso ao SUS, consolidar os serviços de alta complexidade, formar e fixar recursos humanos, encarar os desafios das emergências sanitárias e elaborar projetos de desenvolvimento que tenham por base processos produtivos com base na biodiversidade. Para Moreira, é fundamental retomar o Fundo Amazônia, controlar o desmatamento, acabar com a impunidade em relação às multas ambientais e reverter a autorização para o garimpo ilegal. 

O presidente disse que nos últimos dez anos a Fundação investiu cerca de R$ 120 milhões na região. Moreira citou ainda o lançamento da primeira fase do projeto Inova Amazônia, da Fiocruz, que incentiva ambientes favoráveis à pesquisa por meio da formação de redes de pesquisa e é o maior programa de fomento da Fundação, com quase R$ 10 milhões investidos. Ele comentou ainda sobre os programas de pós-graduação da Fundação na região e o expressivo número de alunos inscritos em cursos de qualificação profissional. Moreira destacou os investimentos do projeto Unidos pela Covid-19, com ampliação da capacidade de testagem, doação de material médico, barcos laboratórios, usinas de oxigênio e outros, num total de mais de R$ 12 milhões.

Por fim, o presidente enumerou quatro proposições. Prospectar cenários e políticas, consolidar uma agenda de PDT&I, avançar no modelo de financiamento e definir uma matriz de articulação com agentes locais, nacionais e internacionais.

Em seguida, o professor Rudi Rocha, da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, apresentou uma pesquisa sobre a desigualdade da expectativa de vida e da oferta de serviços de saúde entre a Amazônia e o restante do Brasil. “E essa diferença vem aumentando a partir da pandemia”. Para Rocha, é crucial que o país implemente políticas públicas que sobrevivam aos sucessivos governos e tenham continuidade. “Precisamos sim, de mais recursos, mas também de mais gestão e mais planejamento. E de uma gestão integrada que envolva diversos setores”.

Depois houve a intervenção do coordenador de Vigilância, Preparação e Respostas a Emergências e Desastres da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) no Brasil, Alexander Rosewell. Tendo como foco saúde, meio ambiente e cidadania, ele fez uma longa explanação sobre a reposta da organização nos casos de emergências e desastres, elencou prioridades estratégicas e apontou desafios para a cooperação.

A professora Regina Feio Barroso, do Instituto de Ciências da Saúde da UFPA, apresentou as proposições para o Plano de Saúde da Amazônia Legal (Psal). “O Psal deve se vincular às diretrizes e objetivos do Plano Nacional de Saúde e apresentar novas iniciativas junto ao Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável da República, para diminuir desigualdades regionais e favorecer a equidade”. Segundo ela, é necessário articular ações com o MS e incorporar as especificidades da região nas políticas de saúde.

Dentro dessa perspectiva, Regina disse que uma meta importante é interiorizar e qualificar os profissionais de saúde, em especial dos que atendem os povos originários e populações tradicionais. “Também é fundamental que a Amazônia seja incluída no Complexo Produtivo da Saúde, não apenas como fornecedora de matérias-primas, mas também como produtora de vacinas, insumos e arranjos produtivos, como fitoterápicos”. Ela também reforçou o objetivo de dar mais musculatura às ações de vigilância em saúde. “E todo esse processo deve contar com a condução do MS, em parceria com as secretarias municipais e estaduais de Saúde”.

Por fim, o diretor-executivo da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), embaixador Carlos Alfredo Lazary Teixeira, e a consultora Patricia Granja, que foi vice-ministra da Saúde do Equador, abordaram o Plano Estratégico de Saúde Integral e Intercultural Amazônico para membros da OTCA. A apresentação citou os desafios da região amazônica e a proposta de desenvolver um plano que contribua para melhorar as condições de vida da população local e dos povos indígenas, sobretudo dos mais vulneráveis. Serão recolhidas sugestões de cada um dos países-membros (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela), a partir de reuniões bilaterais. E definidas ações e prioridades por país. O trabalho vai gerar um documento final que será apresentado na Quarta Cúpula do Tratado Amazônico, em agosto, em Belém.

Para a coordenadora de Estratégias de Integração Regional e Nacional da Fiocruz, Zélia Profeta, as apresentações vão contribuir para pensar em projetos estruturantes e agregadores. “Esta é uma agenda ampla e vamos precisar do apoio das instituições financiadoras para viabilizar os projetos”. O seminário continua nesta quarta-feira (17/5).