06/09/2016
Os medicamentos produzidos por rota biotecnológica figuram, atualmente, entre os produtos mais vendidos no mundo e têm expandido expressivamente sua participação relativa no mercado farmacêutico global. As oportunidades presentes e futuras deste cenário para o Brasil, o Complexo Econômico e Industrial da Saúde (Ceis) e o Sistema Único de Saúde (SUS) foram tema de oficina de pesquisa promovida pela rede Brasil Saúde Amanhã dia 30 de agosto, na Fiocruz.
Evento reuniu, além da presidência da Fiocruz, dirigentes e pesquisadores de importantes áreas da Fundação (foto: rede Brasil Saúde Amanhã)
Intitulado Incorporação da rota biotecnológica na indústria farmacêutica brasileira: desafios, perspectivas e implicações para políticas, o evento reuniu, além da presidência da Fiocruz, dirigentes e pesquisadores de importantes áreas da Fundação: Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos), Centro de Estudos Estratégicos (CEE), Grupo de Inovação em Saúde (GIS), Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS) e Fiocruz Brasília. Também participaram representantes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Fundação para o Remédio Popular (Furp), Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (Abifina), Interfarma, Recepta Biopharma, Farma Brasil, Bionovis e Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP).
O debate foi realizado a partir do termo de referência apresentado pelo economista Marco Vargas, pesquisador do Grupo de Inovação em Saúde da Fiocruz e colaborador da rede Brasil Saúde Amanhã. “Na última década o Brasil avançou significativamente na composição e no fortalecimento de sua política industrial e é preciso dar continuidade a esta trajetória, com políticas públicas que nos permitam aproveitar as janelas de oportunidade que estão no horizonte de futuro. Enfrentamos, hoje, o desafio de encontrar espaço para a política industrial, para a política de Saúde e para a interface entre as duas”, ponderou Vargas.
A partir do documento, discutiu-se a dinâmica competitiva e de inovação do segmento de biofármacos no mundo e no Brasil e os limites e oportunidades para o desenvolvimento de novas plataformas biotecnológicas em saúde no país. Os debates abordaram, ainda, a integração entre a política industrial brasileira e setor Saúde, de forma a atender as futuras necessidades da população, que vem passando por um processo de envelhecimento e transição epidemiólogia que tende a se intensificar no horizonte dos próximos 20 anos. “É necessário colocar em prática todo o conhecimento acumulado, a lucidez de uma institutição estratégica de Estado e a capacidade de intervenção de academia, agências de fomento e setor produtivo para que possamos aproveitar as oportunidades de desenvolvimento nacional que se colocam para o país a partir do Ceis”, afirmou o presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha.
Para o economista Carlos Gadelha, pesquisador do Grupo de Inovação em Saúde da Fiocruz, a biotecnologia deve assumir papel central nas discussões sobre o Ceis. “Esta é uma área de destaque na producão de conhecimentos e desenvolvimento de tecnologias e é preciso aproximá-la da dimensão das políticas públicas. Para isso é necessário integrar academia, Estado e setor produtivo para pensar as estratégias para o fortalecimento da política industrial brasileira e o aprofundamento de sua interface com o setor Saúde e as necessidades presentes e futuras da população brasileira”, apontou.
O pesquisador José Carvalho de Noronha, coordenador executivo da rede Brasil Saúde Amanhã, ressaltou que a política industrial do setor Saúde é especialmente estratégica para o Brasil, pois o país adota um modelo de atenção à saúde pautado pelo acesso universal, integral e equânime. “Além de possibilitar o aumento da produção nacional de biofármacos presentes na lista de produtos estratégicos para o SUS, a incorporação da rota biotecnológica na indústria farmacêutica nacional tem importante impacto econômico. Em função de seu potencial de mercado e de seu elevado valor agregado, a produção biofarmacêutica poderá, em longo prazo, equilibrar a balança comercial do Ceis”, explicou.
Oportunidades para o Brasil
Em 2014, a venda global de biofármacos atingiu um montante de quase US$ 200 bilhões, o que representa cerca de um quarto das vendas totais de medicamentos no mundo. As proteínas terapêuticas recombinantes e o segmento de anticorpos monoclonais constituem o nicho de mercado mais dinâmico e, por isso, o principal foco de interesse dos grandes grupos farmacêuticos internacionais e de mercados emergentes, como os da Índia, China e Singapura. E esta tendência deve se fortalecer nos próximos anos. De acordo com Vargas, até 2036, todo medicamento terá algum componente biotecnológico. “O Brasil precisa aproveitar esta janela de oportunidade. A produção de proteínas terapêuticas recombinantes representa um nicho estratégico para o ingresso do país na produção de biofármacos, tanto do ponto de vista sanitário, para atender de forma sustentável as demandas de saúde da população brasileira, quanto do econômico”, avaliou o pesquisador.
Os dados comprovam: em 2015, a importação de anticorpos monoclonais correspondia a mais de 10% do déficit total da balança comercial da indústria de base química e biotecnológica na área da Saúde, no Brasil. Em 2014, a aquisição de medicamentos biológicos pelo Ministério da Saúde esteve na ordem de R$ 4 bilhões – o equivalente a 40% do total das compras públicas do órgão. Entre 2011 e 2016, as compras de medicamentos biológicos representaram um gasto de R$ 9,7 bilhões. “Portanto, a produção nacional de biofármacos já incorporados na lista de produtos prioritários para o SUS representa um passo fundamental na busca de soberania nacional e da sustentabilidade econômica do sistema de saúde brasileiro”, concluiu Vargas.