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20/10/2015

Pesquisador fala sobre o Pacto Nacional pela Redução dos Homicídios

Luiza Gomes (Cooperação Social / Fiocruz)


O Pacto Nacional pela Redução dos Homicídios propõe a articulação entre Governo Federal (a partir de seus ministérios e secretarias), estados e municípios, para promover uma redução de 5% ao ano nas taxas de homicídio. O pacto prevê que, com a contribuição de universidades e centros de pesquisa, e a participação das populações dos territórios na produção de diagnósticos, sejam desenvolvidas ações sociais e de segurança pública nos 81 municípios brasileiros com as maiores taxas de homicídio (concentram 50% das estatísticas). O processo é liderado pelo Ministério da Justiça e Secretaria Nacional de Segurança Pública.

Alexandre Fonseca participa do seminário 'Saúde e Segurança Pública: Desafios nos territórios vulnerabilizados', promovido pela Fundação (foto: Peter Ilicciev)

 

Em entrevista à Cooperação Social da presidência da Fiocruz, Alexandre Fonseca, pós-doutor em sociologia e coordenador-geral de Segurança, Cidadania e Direitos Humanos da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, falou sobre o Pacto Nacional de Redução de Homicídios. O pesquisador participou (13/1) do seminário Saúde e Segurança Pública: Desafios nos territórios vulnerabilizados, organizado pela Cooperação Social da presidência da Fiocruz, pelo Centro de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli da Escola Nacional de Saúde Pública (Claves/Ensp/Fiocruz) e pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). 

Quando começaram efetivamente as negociações para a execução do Pacto?

Fonseca: O Pacto Nacional da Redução dos Homicídios era uma promessa de campanha da presidenta [Dilma Rousseff]. O planejamento teve início em dezembro e se intensificou em janeiro/fevereiro. A partir daí, o Pacto começou a ser discutido dentro do governo, com os conselhos nacionais de que o Ministério da Justiça participa, como o de direitos LGBT, de segurança pública, da criança, dentre outros. Também foram realizadas reuniões com o secretário de segurança pública e com os chefes de polícia dos estados. A presidenta já conversou com os governadores em duas ocasiões. Nesse momento, o Pacto está na Casa Civil com a ideia de que esta pactue-o entre os diferentes ministérios. Existe um primeiro nível de pactuação, de avaliação e de definição. Mas os processos de diagnóstico e de execução são lentos, exigem uma série de etapas. A ideia, como discutimos no seminário, é que a política pública tem que ser consistente, pactuada, discutida, e isso não é algo simples. O Pacto parte do pressuposto de que a violência e os homicídios são multicausais: não há como isolar as causas. Sem participação social, envolvimento, pactuação com a sociedade civil, os governadores, os prefeitos, o governo federal e o judiciário, a gente não consegue enfrentar esse desafio que é reduzir [índices de homicídios] a 5% ao ano, que é a meta inicial do Pacto. 

Quais são os tipos de esforços previstos dentro do Pacto, quais as ações e o que está planejado para que essa meta seja alcançada?

Fonseca: O Pacto parte da ideia de ações concomitantes, sociais e de segurança pública. No campo das ações de segurança pública, ele exige a coordenação das ações da União, dos estados e das prefeituras, o aprimoramento do serviço de inteligência e de serviços de perícia, e a atuação da comunidade, universidades e centros de pesquisa, articulados com o processo judicial, tanto com o Ministério Público, quanto com a Magistratura, para a realização de um diagnóstico de território participativo. A intenção é criar um modelo de centros integrados de gestão que envolvam a sociedade, a polícia civil e a militar, os bombeiros, a guarda municipal e as instâncias de proteção de direitos humanos. Enfim, a ideia é ter processos que levem a sério a complexidade do que representa a violência hoje no Brasil.

Pela própria forma que o problema da segurança está sendo encarado pelo Pacto, acredita-se que exista um debate do tema da segurança pública como bem mais do que apenas um caso de polícia, envolvendo diferentes atores. Seria isso mesmo?

Fonseca: Com certeza. Uma das ações que estão previstas no Pacto é a formação de uma rede interministerial de Informação que se fundamenta na atuação com informações de estudos e pesquisas do Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada] e de outros órgãos do governo federal, mas também do ministérios da Educação, da Saúde, do Desenvolvimento Social, das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Hoje, o Governo Federal tenta reunir uma visão ampla de território: existem análises que observam dezenas de variáveis para pensar o homicídio e a violência, associados a uma série de outros indicadores. É importante ter um olhar mais amplo, mais qualificado, eu diria, para entender o processo de violência e estabelecer estratégias consistentes de combate e prevenção aos homicídios. 

A partir da etapa de pactuação na esfera federal, qual é o cronograma?

