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29/09/2011

Antropologia e ciências da saúde se unem em livro que destaca protagonismo do idoso

Fernanda Marques


As estatísticas demográficas confirmam o expressivo crescimento da população idosa no Brasil e esse envelhecimento "à brasileira" suscita uma série de questões. Analisá-las em perspectiva crítica é o objetivo central do livro Antropologia, saúde e envelhecimento, da Editora Fiocruz, que ganha sua segunda reimpressão. Ao cruzar os olhares da antropologia e das ciências da saúde, a obra mostra que, além de dietas equilibradas, prática de exercícios físicos e acompanhamento médico, o "prazer de viver" também é essencial para um envelhecimento saudável. Fruto de uma oficina de trabalho que reuniu diversos pesquisadores, a coletânea traz outra importante contribuição: recusa-se “a colocar como farinha do mesmo saco envelhecimento, doença, privação, dependência, tristeza e frustração”, como salientam os organizadores Maria Cecília Minayo e Carlos E. A. Coimbra Jr.



O desgaste do corpo, as rugas, o andar vagaroso ou trôpego: esta imagem limitada que se faz dos idosos deve ser substituída por outra, na qual o envelhecimento não seja visto como sinônimo de problemas. É o que defendem os autores na coletânea, parte integrante da coleção Antropologia e Saúde. Os capítulos estimulam o leitor a questionar-se: por que não encarar a velhice como um tempo produtivo da vida, com aspectos relevantes e específicos para serem desfrutados? Esta visão alternativa – impensável para aqueles presos ao estigma do velho como "peso social" – já é uma realidade, como indica a crescente participação dos idosos em espaços próprios de ação, cidadania e inclusão.


Esses espaços – diferentemente dos processos de medicalização do envelhecimento e infantilização da velhice – revelam os idosos como um grupo de interlocução política, que se faz ouvir na defesa de seus direitos e desejos. Seguindo essa nova tendência, o livro reconhece o velho como protagonista de sua própria vida e lhe dá voz, em vez de recorrer aos discursos de especialistas que costumam falar em nome dos idosos. “É muito importante ouvir a ‘lógica interna desse grupo socioetário’ e contar com ele para a realização de seus anseios e para a construção de um padrão de vida que lhes seja adequado”, destacam Maria Cecília e Coimbra Jr. “Dessa forma, a contribuição específica dos idosos será um bem para a sociedade e estabelecerá os contornos de seus próprios interesses, num mundo cheio de outros poderosos interesses”, acrescentam os organizadores.


Quando os idosos são ouvidos, configura-se um cenário diferente daquele descrito pelo senso comum. As ideias negativas a respeito da velhice, enraizadas na ideologia ‘produtivista’, contrastam com visões mais generosas que os idosos têm de si próprios, mesmo em situações de doença e dependência física. Aliás, nota-se também que os idosos se sentem mais prejudicados pelo abandono e a solidão do que pela doença e a dependência. Assim, a coletânea sugere o desejo de inclusão afetiva nos contextos sociais como uma espécie de traço "universal" da velhice, embora o livro siga firme no propósito de desnaturalizar o fenômeno do envelhecimento, apresentando-o como uma categoria social e culturalmente construída – isto é: não existe "o envelhecimento", mas "envelhecimentos", de acordo com aspectos como gênero, etnia, saúde, educação e condições econômicas.


Outros temas debatidos pelo livro incluem os conflitos em torno da velhice vivenciados no âmbito privado e familiar; as preocupações dos sistemas de saúde com o "custo" do envelhecimento populacional; o idoso como alvo de políticas públicas do Estado; e a concepção de uma "terceira idade" ativa e consumidora de uma verdadeira indústria do envelhecimento, que engloba medicamentos, cosméticos e uma ampla diversidade de produtos dirigidos a essa crescente "fatia do mercado".


Publicado em 29/9/2011.

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