Construir um acervo científico de reconhecimento internacional demanda persistência, dedicação e determinação. A história da Coleção Entomológica [1] do Instituto Oswaldo Cruz (CEIOC/Fiocruz), uma das mais ricas e valiosas da América Latina não é diferente. Data de 1901, o depósito do primeiro exemplar, quando o próprio Oswaldo Cruz descreveu o mosquito Anopheles lutzi, transmissor da malária, primeira espécie descoberta pelos cientistas do IOC, conhecido como Instituto de Manguinhos. Ainda no início do século 20, o acervo recebeu contribuições de renomados pesquisadores, como Carlos Chagas e Arthur Neiva.
A modernização do acervo garantiu melhorias no acondicionamento dos espécimes (foto: Divulgação)
De lá para cá, a Coleção resistiu a episódios como o ‘Massacre de Manguinhos’ que, em 1970, atingiu o acervo de insetos e desmantelou integralmente a estrutura física. Na época, numa tentativa de resguardar o tesouro científico abrigado pela CEIOC, alguns exemplares foram enviados por empréstimo para guarda de outras instituições. Somente 35 anos depois, parte do valioso material retornou integralmente à Fiocruz e foi reincorporada ao acervo original. Anos depois, a Coleção passou por um processo de modernização, com a expansão do espaço e melhor acondicionamento do acervo.
Após 115 anos, a Coleção Entomológica está em plena atividade científica. Além de contar com cerca de cinco milhões de exemplares de insetos da fauna brasileira e de diversas regiões do mundo, esta vitrine da biodiversidade está disponível para cientistas nacionais e internacionais que podem acessar os dados do acervo por meio de consultas online [1].
Para lembrar a história do acervo e os desafios e perspectivas para o futuro, o Centro de Estudos do IOC promoveu, no dia 21 de outubro, uma sessão comemorativa. “Aos 115 anos, a CEIOC é um testemunho da ciência e da história. A preservação do acervo garante que as novas gerações conheçam esse tesouro da biodiversidade. Além disso, sua importância para a realização de pesquisas em âmbito nacional e internacional é de valor incomensurável”, ressaltou a vice-diretora de Serviços de Referência e Coleções Biológicas, Eliane Veiga da Costa. “As coleções biológicas representam instrumentos extremamente relevantes para o desenvolvimento científico e tecnológico do país. A Coleção Entomológica, em especial, desperta a atenção pelo seu valor único, por suas belezas e curiosidades”, acrescentou a vice-diretora de Ensino, Informação e Comunicação do IOC, Elisa Cupolillo.
A atual curadora, Jane Costa, chefe do Laboratório de Biodiversidade Entomológica do IOC, destacou a trajetória de modernização do acervo. “A CEIOC pode ser definida hoje como uma espiral crescente e ascendente, resultado de um trabalho colaborativo de inúmeros pesquisadores, curadores e profissionais e do investimento em políticas institucionais que beneficiam a preservação e divulgação do acervo”, salientou a curadora.
Passado, presente e futuro
Abrigada no Castelo Mourisco, sede da Fiocruz, no Rio de Janeiro, a Coleção Entomológica é a mais antiga coleção biológica da Fiocruz. No Centro de Estudos, a pesquisadora da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz) Magali Romero Sá abordou a perspectiva histórica do acervo, que ainda no século 20, recebeu espécies de carrapatos, mosquitos e moscas coletadas durante a realização de expedições científicas. “Havia pouquíssimos trabalhos sobre insetos, a descoberta da possibilidade de transmissão de doenças a partir de insetos vetores alavancou o interesse de pesquisadores sobre esse grupo, principalmente mosquitos”, explicou Magali, destacando o crescimento de coleções biológicas no início do século passado.
Atualmente, a Coleção colabora para a realização de estudos científicos por meio de serviços de consulta, empréstimo e depósito de espécimes, permuta com instituições de pesquisa, e atividades de divulgação científica (leia mais na página de serviços da Coleção). O investimento em políticas institucionais contribui para a modernização e preservação da CEIOC e de outros acervos, permitindo a ampliação da oferta de serviços. No encontro, a coordenadora de Coleções Biológicas da Fiocruz, Manuela da Silva, apresentou iniciativas como a modernização das páginas dos acervos na internet, visando a ampliação do acesso, e o projeto Preservo, parceria entre diferentes unidades da Fiocruz e o BNDES que garante financiamento para melhorias na organização dos espaços. Ela lembrou, ainda, a importância da adequação das atividades das Coleções às legislações nacionais e internacionais de acesso ao patrimônio genético. “As coleções têm um papel fundamental para a conservação da biodiversidade, por isso temos um papel fundamental de garantir que o uso desse material por diferentes pesquisadores seja feito de forma adequada, responsável e que garanta os direitos da nossa soberania sobre a biodiversidade brasileira”, afirmou Manuela.
Centenária, porém moderna
Os dados dos espécimes depositados na Coleção podem ser consultados online, por meio da rede ‘SpeciesLink’ [2], sistema que disponibiliza informações sobre diversas coleções científicas de forma gratuita. O acervo, que representa quase todas as ordens conhecidas, inclui atualmente insetos como besouros e escaravelhos, abelhas e vespas, borboletas e mariposas. A maior parte das espécies está preservada em ambiente seco, fixas por meio de alfinetes entomológicos. Há também insetos conservados em álcool a 70% e expostos em lâminas. Exemplares didáticos da Coleção estão disponíveis para apreciação na Sala de Exposição Costa Lima, no Castelo Mourisco. As visitas são gratuitas e organizadas pelo Museu da Vida, por meio do telefone (21) 2590-6747.