Fonseca: O Pacto prevê matrizes de ação em cada estado. A ideia é que a partir de conversas, que vem sendo feitas com os governadores, chegue-se a definição de território. Isso porque, por lei, o Governo Federal não pode atuar na segurança pública dos estados diretamente, então, devem ser feito convênios entre a Presidência e os governo dos estados. Na verdade, os municípios, que são o alvo desta política, vão definir, em conjunto com a população local, secretarias municipais e estaduais, como será a ação no território. Você tem então uma matriz geral indicativa desenvolvida pelo Governo Federal, com sugestões e análises de dado macro, somada a uma etapa fundamental desse processos, que é a opinião do micro, do território, de quem vive essa realidade. Já houve um processo de submissão por meio de um edital para as universidades apoiarem essa iniciativa, produzindo diagnóstico no território. No entanto, a ideia é que cada conjunto de cidades tenha um centro de pesquisa que vá cooperar com o diagnóstico daquele território: ouvindo as pessoas e gestores, sabendo o que ajuda a combater, o que precisa ser evitado porque favorece a violência e o que é importante que tanto o policial quanto o cidadão tenha conhecimento. O objetivo é identificar, a partir dos atores sociais, quais destes são importantes de incluir na construção e execução do Pacto. A ansiedade da gente que está no Governo Federal é enorme, mas a coisa tem que ser feita com cuidado e atenção, pois é um tema extremamente delicado e que merece os nossos melhores esforços para a melhor execução possível. 

É prevista a participação da universidade de atores sociais locais, mas através de que tipo de plataforma de participação?

Fonseca: O desenho já existe. A ideia do Pacto não é atuar no município inteiro. Em cada município, vão ser identificadas as regiões por mancha de calor, onde tem mais homicídios. As ações vão ser focadas inicialmente nesses territórios. Então, dependendo do tamanho do município, vão ser criados alguns grupos de trabalho, com participação da sociedade e em diálogo com ministérios da área social, com secretarias de estado e município, e com as áreas de segurança pública do estado e da União. Mais ou menos como ocorreu na Copa, vão acontecer espaços de gabinetes integrados para a segurança pública e para a ação social nos municípios. Em cada esfera da governança do Pacto, existirá a participação da sociedade.

Que tipo de cenário pela redução dos homicídios é possível pensar como resultado de um esforço continuado e integrado entre os ministérios, os estados e os municípios? Estatistica e visivelmente, como seria a nova dinâmica dos territórios, como as pessoas viveriam?

Fonseca: Como um apoiador e gestor que trabalha na Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, posso dizer que o Pacto deve ser liderado e coordenado pelo Ministério da Justiça, que tem se empenhado fortemente para fazê-lo. Dentro da experiência do Ministério da Justiça, posso citar o pacto estadual Brasil mais seguro, iniciado em 2012 com governo de Alagoas, que guarda esses processos todos de diálogo com o poder judiciário, envolvendo a sociedade civil, e trabalha com perícia competente, com inteligência e a criação de delegacias de homicídio onde não existe cobertura. Enfim, uma série de ações de segurança pública associadas a ações sociais. No caso de Alagoas, não estou lá para dizer do território, mas pensando na visão macro: nos últimos três anos, a diminuição de homicídios chegou em 32%. Então, em média, a redução foi de cerca de 10% ao ano. Quando você bota a meta a 5% ao ano, a meta se torna respeitosa dentro da realidade que implica a pactuação entre União, estado e município. Você tem um processo muito amplo e se coloca uma meta que se considera exeqüível e dentro do que se propõe, dentro da estrutura federal e do pacto federativo. Temos uma PEC nº 33/2014, que foi aprovada agora, que dá conta de mudar essa estrutura. Eu acho que uma das questões mais sérias de segurança pública no Brasil é a não adequação e atualização da estrutura de segurança pública de um modelo que remonta ainda à época da ditadura. Só agora que a gente vai atualizar, por meio de uma mudança na Constituição em que as três instâncias do executivo vão estar responsabilizadas pela segurança pública. Hoje, União e município, se quiserem fazer alguma coisa, encontram uma série de limitações por conta do pacto federativo e da Constituição. Essa alteração, que espero que seja aprovada na Câmara o mais prontamente possível, vai viabilizar uma discussão mais tranquila e, inclusive, vai permitir que a Polícia Federal e a Justiça Federal atuem em crimes organizados, de grupos extermínio que perpassam vários estados. Por conta da estrutura de segurança pública no Brasil, hoje existe essa complicação porque é atribuição do estado. Vai ser um avanço, e vai contribuir bastante no combate à violência e aos homicídios. 

No momento, a PEC está em que estágio de tramitação?

Fonseca: Ela foi aprovada no Senado e agora vai para a Câmara dos Deputados. Acho que deve ir para uma Comissão Especial e, aprovada nesta comissão, vai para o plenário. 

A reorganização do processo citado otimiza os recursos já existentes destinados às forças de segurança distribuídos nas instâncias da União, dos estados e dos municípios? 

Fonseca: Essa é outra discussão, isso vai ter que ser regulamentado por lei infraconstitucional. Não está definido, mas a ideia é que as instâncias não precisem concorrer e sim convergir em relação à temática. Eu acho que há interesse dos prefeitos, dos governadores e do Governo Federal que isso aconteça. Ninguém é a favor da violência. Deve-se chegar a uma concertação que propicie o combate do crime.

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